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Sinopse

Uma cidadezinha se vê dividida entre duas gangues. Quando os membros de uma fraternidade esfaqueiam um dos inimigos, a disputa territorial um tanto pueril se transforma numa intensa guerra urbana.

Crítica

Logo após chegar ao fim da linha com O Fundo do Coração (1981), filme que o obrigou a declarar falência, Francis Ford Coppola precisou voltar ao básico e recomeçar sua carreira praticamente do zero – ainda que já tivesse cinco Oscars em casa. O fracasso foi tão grande que durante a próxima década todos os trabalhos com os quais o cineasta aceitou foram, basicamente, para pagar as dívidas geradas por este projeto. E o primeiro passo neste sentido foi justamente Vidas sem Rumo, adaptação de um livro bastante querido entre o público jovem norte-americano na época – a ideia, aliás, surgiu através de uma sugestão de um grupo de estudantes. E além de lançar toda uma nova geração de astros hollywoodianos, ele ainda conseguiu fazer um trabalho com potencial de se tornar cult com o passar dos anos.

S. E. Hinton escreveu Vidas sem Rumo quando tinha de 15 para 16 anos, e a trama reflete muito do que ela deve ter presenciado entre seus pares – assim como tantos outros adolescentes espalhados pelos Estados Unidos. Autora também de O Selvagem da Motocicleta (1983) – que Coppola levaria às telas no mesmo ano – ela aborda aqui jovens que precisam amadurecer por conta própria, longe dos pais ou de figuras autoritárias, e todo confronto com a lei ou a ordem acaba tendo conclusões turbulentas. Os rebeldes aqui parecem não ter causa, mas suas motivações são mais reais e profundas do que aquelas vividas nas décadas anteriores. São meros garotos, mas com responsabilidades de adultos, precisando se virar sozinhos e tendo como contar somente uns com os outros, sem apoio das instituições ou algo oficial.

O centro da ação está na família formada pelos irmãos Darrel (Patrick Swayze, que tinha 31 anos, mas seu personagem era 11 anos mais novo), Sodapop (Rob Lowe) e Ponyboy Curtis (C. Thomas Howell), o caçula. Os três são órfãos, e enquanto a responsabilidade de cuidar dos dois menores caiu sobre os ombros do mais velho, eles ainda não conseguiram encontrar o melhor jeito de se entenderem. Um exige dos demais uma retribuição à altura do seu sacrifício, o do meio quer apenas seguir fazendo o que gosta e seguir agindo como se nada tivesse acontecido, e o menor tem problemas de autoestima e abandono, sentindo-se rejeitado pelos demais. Isso, no entanto, ainda é pouco se comparado aos problemas vividos pelos amigos: Johnny (Ralph Macchio) declara que até gosta de apanhar do pai, ‘pois assim sabe que ele percebe sua existência’, Dallas (Matt Dillon) recém saiu da prisão, e Two-Bit (Emilio Estevez) e Steve (Tom Cruise) estão tão perdidos que a única coisa que ocupa seus dias são pequenos furtos e arrumar brigas pelas redondezas.

Estes são os Greasers (o apelido vem da brilhantina que usam nos cabelos), e seus inimigos naturais são os Socs, que são exatamente o oposto deles: riquinhos, bem arrumados com suas calças claras e camisas xadrez, com carros modernos e garotas bonitas. Aliás, tudo começa porque uma destas meninas (Diane Lane) resolve, durante uma sessão de drive-in, dar atenção ao papo de um dos garotos Greasers. A tensão entre os dois grupos começa a aumentar ali, mas só chegará ao clímax quando Ponyboy – fugido de casa após brigar com os irmãos – e Johnny se refugiarem à noite em um parque, onde são encontrados pelos Socs. Perseguidos, acabam partindo para a luta, e como estão em desvantagem, a única solução parece ser através de um canivete. E assim a tragédia acontece.

Nossa atenção está nos Greasers, e ainda que estes sejam o tipo de garotos com o qual você não gostaria de se meter na escola ou em um passeio pelo bairro, aqui entendemos suas razões e angústias. E por isso mesmo torcer por eles será quase inevitável, ainda que difícil. Arruaceiros, estão sempre em busca de confusão, sem respeitar nada e ninguém. Porém, quando a oportunidade surge e conseguem mostrar quem realmente são por baixo de tanta pose e instinto de defesa, todos passam a olhá-los de outro modo. De vilões, se tornam heróis. Mas uma mudança como essa não acontece da noite para o dia, e será preciso mais do que apenas um ato de coragem para que o passado se apague e o futuro comece a ser construído. Afinal, para cada passo dado para frente, é preciso estar atento para o preço exigido e o que pode acabar ficando para trás.

Vidas sem Rumo não foi muito bem recebido ao ser lançado nos cinemas, principalmente por causa das diferenças que apresentava em relação ao romance original. Vinte anos depois, uma nova edição do diretor, contendo mais de vinte minutos de cenas extras, limpou um pouco da barra de Coppola, ainda que seja perceptível ser este um trabalho ‘menor’ dentro de sua filmografia. Trata-se, afinal, de um trabalho que não amadureceu muito bem com o passar do tempo, e hoje em dia, mesmo abordando temas que seguem relevantes, se sobressai mais como uma curiosidade no histórico dos envolvidos no elenco – todos, de uma forma ou de outra, acabaram se tornando nomes populares posteriormente – e menos como um título de destaque na carreira do cineasta. Vale a visita, desde que as expectativas não sejam muito altas.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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