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Sinopse

Jeanne é uma ensaísta francesa que escreve diários de suas viagens. Quando decide passar o verão na floresta Nara, no Japão, está na verdade em busca de uma erva medicinal mística, conhecida por 'visão'. Lá acaba conhecendo o guarda-florestal Satoshi, e os dois acabam se apaixonando.

Crítica

A busca pela sensorialidade, sempre presente no cinema da japonesa Naomi Kawase, parece ter se intensificado desde o seu trabalho anterior, Esplendor (2017), que narrava o romance entre um fotógrafo, vivenciando a perda gradativa de sua visão, e uma jovem roteirista de audiodescrições cinematográficas voltadas a deficientes visuais, para tratar da ausência de um dos sentidos humanos como ponte para amplificação dos demais. Já pelo título do novo longa da cineasta, Vision, a continuidade temática parece explícita, sendo reforçada pela presença de uma personagem cega – a anciã (Mari Natsuki), que serve como uma espécie de espírito guardião da floresta de Nara, local onde se situa a trama. Todavia, aos poucos, nota-se que Kawase procura construir a desejada experiência sensorial por uma via ligeiramente distinta, já que a “visão” do título se refere a uma erva que, supostamente, surge a cada mil anos, liberando esporos com o poder de dissipar a dor humana.

É atrás da mítica erva que a francesa Jeanne (Juliette Binoche), acompanhada da jovem tradutora Hana (Minami), parte para o Japão, chegando à citada floresta de Nara, onde conhecem Tomo (Masatoshi Nagase), guarda-florestal que há 20 anos vive recluso no local e que as hospeda em sua casa. Desenvolve-se, então, uma relação entre Jeanne e o solitário Tomo, enquanto ambos acabam tendo que lidar com fantasmas pessoais do passado e projeções do futuro. Entre flashbacks e o que se supõem como vislumbres de um salto temporal à frente – as cenas dos anciões discutindo a transformação do vilarejo – Kawase investe em uma narrativa solta, de conexões menos rígidas, estabelecendo um fluxo de sugestões que vai se tornando cada vez mais hermético na concepção de seu drama metafísico. Essa busca pela espiritualidade, envolvida pelo elemento das forças da natureza, não é novidade na obra da diretora, vide títulos anteriores como O Segredo das Águas (2014) ou aquele que elevou seu nome a um novo patamar, Floresta dos Lamentos (2007).

Contudo, falta a Vision aquilo que se mostrava a verdadeira força dos dois exemplos mencionados, bem como das incursões da cineasta por um melodrama mais escancarado, abraçando o sentimentalismo de forma sincera, como em Sabor da Vida (2015): a construção de personagens e conflitos tangíveis, consistentes, que povoem com empatia a atmosfera poética pretendida. Em determinado momento, Hana comenta com Jeanne que Tomo parece tão inerte quanto a montanha que guarda. Pois, assim como já ocorrera em Esplendor, a inércia aparenta, de fato, dominar a narrativa e seus protagonistas, fazendo com que sua carapaça lírica envolva algo quase sempre vazio e artificial. Muito dessa sensação se deve aos diálogos calcados em digressões repletas de platitudes alegóricas, como “A felicidade mora no coração de cada um” ou “O amor é como as ondas, nunca para”, e que enfraquecem ainda mais quando, a partir da saída de cena da tradutora, passam a ser em inglês, soando pouco naturais até mesmo na boca de Binoche, mais acostumada ao idioma do que Nagase.

Sem contar com o poder das palavras, o longa tenta se impor pelo poder da beleza estética, com Kawase compondo planos elaborados por meio de um sem fim de ultra close-ups da vida natural, contraluzes, reflexos e filtros, na tentativa de imprimir uma aura etérea a cada imagem. O arrebatamento visual, porém, não é equiparado pelo emocional, cujo efeito fica restrito aos personagens – em menos de meia hora de projeção, Jeanne se emociona e chora ao menos três vezes, por exemplo – e raramente se estende ao espectador. A transcendentalidade não é atingida nem mesmo pelo mergulho sem pudores no campo místico apresentado no desfecho, já que Kawase não sustenta o hermetismo onírico inicialmente visto, se rendendo à necessidade convencional de expor a solução para o quebra-cabeça envolvendo os traumas pregressos de Jeanne e que, no fim das contas, não se mostra tão impactante quanto o imaginado.

Com isso, o potencial de Vision para um estudo denso e carregado de lirismo sobre a dor e a solidão, tendo como suporte dois ótimos intérpretes nos papéis principais, é diluído, resultando em uma jornada frívola e sintética. O que antes no cinema de Kawase era um minimalismo preciso, aqui é apenas raso, e o que era enaltecido – com méritos, diga-se – como sensibilidade dramática, acaba, não raro, esbarrando na pieguice. Um segundo passo em falso consecutivo da cineasta, que interrompe, e mesmo a distancia, de uma esperada depuração de estilo.

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é formado em Publicidade e Propaganda pelo Mackenzie – SP. Escreve sobre cinema no blog Olhares em Película (olharesempelicula.wordpress.com) e para o site Cult Cultura (cultcultura.com.br).
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