Três Realizadoras Portuguesas
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Sofia Bost, Mariana Gaivão, Leonor Teles
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2019
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Portugal
Crítica
Leitores
Sinopse
Mena vive sozinha com a filha Clara. Enquanto prepara a festa de aniversário da pequena, ela recebe uma ligação perturbadora. Ruby desperta ao som do canto da madrugada que desce a montanha queimada. Os turistas enchem as ruas do Porto com o fim das aulas, evidenciando a gentrificação do local.
Crítica
Existe um enorme preconceito do circuito exibidor com o curta-metragem. Qualquer proposta de obrigatoriedade de inclusão desse tipo de filme como complemento das sessões regulares nos cinemas gera respostas acaloradas dos empresários do ramo. O argumento é a dificuldade de organizar horários com a “intrusão” desse elemento na programação. No âmbito meramente mercadológico, surpreendentemente não se pensa o curta como um valor agregado, assim vantajoso, pois o espectador/consumidor paga para assistir a uma produção e acaba levando outra (às vezes melhor) de brinde. Bom, esse comportamento refratário de boa parte das salas de projeção com relação ao formato impõe, aos que dele se valem, uma necessidade de fazer gambiarras para chegar às telonas. Três Realizadoras Portuguesas é um subterfúgio utilizado por três jovens cineastas lusitanas para ver seus filmes exibidos numa lógica comercial. Em comum, as obras têm a origem nos esforços de membros de uma nova geração e o fato de serem precedidas dos logotipos de festivais europeus importantes que as selecionaram – respectivamente, Cannes, Roterdã e Veneza. No mais, o resultado é a soma de exemplares distintos, estética e narrativamente falando, mas que dialogam esporadicamente.
O primeiro é Dia de Festa, de Sofia Bost, conto sensível sobre uma mãe em dificuldades para desempenhar os papeis sociais aos quais é convocada. Rodada em película, algo perceptível pela textura e a razão de aspecto da imagem, a trama aposta nos silêncios como forma de aproximar-nos da protagonista que não se sente confortável tendo de cumprir os protocolos da maternidade. De modo sucinto, ágil e comprometido com a ideia de economia narrativa, ficamos sabendo que ela não recebe ajuda do ex-companheiro e corta um dobrado para sustentar financeira e afetivamente a menina em vias de comemorar aniversário. O diálogo com sua mãe no hospital, do lado de fora do quarto onde agoniza o pai também indesejado, deixa implícita a existência de mágoas profundas e igualmente a possibilidade de ter existido um episódio incontornável no passado para que persistam as distâncias mencionadas. Sofia é bastante hábil nesse retrato sutil de uma mulher que não consegue se encaixar nas expectativas de filha e mãe, chegando ao cúmulo de colocar na conta de hereditariedade o abismo sentimental. Não há homens em cena. E essa é uma ausência indicativa.
Na sequência vem Ruby, de Mariana Gaivão, curta que tem como forte a belíssima composição dos quadros que valorizam as paisagens da Serra da Lousã, em Portugal. A protagonista é uma jovem cujo fenótipo aparentemente destoa da vivência pacata da localidade montanhosa. Ela tem um jeito de vestir e comportamento imediatamente associados com o cosmopolitismo das metrópoles. Não sabemos exatamente se está passando férias ou se o idílio é um refúgio passageiro. Mariana deixa as explicações e os contextos de lado, concentrando-se num itinerário que dilui a autodescoberta da personagem principal nas deambulações por cenários lindos. Ao seu redor, outros espécimes da pós-adolescência em busca de algum sentido. Porém, não há questionamentos frontais e nem mesmo a vontade desbragada de colocar indagações na boca das pessoas que falam prioritariamente inglês quando juntas, como se formassem uma tribo apartada daquele horizonte tradicionalmente português. Há planos obviamente encarregados da missão de mostrar o quão importante é aquela geografia externa em comunhão com uma equivalente interna. Bem bonito de ver.
Por fim, Cães Que Ladram aos Pássaros, de Leonor Teles, é o único dos curtas não protagonizado por figuras femininas, embora tenha uma vital. As atenções são direcionadas aos efeitos da gentrificação – processo de transformação urbana que “expulsa” moradores pobres de bairros ressignificados como áreas nobres – do Porto. O adolescente que serve de guia começa lendo o conceito retirado da Wikipedia, gesto que alude à curiosidade nutrida em virtude das circunstâncias. O diálogo com a mãe evidencia a necessidade de mudar-se dali, de deixar de lado conexões com amigos e amores. No entanto, Leonor, assim como suas colegas nos filmes anteriores, aposta na depuração dos dramas, oferecendo uma abordagem mais oblíqua das causas, focando-se nos efeitos imediatos das questões a serem assimiladas. Em vez de um discurso inflamado e indignado contra a mudança, o garoto é visto saboreando as cercanias como não poderá fazer adiante, conversando com colegas e chegados em ocasiões aparentemente banais, mas que conservam um adicional de melancolia. A câmera denuncia as coisas pelos detalhes e meneios. Um encerramento bonito para um projeto cujo principal benefício ao espectador é ter contato com uma promissora geração de cineastas portuguesas.
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