Crítica
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Sinopse
Marianne deixa Abel por Paul, o melhor amigo dele e pai de seu futuro filho. Oito anos depois, Paul morre. Abel e Marianne voltam a namorar, despertando sentimentos de ciúmes tanto no filho de Marianne, Joseph, quanto na irmã de Paul, Ève, que ama secretamente Abel desde a infância.
Crítica
É de se perguntar quem seria esse ‘homem fiel’ do título do segundo longa dirigido pelo galã francês Louis Garrel. Após Dois Amigos (20015), o filho de Philippe Garrel volta ao tema das relações amorosas, invertendo apenas um pequeno detalhe: se antes o triângulo amoroso era formado por dois rapazes e uma garota, dessa vez é ele que está no centro das atenções, indeciso entre as duas mulheres que estão ao seu redor. Seria ele, portanto, Um Homem Fiel? Difícil dizer, a não ser que sua fidelidade seja consigo mesmo e seus desejos, e não com aquelas no seu entorno. Porém, há outros homens dispostos a assumir esse posto. Porém, se Paul nem chega a entrar em cena, mantendo-se mais como uma ameaça velada – uma presença fantasmagórica – talvez o mais apropriado fosse prestar atenção no pequeno Joseph (Joseph Engel), este sim em sintonia com seus anseios mais básicos, tenham eles procedência ou não.
Ao estrelar Um Castelo na Itália (2013), Louis Garrel foi chamado para ser um dos protagonistas do drama dirigido por sua então namorada, Valeria Bruni Tedeschi. Ele parece ter assimilado a lição, e se em Dois Amigos convidou Golshifteh Farahani – seu par na época – para ser um dos vértices da trama, dessa vez esse papel coube à Laetitia Casta, sua atual esposa. Garrel já afirmou em mais de uma ocasião se sentir incapaz de criar tipos muito distintos, imaginando que seus personagens são sempre uma variação de si mesmo. Talvez por isso, revela admiração por atores mais camaleônicos, chegando a citar Johnny Depp como um dos seus ícones. Não é surpresa, portanto, verificar que o romance que dessa vez se desenvolve é completado por Lily-Rose Depp – filha de Johnny Depp e que já havia aparecido como colega de Garrel em Além da Ilusão (2016). As influências e relações do astro francês metido a realizador são tão óbvias quanto previsíveis.
Em Um Homem Fiel ele aparece novamente como Abel – o mesmo nome do seu personagem em Dois Amigos – rapaz que, certo dia, ao se preparar para ir ao trabalho, recebe sem meias palavras a notícia da namorada: “estou grávida do seu melhor amigo e seria bom que você se mude o quanto antes pois pretendo me casar com ele até o final do mês”. Ao invés de brigas, discussões, choros ou protestos, a reação dele é de concordância e um “bom, preciso ir agora para não chegar atrasado”. Como se vê, mais francês, impossível. Os dois se separam e os anos se passam. Até que, quase uma década depois, lhe chega a notícia da morte de Paul. É a sua vez, portanto, de voltar para o convívio da amada, agora uma viúva. Porém, quando parecem, enfim, se acertar, quem surge é Eva (Lily-Rose), irmã do falecido, que sempre amou Abel à distância e agora, já crescida, decide lutar por essa paixão.
Chega a ser curiosa a obsessão do diretor e roteirista – texto escrito em parceria com o grande Jean-Claude Carrière, de clássicos como O Discreto Charme da Burguesia (1972) e Esse Obscuro Objeto do Desejo (1977) – com os nomes bíblicos. Abel está dividido entre Eva e Marianne (Maria, portanto, papel de Laetitia Casta), e assim que Paulo parte, quem se esforça para ocupar seu lugar ao lado da mãe é Joseph – José, aliás – mesmo que para tanto precise fazer uso de mentiras e dissimulações. Abel é filho e pai, criador e criatura na mesma medida. Quando a paternidade do menino é posta em dúvida, um mistério se ameaça, apenas para ser colocado de lado logo em seguida: este não é um drama romântico disposto a recair sobre fórmulas fáceis. As ambições de Garrel são maiores, por mais que se esforce em disfarçá-las. Pena ser desprovido de habilidade suficiente para alcançá-las de acordo com seu intento.
À despeito do título, o personagem mais interessante da trama é, curiosamente, Marianne. É ela, afinal, que afirma ser possível amar duas pessoas de forma igual. “Ao saber que estava grávida, precisei decidir entre vocês dois, e na sorte acabei por escolher um, sabendo que sofria por perder o outro”, ela comenta. Se o que sentia era verdadeiro, melhor se encaixa no conceito de fidelidade: aos sentimentos conflituosos que vivia, em igual proporção a um ou outro. E se a moral ocidental lhes parece ultrapassada, chama atenção ainda não terem se esforçado para levar adiante a relação como um trisal, os três sob um mesmo teto. Enquanto isso, Eva é a perfeita exemplificação do desejo que só é válido quando idealizado. Assim como esse filme, um exercício talvez atraente enquanto ideia, mas frágil em sua realização e irregular em seus feitos.
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