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Sinopse

Max consegue uma bolsa para estudar numa escola preparatória destinada a jovens de famílias ricas. Mas, Max corre o risco de ser expulso da instituição por conta de suas notas baixas.

Crítica

Quando um diretor tem um estilo muito marcante ou definido, do tipo que você sabe quem dirigiu o filme só de o assistir por alguns segundos, ele pode ser chamado de "auteur", como dizem os americanos. É uma palavra em francês traduzida literalmente como "autor" e muito usada para designar (às vezes pejorativamente) um seleto rol de diretores amados por uns, odiados por outros. Wes Anderson, com certeza, faz parte desse círculo, e Três é Demais foi o filme responsável por consolidar seu marcante estilo. A prova de que o segundo longa dirigido por Anderson é um trabalho de autor começa pelo fato de que não foi muito fácil enquadrá-lo num gênero definido. No Brasil, foi vendido como comédia romântica. Tanto que o título, Três é Demais, sugere um triângulo amoroso. E ele até existe, mas fica subjacente a uma trama maior, de tintas agridoces. Vai ver foi por isso que nos EUA, por exemplo, o pôster aproveita o título original (Rushmore, nome da escola em que o protagonista estuda) para carregar o filme com um subtexto político, diagramando tudo com uma identidade visual que lembra o construtivismo russo. Quando se tem um estilo tão distinto quanto o de Anderson, ele se sobrepõe às convenções de gênero.

A trama gira em torno de Max Fischer, um garoto de 15 anos representado por Jason Schwartzman – que, na época, tinha apenas 18. Talentoso desde pequeno, o sobrinho de Francis Ford Coppola dá um show como o garoto precoce e desajeitado que, ao mesmo tempo em que preside e controla quase todos os clubes e atividades extracurriculares de sua escola, é um fracasso em sala de aula. Para Max, Rushmore é tão preciosa quanto sua própria vida. E isso só se torna mais verdade quando descobre, andando pelos corredores, a professora Cross (Olivia Williams). Mais velha, ela se torna uma obsessão para o rapaz. No entanto, seu tutor, Herman Blume (o sempre talentoso Bill Murray), acaba entrando no meio dos dois. Pensar em Três é Demais como a consolidação do estilo de Anderson é pertinente, porque no seu primeiro longa (Pura Adrenalina, 1996) o estilo ainda era um pouco incerto, embora interessante, aparecendo mais como característica específica daquele filme do que como algo próprio do diretor. Neste trabalho seguinte, no entanto, ficam claras algumas qualidades do cineasta que não apenas contribuem para que a história seja contada, mas lhe dão um clima e uma ambiência exclusivas do universo criado pelo diretor.

A começar pelas tomadas obcecadas com a simetria, já clássicas do diretor. Quebrando uma regra de ouro da fotografia cinematográfica, Anderson coloca o objeto ou a ação retratados no exato centro da tela, dispondo tudo em volta de forma simétrica, criando uma espécie de imagem-espelho. Para a fotografia, isso seria uma heresia, já que, posicionando o objeto principal no centro, os outros dois terços da imagem perdem seu valor representativo, se tornando "mortos". É a chamada regra dos três terços. Mas a obsessão de Anderson com esse tipo de enquadramento é tanta e tão precisa, que acaba por superar essa regra, preenchendo a imagem com significados que brotam justamente da simetria (ou assimetria) gerada pelo arranjo cênico. Isso pode ser observado em Três é Demais a torto e a direito, mas de forma especial na apresentação dos personagens. A Professora Cross aparece, numa das primeiras vezes em cena, entre livros e aquários, algo que diz muito sobre sua personalidade. Herman aparece em sua mesa, na fábrica, de costas para uma parede de vidro por meio da qual é possível observar toda a linha de produção. Trata-se, logicamente, de um gerente fabril. Max, é claro, é o único "fora de centro": o garoto é apresentado numa sequência divertida em que aparece nas dezenas de clubes que frequenta. Às vezes no centro da tela, às vezes deslocado dele, está ali o único personagem 'polifônico" da trama. Talvez por isso o mais interessante.

Outra característica de Anderson é a "tomada de cima", quando ele coloca a câmera a 90 graus de um objeto (normalmente um livro ou caderno) para nos permitir ler o que está sendo escrito/tocado/carregado. Trata-se de um truque para obrigar o espectador a ler e poupá-lo da "voz em off", recurso comum para decupar esse tipo de ação. Em Três é Demais, lemos algumas cartas de Max desta forma, o que não apenas dá ao filme seu tom retrô – tão comum na obra do diretor – como nos permite conhecer um pouco da natureza obsessiva de Max por meio de sua caligrafia. O filme se desenrola por meio de situações tão artificiais e absurdas quanto o estilo sugere: da construção de um aquário no pátio da escola até a escrita de peças de teatro que incluem atores de 13 anos como soldados fumando no campo de batalha. Uma bem vinda comicidade para um filme que, no final, quer discutir as dores do crescimento e a necessidade de sacrificar aquilo que se é para se tornar aquilo que se quer ser.

O ar teatral adotado – amplificado pela obsessão de Anderson com figurinos e objetos de cena de grifes famosas e uma direção de arte minuciosa ao nível de detalhe – também se casa com os delírios teatrais do protagonista, que, é claro, tem a dramaturgia entre seus hobbies. O filme inclusive é dividido em "capítulos" com os nomes dos meses, separados por uma vinheta que nada mais são do que cortinas que se abrem. O roteiro (escrito por Anderson em parceria com Owen Wilson, um de seus maiores parceiros) também é lapidado com diálogos sensíveis e interessantes. A frase "She was my Rushmore" ("Ela era o meu Rushmore") se tornou famosa na cultura pop americana, até por vir de uma música da banda Every Time I Die. Por sinal, em diversos momentos os personagens usam letras de músicas em seus diálogos, o que talvez tenha inspirado o Fall Out Boy a usar uma das falas do filme ("Tell that mick he just made my list of things to do today") como título de uma de suas composições.

Obviamente, uma estilização desse tamanho não desce fácil para o espectador ocasional, que só quer se divertir, ou mesmo para aqueles que entendem o cinema como "máquina de contar histórias". Pode-se dizer, sob um certo ponto de vista, que num filme de "auteur", como é o caso, a estética tem tanto valor quanto a trama para a experiência de quem assiste. Para aqueles que se interessam por isso, portanto, Três é Demais é um prato gourmet cheio, desses tão bem decorados que dá dó de comer. Mas vale cada garfada.

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é jornalista, mestre em Estética, Redes e Tecnocultura e otaku de cinema. Deu um jeito de levar o audiovisual para a Comunicação Interna, sua ocupação principal, e se diverte enquanto apresenta a linguagem das telonas para o mundo corporativo. Adora tudo quanto é tipo de filme, mas nem todo tipo de diretor.
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