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Sinopse

Um grupo de estudantes universitários, moradores da cidade litorânea de Rio das Ostras, decide organizar um festival de artes no local. Durante a divulgação do evento nas redes sociais, eles são surpreendidos pela repercussão equivocada de um postagem, e as consequências do ato ultrapassam as barreiras do mundo online afetando suas vidas e rotinas diretamente.

Crítica

Há uma ossatura híbrida sustentando a narrativa de Verão em Rildas, longa-metragem do cineasta Daniel Caetano. Todavia, a realidade é escancarada apenas próximo ao fim, quando o significativo excerto documental atravessa a seara ficcional. Esta é construída com base na espontaneidade, vide a câmera que toma caminhos inesperados e os alunos da Universidade Federal Fluminense de Rio das Ostras encarnando personagens que se confundem consigo. O começo é na praia, numa reunião informal permeada por conversas aparentemente banais, mas que servem de ignição ao enredo. Um dos amigos, Mateus, vai se mudar para Londres a fim de cursar mestrado. A turma marca um festival de artes à despedida, encarando os preparativos e se deparando com contratempos. A cena da funcionária pública que os faz aguardar enquanto termina uma fase do jogo eletrônico no computador dá sinais da crítica ao poder público com relação às demandas daquela juventude disposta a celebrar seus vínculos.

Embora seja louvável a busca por naturalidade, algo extraído do amadorismo dos intérpretes, determinadas opções diretivas tratam de dirimir os possíveis bons efeitos. Um exemplo disso é a dinâmica da decupagem, geralmente submetida a uma lógica que intercala planos abertos e fechados num tatibitate cansativo. As situações são destituídas de peso dramático, inclusive circunstâncias específicas enxertadas com o intuito de movimentar a trama. Uma delas, a dificuldade do aluno prestes a migrar à Inglaterra para lidar com a carência da namorada que permanecerá no Brasil. Isso se desenrola, basicamente, em fragmentos esparsos, sem considerável força para configurar algo relevante. O próprio processo de produção do evento, tão importante ao todo, como se percebe adiante, é mencionado como um fator de relativa desestabilização da harmonia do grupo, com problemas se avolumando, sobrepujando a diversão, mas não chega a ser visto e lido de forma a transmitir tal atmosfera de instabilidade.

Verão em Rildas é cortado por fragmentos metalinguísticos, com câmeras e equipe aparecendo, além de microfones “vazando” na imagem. A intenção parece ser a de minar qualquer fluxo de ilusão, embora a própria morfologia do filme trate de instaurar um incômodo latente. A fala dos personagens não prenuncia, ou sustenta previamente, a discussão que a seara documental aborda frontalmente, com o aporte dos testemunhos verídicos. A controvérsia aconteceu, mesmo, tornando-se escândalo por conta de uma performance absolutamente polêmica, depois batizada de Xereca Satânica, em que uma artista inseriu uma bandeira na vagina, além de costurar a própria genitália. Quando Caetano interpela os partícipes/atores, o longa deixa exposta uma questão completamente pertinente, sobretudo no que tange ao conservadorismo e à patrulha ideológica, diligentes quanto à arte cuja intenção é chocar, mas de olhos fechados para as violências cotidianas contra a mulher.

O hibridismo de Verão em Rildas acentua um diletantismo bonito, de onde surgem resultados curiosos. O fato de não propor-se a uma observação convencional faz do filme passível de absorver e projetar a energia daquela galera que fica circunscrita numa cidade pequena e antiquada. Entretanto, falta ao cineasta Daniel Caetano concatenar devidamente as potencialidades do conjunto. Ele acaba incorrendo em banalidades consecutivas, abordando temas e subtextos gratuitamente. Um personagem curioso como o poeta que vende maconha, por exemplo, é preterido em função de deambulações sem peso expressivo, como o devaneio acerca de uma cerveja famosa. Quando se torna documentário, assume demandas muito tímidas na esfera ficcional. Como fruto dessa infertilidade no entrecruzamento das instâncias, a produção fica refém de instantes soltos de inspiração, embora, curiosamente, intente fazer do conjunto, não exatamente das partes, seu grande trunfo para reverberar.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.
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