Crítica
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Sinopse
Habitantes da carente comunidade de Rio das Pedras, na Zona Oeste do Rio de Janeiro, quatro jovens vivem suas rotinas e buscam realizar seus maiores sonhos durante os meses mais quentes do ano, enquanto tentam conciliar as aspirações pessoais com os problemas, que vão desde crises adolescentes até o perigo constante de certos locais precários próximos de suas casas.
Crítica
Aqueles que quase sempre são invisíveis, também existem e possuem suas próprias trajetórias. É tamanha a obviedade desta constatação que, só o fato dela precisar ser dita, já aponta para a importância da sua condição. Importantes ou não, não cabe a quem está de fora fazer esse julgamento. Afinal, está em cada um a chave da mudança. Mas para isso é precis, no entanto, acreditar que isso é possível. No espaço de uma estação, a diretora Jo Serfaty acompanha a vida de quatro jovens da periferia carioca, do último dia de escola até o final das férias, quando, enfim, precisam deixar de ser adolescentes – não muito mais do que crianças – para se revelarem adultos já prontos para responsabilidades e ambições muito além daquilo que estão, de fato, preparados. Assim, Um Filme de Verão se mostra mais do que somente uma crônica inconsequente de costumes – tão comum no cinema hollywoodiano – para se apresentar como um narrativa de passagem e transformação, retrato preciso de uma grande parcela da população brasileira que, no mais das vezes, acaba sendo tratada se nada tivesse a somar quando, de fato, é neles em que reside o futuro desta nação.
Caio é, indiscutivelmente, o mais interessante destes personagens. Negro, acima do peso, um tanto afeminado, provavelmente o mais velho deles, reside nele um sem número de contradições. Se declara bissexual, mas não o vemos envolvido nem com homens, muito menos com mulheres, e apesar de estar sempre na companhia delas, nunca é romântico, por mais que se mostre afetivo. Atencioso com a avó e preocupado com seu destino acadêmico, tem na religião os seus maiores conflitos. É a ele que os amigos recorrem quando precisam de uma ‘macumba’, os ritmos africanos percorrem seu corpo, há sempre um batuque por onde ele passa, seja no tambor, no pandeiro ou no coração. É sobre ele que queremos saber mais a respeito, o porquê de se sentir deslocado em uma festa no terraço, o que o leva até uma igreja evangélica, qual a razão dos conflitos com a mãe. Quando está em cena, a domina de forma natural e até mesmo sem consciência. Quando abre espaço para os outros, é dele que sentimos falta.
E talvez essa seja a única falha de Um Filme de Verão: a irregularidade na abordagem de seus personagens. Ao mesmo tempo em que Caio é literalmente ‘maior do que a vida’, seus companheiros transitam por percursos mais lineares. Ronaldo é o jovem gay que está buscando sua afirmação, mas não através daqueles debates tão comuns em casos similares: ele sabe o que quer, e vai atrás. Junior é sensível, quase o retrato do heterossexual dos novos tempos, que não tem medo de demonstrar emoções e identificar sentimentos, ainda que desprovido de uma maturidade que o possibilite lidar com tais situações – como a mudança para a Paraíba, motivada por uma decisão familiar, que termina por afastá-lo da namorada. Essa, Karol, é também rica, ainda que não tão bem trabalhada quanto Caio: é a que se sai melhor da escola, que está lutando por um lugar no mercado de trabalho, que lamenta a ausência do namorado e que sonha com uma vida melhor no Japão. Seus porquês são um tanto diluídos no decorrer da trama, porém não muito difíceis de serem identificados.
Entre passagens que já nascem icônicas – o videoclipe deverá ser lembrado como um dos grandes momentos do cinema nacional em 2019 – e um olhar bastante afetivo da realizadora sobre estes jovens que escolhe para representar um país por completo, Jo Serfaty é beneficiada também pela montagem precisa da veterana Cristina Amaral – parceira de mestres já falecidos, como Carlos Reichenbach (Alma Corsária, 1993) e Andrea Tonacci (Já Visto Jamais Visto, 2014), entre tantos outros – que é hábil em alcançar um equilíbrio que, talvez, nem as figuras envolvidas tivessem consciência de possuir. Assim, Um Filme de Verão se sustenta através de pilares fortes – razão, sensibilidade, ternura e adequação – para compreender que ao observar um pouco da intimidade de cada um dos envolvidos se é possível traçar um painel muito mais amplo. Afinal, até podem ser eles no centro da ação, mas a fala é por todos nós.
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