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Sinopse

Jorge não suporta mais o Natal. Filas, shoppings lotados, uva passa no arroz. Ao despencar do telhado vestido de Papai Noel, é condenado a acordar na véspera de Natal, ano após ano, tendo de lidar com as consequências do que seu outro “eu” fez nos demais 364 dias.

Crítica

Batizado como Just Another Christmas (no mercado internacional) ou como 20 Natais em 20 Dias (título de trabalho, durante as filmagens), Tudo Bem No Natal Que Vem revela em suas denominações alternativas o cerne de sua história. Afinal, por mais que a trama se estenda ao longo de duas décadas ou mais, os personagens são vistos apenas as comemorações natalinas. E como se trata de apenas mais um Natal, por qual razão o espectador deveria ser levado a acreditar que o próximo será melhor do que o anterior? Nada disso é certo, a não ser que o trio Roberto Santucci (diretor), Paulo Cursino (roteirista) e Leandro Hassum (protagonista) está mais uma vez reunido, e dessa turma se pode esperar o mesmo tipo de humor já visto na trilogia Até que a Sorte nos Separe ou no duo O Candidato Honesto: muito escracho, alguma escatologia, um pouco de sem noção e um melodrama raso que encontra ressonância apenas entre os mais desatentos – ou menos exigentes. Uma fórmula que funcionou antes e, seguindo por essa mesma medida, deverá provocar o igual impacto também por aqui.

Entre os que apontam que a mão pesada de um, o texto óbvio de outro e o jeito exagerado do terceiro já deu o que tinha que dar, duas novidades foram agregadas a esse projeto. Primeiro, o elemento natalino, tão poucas vezes explorado pelo cinema nacional – mas uma tradição forte em outras cinematografias, como a hollywoodiana ou a europeia. E segundo, sob qual sombra tal história está sendo contada: a da Netflix, a produtora que decidiu bancar sua realização. Assim, se Hassum continua sendo a ponta da lança, dando a cara a tapa (literalmente, aliás) em mais um conto que parte em busca de efeitos imediatos, Santucci e Cursino se encarregam de apenas não permitir que a mistura desande, cuidando de equilibrar elementos há muito conhecidos, porém aqui apresentados através de um esforço que possibilite uma nova leitura, mesmo partindo de cenários um tanto desgastados.

Jorge (Hassum) é um cara que nunca gostou do Natal por um simples motivo: este é também o dia do seu aniversário, data essa que acaba ficando em segundo plano nas comemorações familiares. Além disso, esses momentos que costumam agrupar parentes que há muito não se viam também tendem a ser maçantes pela repetição de situações – as piadas sem graça (tem até o tio do pavê), as discussões sem sentido, as implicâncias gratuitas, o cunhado que tá sempre pedindo dinheiro etc. Uma vez isso estabelecido, quando está prestes a se rebelar contra mais uma dessas noites que costuma atravessar rezando para que logo termine, Jorge acaba sendo condenado a reviver aqueles mesmos encontros até aprender “o verdadeiro significado do Natal”.

Por mais que essa breve sinopse aponte para uma reprodução tupiniquim do muito superior Feitiço do Tempo (1993) – e não se pode negar que o argumento de Tudo Bem No Natal Que Vem seja inspirado na comédia com Bill Murray – é também curioso perceber a mistura desse com o romântico Como se Fosse a Primeira Vez (2004), ao menos em sua estrutura. Pois Jorge não fica preso no mesmo dia – o tempo segue passando! Porém, para ele, seja esse o efeito, graças a uma amnésia seletiva. Então, é como se fosse sempre o mesmo dia – ainda que de anos diferentes. Cada vez que acorda, um ano inteiro se passou, do qual não possui nenhuma memória. É uma estrutura curiosa, é possível reconhecer. No entanto, a impressão é que seus realizadores ficaram satisfeitos apenas em propor essa mudança de perspectiva, sem empregá-la a favor de uma narrativa que conseguisse extrair dela o melhor.

Dois outros problemas, no entanto, acabam falando alto junto aos mais atentos na audiência. Jorge não é uma pessoa com problemas em relação ao Natal, para começar. Sua implicância é com o aniversário dele – que cai exatamente no mesmo dia, e por isso nunca recebe a mesma atenção, pois acaba, inevitavelmente, ficando num segundo plano. A outra questão, ainda mais evidente, é que, após ser amaldiçoado, se vê obrigado a reviver esse mesmo dia – que não é nem o Natal, ou mesmo seu aniversário, mas, sim, a véspera! Não é, no mínimo, estranho? Isso, aliado ao fato de que não há processo de aprendizado ou de amadurecimento a ser percorrido – a cada novo ano, ele tanto erra quanto acerta, com o surgimento de uma amante ou de uma doença familiar, por exemplo, sem tirar nada de novo de cada uma destes episódios – torna o conjunto Tudo Bem No Natal Que Vem até simpático em um ou outro (raro) momento, mas tão descartável quanto se poderia imaginar, além de desprovido de relevância que tanto almeja.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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