Crítica


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Sinopse

Um informante contata dois jornalistas dizendo que tem evidências para provar crimes acontecidos durante a ditadura militar uruguaia.

Crítica

Zanahoria se encaixa perfeitamente na tradição dos bons filmes sobre jornalismo. É praticamente um Todos os Homens do Presidente (1976) uruguaio, com direito ao seu próprio Garganta Profunda e uma dupla de jornalistas que vão atrás das pistas para construir sua história. A grande diferença é que Carl Bernstein e Bob Woodward tiveram mais sorte ao seguir as migalhas de pão deixadas por seu informante naquela trama envolvendo o ex-presidente Richard Nixon do que os repórteres uruguaios desta interessante produção comandada por Enrique Buchichio, que também assina o roteiro, baseado em fatos reais.

Situado em 2004, há poucos dias das eleições presidenciais, Zanahoria nos apresenta o jornalista investigativo Alfredo (Abel Tripaldi), que está atrás de uma história que pode reverter os caminhos da disputa. Em meio a isso, um misterioso sujeito chamado Walter (Cesar Troncoso) entra em contato prometendo documentos confidenciais e gravações de tortura da época da ditadura, que seriam entregues com exclusividade ao jornalista. Sedento por esse furo, mas temendo por sua segurança, Alfredo convida seu colega Jorge (Martín Rodríguez) para acompanhá-lo nesta empreitada. Os dois entram em uma espiral de paranoia e suspense, com Walter os guiando de forma cautelosa pelos meandros de um passado doloroso para o país. Entrar em mais detalhes a respeito do misterioso Walter seria estragar a surpresa do espectador. Basta dizer que a tradução literal do título Zanahoria para o português é “cenoura”. Não muito diferente da cenoura que é colocada à frente de um burro para que ele continue trotando, sem nunca atingir seu objetivo, Walter esfrega na cara daqueles jornalistas as informações que eles tanto querem, mas demora demais para entregá-las. Isso desperta dúvidas em Alfredo e em Jorge, que abandonaram sua rotina para buscar aquelas verdades impactantes.

Bem escalado, o elenco apresenta interpretações consistentes, com destaque para Troncoso e Tripaldi. O primeiro entra na pele daquele sujeito enigmático, vivendo nas sombras e sempre com uma desculpa na ponta da língua para não entregar o prometido. O segundo é uma figura incansável, um jornalista com faro para a notícia, mas que pode se perder exatamente por esta inabalável vontade de trazer à tona verdades bombásticas. Conscientemente, Buchichio utiliza sua narrativa para traduzir os círculos pelos quais andam os seus personagens. Por isso, não estranhe caso o filme parecer repetitivo no segundo ato. As desculpas reiteradas do personagem de Troncoso são a tônica disso. É bem verdade que poderíamos perder uns 15 minutos de “gordura”. Mas da forma como é realizado, Zanahoria transmite bem ao espectador aquele espiral de mistério engendrado por Walter.

Com bom clima de suspense e personagens curiosos e cativantes, Zanahoria é uma bela surpresa. Um filme que pode ser utilizado em disciplinas de jornalismo para mostrar que nem sempre aquela pista quente pode ser, realmente, o furo de notícia que se esperava. Felizmente, a dupla uruguaia de jornalistas conseguiu transformar o limão em limonada e redigiu uma matéria que, basicamente, se transformou neste filme. Se é verdade que a história é escrita pelos vencedores, por vezes é bom conferir o que os perdedores têm a dizer.

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é crítico de cinema, membro da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul. Jornalista, produz e apresenta o programa de cinema Moviola, transmitido pela Rádio Unisinos FM 103.3. É também editor do blog Paradoxo.
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