Crítica
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Sinopse
Introvertido, Rodrigo passa grande parte de seu tempo sozinho. Aos 13 anos, ele enxerga a mãe, Valeria, como sua melhor amiga. Isso tudo começa a mudar quando ela traz para casa o seu mais novo namorado.
Crítica
Rodrigo (Adrián Ross) é um adolescente de treze anos de idade, sem amigos. Ele não sofre bullying ou qualquer outra forma de conflito social na escola, porém soa invisível ao mundo que o cerca. O pai está distante após o divórcio, e nunca entra em contato. O universo afetivo e pulsional deste pré-adolescente se dirige apenas à mãe (Sophie Alexander-Katz), uma mulher atenciosa que fica nua sem tabus diante do garoto, e ainda o recebe ocasionalmente em sua cama para dormir. Há uma mistura curiosa entre o relacionamento terno e a aproximação problemática entre ambos – afinal, Rodrigo já estaria em idade de direcionar atenções a outras meninas e meninos dos arredores. Quando a mãe recebe “visitantes” em casa, o filho a escuta fazer sexo, tenta abrir a porta trancada, interromper o ato. Verão Branco (2020) se constrói enquanto versão contemporânea da fábula de Édipo, herói trágico que mata o pai numa disputa pela atenção materna inteiramente voltada a si. Psicanalistas e espectadores interessados em psicologia dos personagens possuem farto material de análise a partir da releitura mexicana.
Felizmente, o diretor Rodrigo Ruiz Patterson, em seu primeiro longa-metragem, evita maniqueísmos e espetacularizações de qualquer tipo. Primeiro, opta por coincidir o olhar da câmera com aquele do adolescente: enxergamos o mundo pelo ponto de vista atônito, e um tanto turbulento, do garoto incapaz de compreender a vida adulta. Ross preserva o olhar baixo e feroz, semelhante a um animal acuado, mas prestes a atacar. Ele recebe do roteiro diversas oportunidades de passear por campos sozinho, decorar um trailer abandonado como sua segunda casa, colecionar cacarecos pelo caminho. As cenas solitárias são tratadas com bastante naturalidade pelo cineasta, para quem não é necessário embutir diálogos nem reviravoltas em excesso. Segundo, o namorado da mãe (Fabián Corres) corresponde a uma figura moderadamente interessada pelo garoto, aportando um afeto contido que não representa nem uma ameaça direta, nem a busca por substituir a figura paterna original. Há nuances finamente trabalhadas pelos atores, roteiro e direção. A mãe se revela tão protetora quanto disposta a levar uma vida autônoma, inclusive sexual. A trinca de personagens que domina a narrativa inteira possui complexidade e contradições, como convém às figuras tridimensionais.
A rebeldia contra o destino e a perda de atenção da mãe se canaliza através do fogo. O elemento apropriado à releitura de uma tragédia parte de símbolos simples: o cigarro aceso e um pinheiro incendiado, até adquirir proporções muito maiores. Enquanto os adultos acatam tacitamente o enfrentamento do jovem, ele precisa aumentar o tom para ser enxergado. O fogo o torna visível, enfim. Apesar de ser baseado no tom contemplativo apropriado ao drama, a escalada dos enfrentamentos por meio da piromania se aproxima do suspense. Em contrapartida, o intruso decide repintar as paredes coloridas da casa familiar. Os tons amarelos, vermelhos, azuis e verdes se transformam no “Branco de Verão” do título original, nome da tinta apática escolhida pelo padrasto. Rodrigo se vinga contra esta cor branca de maneiras interessantes, ao mesmo tempo insidiosas e violentas. O diretor sabe representar a sensação de perda de controle: o pré-adolescente não é consultado quanto à chegada do namorado da mãe em casa, quanto às viagens do grupo, às novas cores da casa. Sua vida será apropriada por este homem irritantemente gentil, contra o qual as respostas se intensificam progressivamente. O trailer abandonado, espaço que pertencia unicamente a ele até ser roubado por terceiros, se transforma no ícone perfeito da indignação contra o mundo.
Em termos estéticos, o drama transparece uma condução tão segura quanto discreta. Patterson aposta na tradicional câmera móvel seguindo o personagem por todos os lados, levemente fluida, porém “invisível”, ou seja, sem efetuar qualquer movimentação que não condiga com aquela de Rodrigo. A imagem está condicionada ao corpo e presença do jovem, com direito a belos instantes de poesia da opressão: a janela que se abre para uma avenida, o tédio do adolescente enquanto os adultos conversam ao lado, a dupla cena do aprendizado da direção de automóveis. A iluminação aposta num caráter cru para representar a dura descoberta da masculinidade adulta – talvez crua até demais, visto que o protagonista não ganha qualquer respiro social para além da mãe e o padrasto. O diretor poderia facilitar a vida de Rodrigo caso apresentasse novos amigos, visitasse o pai biológico ou oferecesse subterfúgios que o filme não está disposto a aceitar. No entanto, prefere condensar a catarse na imagem única do fogo. A fábula trágica se converte numa dura lição aos envolvidos, incluindo perdas irreparáveis. A cena final, de uma simplicidade impecável, ressalta tanto o que resta quanto o que se vai definitivamente após um incêndio. Dentro deste contexto, um simples abraço constitui uma solução ao mesmo tempo otimista e bastante triste.
Filme visto online na 44ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, em outubro de 2020.
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Grade crítica
Crítico | Nota |
---|---|
Bruno Carmelo | 7 |
Chico Fireman | 5 |
MÉDIA | 6 |
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