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Crítica


9

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1 voto 8

Onde Assistir

Sinopse

Parte fundamental da história da música popular brasileira, Luhli e Lucina foram pioneiras por lançar discos de forma independente no Brasil, como instrumentistas e na maneira como conduziram suas vidas pessoais.

Crítica

Há uma profunda ligação entre a natureza e a arte multifacetada da dupla Luhli e Lucina. Não à toa, as primeiras imagens de Yorimatã evocam essa cumplicidade. O cineasta Rafael Saar busca dimensionar as artistas como fenômenos espaciais, por assim dizer, ressaltando sempre que pode o valor delas para o meio, e vice-versa. Mesmo que haja suporte imprescindível dos depoimentos do agora, que dão conta de reavaliar o passado a partir de um distanciamento possível, os dispositivos que realmente importam para a beleza do filme são os fragmentos do ontem, de um tempo que deixou saudade. Demora-se intencionalmente no vislumbre dos shows iniciais e dos registros do cotidiano. A força da arte de Luhli e Lucina é desenhada na tela com uma reverência quase ritualística, necessária para que, ao menos minimamente, consigamos perceber com mais amplitude a expressividade de seus talentos.

Ao longo de Yorimatã, somos apresentados a essa trajetória marcada pela liberdade e por uma intenção irrefreável de cantar as coisas do coração com a mesma verdade com que se procura usufruir o amor. Assim como refutaram as gravadoras que tentaram de qualquer maneira colocar-lhes um cabresto, elas não ligaram para as convenções da sociedade quando se deram conta que a amizade havia virado amor. Luhli era casada com Luiz Fernando. Lucina, mais jovem, não hesitou em vivenciar com eles o relacionamento a três, numa comunidade fluminense afastada dos centros urbanos. As imagens de arquivo mostram ambas sendo mães dos filhos que ali cresciam, subsistindo do que a terra e o mar davam, aproveitando a aurora, muitas vezes, para dar vazão à criatividade, em composições que jorravam abundantes.

Yorimatã é formalmente moldado pela essência das retratadas. Vemos isso nas constantes associações poéticas entre imagens e palavras, e na maneira como o roteiro nega uma progressão estritamente cronológica e convencional. Ney Matogrosso, Tetê Espíndola, entre outros nomes mais ou menos conhecidos do grande público, aparecem para dar depoimentos. Estas participações externas são, geralmente, interações com Luhli e Lucina, pedaços de bate-papos do presente em que todos relembram o passado com um saudosismo não melancólico. Musicalmente falando, o filme é muito competente ao ressaltar a versatilidade da dupla. Elas trafegaram por diversas vertentes, negando rótulos e delimitações que pudessem restringir sua potência criativa. Singular, o trabalho com os atabaques só não chama mais atenção que a profundidade das letras e a beleza das melodias.

Em Yorimatã, fala-se muito de amor e pouco de sexo. Fica implícito, quando não ligeiramente explícito pelas carícias e os beijos na boca, que elas compartilharam um sentimento intenso, cujos lastros perduram até hoje. Luhli e Lucina viveram em função da arte e da vida, não fazendo muita distinção entre as duas. O documentário de Rafael Saar dá relevo considerável ao espirito de uma época pautada por formas menos automatizadas de estabelecer relações e fruí-las, uma era mais romântica e idealista. Outro mérito evidente é a valorização da importância musical de Luhli e Lucina. Cada fase sonora é registrada atenciosamente, com minutos preciosos rendidos à contemplação de gravações antigas que mostram a significância desse legado. Luhli e Lucina ganham uma homenagem à altura de sua envergadura artística.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

Grade crítica

CríticoNota
Marcelo Müller
9
Edu Fernandes
7
MÉDIA
8

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