Zaatari: Memórias do Labirinto
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Paschoal Samora
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Zaatari: Memórias do Labirinto
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2018
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Brasil / Alemanha
Crítica
Leitores
Sinopse
Crítica
Mãos sobre os olhos. De uma, duas, três e mais pessoas. Homens, mulheres, jovens e velhos. Um povo que não pode falar, por medo de represálias. O que enxergam, é preciso apagar da memória. Com a visão fechada, eles até podem pensar em algo melhor. Zaatari: Memórias do Labirinto lida com um assunto muito delicado. Entre 2011 e 2018, a guerra civil na Síria já matou mais de 500 mil pessoas e exilou outras cinco milhões. E o filme de Paschoal Samora olha para esse povo esquecido no meio do fogo cruzado, sem culpa do que lhes acontece. No Deserto de Mafrak, fronteira do país com a Jordânia, criou-se um dos maiores campos de refugiados do mundo. Ninguém quer estar ali. Porém, para onde ir quando não há qualquer lugar seguro?
Somos bombardeados com dados técnicos e extraoficiais da situação dos refugiados, mas Samora vai além: com a câmera na mão, permite a essa gente sem voz falar sobre suas vidas, sonhos e anseios. Famílias viviam na área rural e foram obrigadas a deixar o trabalho no campo e seus lares, por conta do medo de um tiro, de uma bomba. Dos mais simples aos mais sábios, ninguém é poupado. Uma mulher mira seu antigo lar, antes tão povoado e agora deserto. Chega a ficar apreensiva de estar ali, pois o silêncio é aterrador. Há preocupação constante com a violência, que começa silenciosa e, gradativamente, se torna ensurdecedora. Essa mesma mulher, fotógrafa corajosa que não pode revelar o rosto, quer que outros vejam através de seus olhos as imagens registradas. Algumas belas, outras hipnóticas. Porém, a maior parte, brutalmente chocante.
Samora tem uma filmografia variada. Já retratou, ao lado de Eliane Brum, a vida da dançarina Gretchen em Gretchen Filme Estrada (2010) e dirigiu a minissérie animada Terra Prometida (2016). A curiosidade pela história do mundo e pelo retrato humano no cotidiano chegou até aqui, num dos eventos mais catastróficos do início deste século. É o reflexo de como uma guerra civil atinge os mais fracos, não apenas fisicamente, mas na mente. Por isso, é preciso expandir o conhecimento, mas, especialmente, entender como se expressar. Numa aula, a professora, vendada dos pés à cabeça, ensina suas alunas sobre um filósofo detido na base da fotografia. Próximo dali, adultos (alguns aleijados por ferimentos) buscam na interpretação, no teatro, uma forma de desabafo. Quem sabe, ainda, a revelação de novos talentos artísticos para o mundo.
Não à toa, o nascimento de um bebê é um sopro de esperança e a melhor forma de encerrar uma história que, infelizmente, não tem fim. Quem sabe uma nova geração finalmente compreenda os erros das outras e possa, de fato, andar com a cabeça erguida e os olhos abertos. A pior cegueira é a de quem não entende que violência apenas gera a mesma coisa em dobro, ou mais. Zaatari: Memórias do Labirinto fala da pior crise de migração na história da humanidade desde a vista na Segunda Guerra. Porém, mais que isso, ensina uma lição de humanidade. Só falta, a quem lidera atrocidades como essa guerra civil, aprender isso.
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