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Crítica


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Sinopse

Jeronicus Jangle é um fabricante de brinquedos reconhecido por suas criações fantásticas. Quando seu aprendiz mais próximo rouba uma preciosa criação, ele vai contar com a ajuda da neta para despertar novamente a magia.

Crítica

A quantos filmes natalinos com elenco predominantemente negro você assistiu? Provavelmente a nenhum. Lamentavelmente recentes, as demandas por diversidade na representação nos cinemas felizmente vêm dando resultado, não na velocidade ideal para reparar a discrepância que permeou, ao menos, os primeiros 100 anos da Sétima Arte, mas com frutos visíveis. Porém, Uma Invenção de Natal não é bem-sucedido apenas por conta dessa vontade para lá de bem-vinda de equilibrar uma balança historicamente desfavorável à comunidade negra, mas por fazê-lo com graciosidade e exuberância. Se trata de um musical perpassado integralmente pelo lúdico, fundamento alimentado de diversas maneiras. O aspecto de conto da carochinha, no melhor estilo “Era uma Vez...”, funciona como ignição que nos joga diretamente no mundo inventado em que a razão é parceira siamesa da magia. O maior inventor de quem já se teve notícia é roubado logo depois de finalizar um feito extraordinário, caindo em desgraça, perdendo o brilho, afastando-se da filha e virando um cara ressentido.

Após perdas (da esposa, da herdeira, do livro de projetos), Jeronicus (Forest Whitaker) se transforma num homem ensimesmado, fechado àquilo que o distinguia como excepcional. O cineasta David E. Talbert pega arquétipos bastante utilizados, inclusive, e principalmente, em filmes de cunho natalino, e os tempera com essa mescla inusitada entre razão e emoção. Ela torna crível, por exemplo, que para o mecanismo funcionar como deveria não bastam engrenagens e ângulos certos, é necessária que a crença seja adicionada à equação. O contraponto de esperança à aridez do protagonista é a pequena Journey (Madalen Mills), neta que precisa furar o bloquei emocional do avô antes de mostrar a ele que depois das tempestades ainda existem espaços às bonanças. Há transições feitas em animação, nas quais os personagens são apresentados momentaneamente como bonecos de madeira, o que adensa não somente a força da dimensão lúdica, mas também sublinha a consistência da direção de arte, área minuciosamente pensada para aludir a signos clássicos do Natal.

Visualmente, Uma Invenção de Natal é um filme bonito, mérito da excelência da construção desse entorno claramente de faz de conta e da suntuosidade dos figurinos, assim formando um conjunto que soa completamente coeso. A trama toma caminhos conhecidos, com barreiras aparentemente inquebrantáveis sendo rompidas gentilmente, aos poucos, a fim de apontar a um futuro que busca insumos vitais no passado soterrado pela dor das ausências. O que garante o trajeto prazeroso é a organicidade, o equilíbrio entre a deflagração do cenário, as etapas para ele ser modificado e a constatação do sucesso das empreitadas improváveis. Alguns personagens acabam sendo um pouco subaproveitados, especialmente o menino Edison (Kieron L. Dyer), cuja importância é bem circunstancial, e o brinquedo animado Don Juan Diego (voz de Ricky Martin), que, depois de arquitetar o plano maquiavélico para continuar sendo único, vira um coadjuvante esporádico. No entanto, essas pequenas inconsistências não são decisivas para diminuir a delicadeza e o sucesso da empreitada genuína e orgulhosamente natalina. Sobressai o poder da bondade vencendo os males.

Além do esmero no desenho desse universo racionalmente mágico, assim pretensa e deliciosamente paradoxal, e da adesão com propriedade aos cânones do filão ao qual se vincula, Uma Invenção de Natal ainda conta com, ao menos, duas interpretações excelentes. Forest Whitaker expande os princípios convencionais do protagonista, oferecendo algo a mais quanto aos contornos dramáticos do sujeito paulatinamente reencontrando a possibilidade de sorrir. Difícil imaginá-lo entre os favoritos na próxima temporada de prêmios, isso em virtude dos preconceitos relativos à natureza das obras “que devem ser laureadas”, mas ele faz jus novamente ao destaque. Assim como é digna de aplausos a jovem Madalen Mills, um prodígio que parece ter uma carreira reluzente pela frente. Combinando com habilidade os lugares-comuns e seu olhar bastante afetuoso, o cineasta David E. Talbert igualmente é merecedor de elogios por ter feito um belo conto natalino, com gosto de comida caseira, pois bem familiar, elenco majoritariamente negro e muita ternura.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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