Crítica
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Sinopse
Pérola vive com a mãe e o irmão. No entanto, ela não pretende dar sequência à tradição da família com o negócio de animação de festas. Pérola deseja alçar voos na gastronomia, mas não imagina que isso passará pela televisão.
Crítica
Pérola (Fabiana Karla) é herdeira de uma longa tradição de personagens que enfrentam dificuldades quando é preciso romper com a tradição para seguir um caminho próprio. Portanto, essa figura ficcional é criada a partir de um tropo narrativo bastante utilizado anteriormente. Filha da administradora de uma empresa familiar de organização de eventos, ela divide seu tempo entre a animação das celebrações e a carreira gastronômica. Sous chef (a segunda em comando na cozinha) num restaurante badaladíssimo, Pérola aproveita a ausência do patrão e tenta se destacar ao inserir um toque pessoal numa receita consolidada. O resultado é a insatisfação de uma cliente influente e a sua demissão. Ao analisar a construção de Uma Pitada de Sorte, o que sobressai negativamente é a falta de consistência dos personagens, as coincidências forçadas e os sucessivos desperdícios das situações na tentativa de combinar leveza e drama. Sim, pois, por exemplo, essa vontade da protagonista de colocar um tempero singular em cada coisa não reaparece nos demais momentos. Então, Pérola se arrisca por algo supostamente determinante à compreensão da sua personalidade, mas isso não é fundamental para nenhuma de suas outras atitudes ao longo da trama. Não a vemos com esse mesmo ímpeto ao ser contratada para um programa de TV ou ainda diante do enorme problema que é não conseguir confrontar a sua mãe.
O diretor Pedro Antônio não investe no escracho, na contenção e tampouco num equilíbrio entre ambos. Sua pegada cômico-melancólica gera sorrisos de canto de boca e minguados apertos no coração. Pérola é vivida pela talentosa Fabiana Karla, cujos maneirismos podem servir tanto ao exagero quanto à moderação em instantes-chave. Porém, não é isso o que acontece. O realizador não consegue fazer da protagonista mais do que uma personagem levada pelas circunstâncias enquanto lida com as demandas à medida que elas surgem. Nada tem consistência ou densidade em Uma Pitada de Sorte. E isso nem tem a ver com a previsibilidade, problema menor por aqui. O principal calcanhar de Aquiles do filme é a falta de espessura cômica/dramática das cenas, a displicência na construção e na resolução dos problemas que carecem de personalidade. A sensação de "mais do mesmo" é quebrada circunstancialmente por coadjuvantes que roubam a cena, tais como a matriarca avessa a estrangeirismos vivida por Jandira Martini e a subaproveitada vizinha fofoqueira encarnada pela não menos engraçada Flávia Reis. Elas são bem-vindos alívios à pasmaceira que vai tomando conta da sessão em virtude da ausência de ambição do roteiro assinado por Pedro Antônio, Regiana Antonini e Alvaro Campos. Problemas difíceis e situações aparentemente intrincadas são resolvidos muito facilmente.
Pérola deseja ter o próprio restaurante, mas cede diante do interessante convite para fazer parte de uma atração gastronômica na TV. Esses bastidores do showbiz são encarados como meras oportunidades para colocar Fabiana Karla em episódios constrangedores. E esse ridículo não é aproveitado como maneira de sinalizar o aumento da pressão sobre a personagem. Ainda a respeito da falta de consistência observada antes neste texto, Uma Pitada de Sorte simplesmente parece ir se desinteressando por detalhes importantes e rompendo com as sequências lógicas. É algo visto na primeira gravação de Pérola na TV. Ela chega com o irmão para pressionar seus algozes; hesita o quanto pode antes de efetivamente dizer a que veio; demonstra natural apreensão diante da missão de ser parte de uma atração famosa; mas se comporta como veterana quando as câmeras ligam. Há um ruído considerável no trânsito entre as etapas dessa “transformação”. Seguramente, falta orientação diretiva a Fabiana Karla para que mudanças de humores e de atitude sejam menos bruscas e artificiais. Assim como a protagonista, os coadjuvantes também têm guinadas drásticas demais para soarem orgânicas ou cabíveis em cada contexto. Como a “vilã” da atriz Regiane Alves, arremedo de executiva da televisão com arroubos de malvada que se revela estritamente uma entusiasta da audiência.
Uma Pitada de Sorte não aproveita as particularidades do mundo da gastronomia. Há pouco de tempero específico na jornada de amadurecimento da protagonista. Pérola poderia ser enfermeira, médica, fisioterapeuta ou qualquer coisa que servisse de pretexto à exposição midiática deflagradora do conflito. Os melhores momentos do longa-metragem são aqueles em que o talento de Fabiana Karla não se torna prisioneiro do roteiro esquemático que a coloca em episódios com pouco potencial de graça. Ainda sobre os coadjuvantes, Mouhamed Harfouch como o amigão apaixonado também tem boas cenas, mas não vai além do camarada prestes a desistir do amor que não enxerga a sua devoção. A ascensão, a pressão pelos atrasos, o deslocamento entre Niterói e a área longínqua do Rio de Janeiro, bem como a necessidade de esconder a verdade da mãe logo se tornam pouco vitais por conta das repetições burocráticas e sem variações. Afinal de contas, Pérola é uma sonhadora, uma medrosa, uma desinteressada, uma duvidosa ou o quê? Tentando abraçar todas essas possibilidades, Pedro Antônio pulveriza demasiadamente as atenções e evita que algo se consolide. Além disso, ele quer criar uma ideia de que Pérola é suburbana por morar em Niterói, quando na verdade ela é membro de uma classe média sem tantos perrengues diários e sempre com alguém para ajudar.
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Grade crítica
Crítico | Nota |
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Marcelo Müller | 4 |
Robledo Milani | 6 |
Alysson Oliveira | 3 |
Alex Gonçalves | 5 |
MÉDIA | 4.5 |
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