Tudo o que Você Podia Ser
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Ricardo Alves Jr.
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Tudo o que Você Podia Ser
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2023
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Brasil
Crítica
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Sinopse
Crítica
No auge de sua popularidade, nos anos 2010, época em que integrava o elenco regular de Saturday Night Live (1975-), o humorista Dave Chappelle se especializou em armar esquetes que criticavam os absurdos tempos de escravidão nos EUA. Sob a ótica dos afro-americanos, tais sequências flertavam com autodepreciação. “Estamos realmente passando por isso? Não pode ser verdade, esses brancos devem estar brincando. Vamos aguardar os próximos capítulos”. Essas passagens ingênuas foram sendo abandonadas por Dave na medida em que foi percebendo que “uma parte da plateia estava rindo errado”, como revelou em entrevista a David Letterman. No caso, ignorando a subliminaridade das análises e zombando, apenas, do literal. Tudo o que Você Podia Ser transita nesse terreno entre o agradável e o ousado.
Renovando a colaboração que concebeu o instigante Elon Não Acredita na Morte (2016), o roteiro de Germano Melo e a direção de Ricardo Alves Jr nos convida a conhecer as vidas de quatro carismáticos amigos LGBTQIAP+ - Aisha Brunno, Bramma Bremmer, Igui Leal e Will Soares - residentes na cidade de Belo Horizonte. Em torno dos 30 anos, todos compartilham experiências traumáticas semelhantes, porém, encontram na solidez da amizade e nas manifestações artísticas a teia de apoio essencial para se revelarem autênticos, despindo-se de qualquer máscara usada como meio de sobrevivência em um contexto conservador e permeado por violência, como é o caso do Brasil. Nesse retrato multifacetado, o argumento desenha as nuances das conexões, proporcionando uma exploração sensível das complexidades, enquanto a direção destaca-se por sua habilidade em transitar entre momentos de crueza e celebração.
Desde o início, o conjunto se encontra estabelecido, embora esse aspecto não se revele de imediato ao espectador. Ao longo de praticamente toda a primeira metade, desenrolam-se as narrativas individuais pregressas, habilmente apresentadas por meio de uma linguagem híbrida que mescla ficção e documentário. Nessa abordagem, dramas pessoais e complexas relações ganham destaque, configurando uma estratégia narrativa que converte a trama de maneira orgânica. Com franqueza, o diretor nos imerge na melancolia, apenas para, em um movimento subsequente, permitir que o bom humor atue de maneira autônoma. A partir desse ponto, a obra ousa adentrar em inclinações cada vez mais arrojadas, expandindo as fronteiras de sua narrativa com uma destemida exploração de novas possibilidades.
Não são poucos os diálogos em que o quarteto se coloca em situação desfavorável, usando e abusando de chacotas para se referirem um ao outro. O auge é investido em um encontro caseiro captado por uma sensível câmera paralizada. Por bons minutos, o mais burlesco do time, Will Soares, promove um show particular ao citar características originárias do mundo queer. À vista disso, há divertimento e isso é inegável. Mas para qual público? A atmosfera disposta é clara em sua busca de audiência. Mesmo assim, como saber se não estamos, como identificou Chappelle, “rindo errado”? Num futuro distante, tudo ficará iluminado. E é nesse amanhã que as fichas de Melo e Alves Jr estão depositadas.
Na progressividade, hermetismos são dispensados, e a produção se manifesta como um convite genuíno. De fato, surge a questão: qual seria o nosso potencial se fôssemos orientados desde cedo a compreender e valorizar as diferenças? Múltiplas desconstruções, atualmente consideradas indispensáveis, talvez não demandassem tamanha urgência, e a singularidade presente nesta obra apenas se tornaria um aspecto habitual. Em última análise, Tudo o que Você Podia Ser deve ser percebido como uma autêntica lição de empatia.
Filme visto durante a 10ª Mostra de Cinema de Gostoso (2023)
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