23ª Mostra de Tiradentes :: Segunda noite tem duas belas fábulas surrealistas com O Lodo e Sofá

Publicado por
Bruno Carmelo

A curadoria da 23ª Mostra de Cinema de Tiradentes tem se mostrado atenta às afinidades e diálogos entre os filmes. Além da bela coesão das mostras de curtas-metragens (Foco Minas, A Imaginação como Potência), os dois longas-metragens exibidos na noite de sábado conversam muito bem um com o outro.

O Lodo (2020), dirigido por Helvécio Ratton, e Sofá (2020), dirigido por Bruno Safadi, constituem duas curiosas experiências de humor surrealista, dentro do formato fabular. Ambos os projetos trazem formatos de imagem mais próximo do quadrado, ambos brincam com as cores para subverter as estruturas do poder (a política para um, a masculinidade para outro). A própria analogia entre o sofá, do filme homônimo, e o divã em Lodo permite o entrelaçamento de leituras.

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O Lodo

 

Adaptado de Murilo Rubião, O Lodo traz a história de Manfredo (Eduardo Moreira), corretor de seguros de classe média, que se vê perseguido por um terapeuta após a primeira consulta. Aos poucos, o “lodo” que possui dentro de si – os traumas de infância, em especial – começam a tomar conta dele, e o homem perde controle sobre sua vida. Os atores e a direção estão em plena sintonia nesta história de um absurdo discreto, porém bastante coeso. Confira a nossa crítica.

Muito menos discreto é Sofá, comédia que pinta cada cena com uma cor diferente, coloca suas imagens de ponta-cabeça e imagina uma trama absurda envolvendo piratas e políticos. A “paródia tropical” (o cinema brasileiro tem adorado reivindicar a sua tropicalidade ultimamente, com A Vida Invisível e Um Animal Amarelo) usa as figuras populares de Ingrid Guimarães e Chay Suede para discutir as remoções da população desprivilegiada do Rio de Janeiro durante as obras para a Cidade Olímpica. Confira a nossa crítica.

 

O Sofá

 

Além dos longas-metragens, a Mostra de Tiradentes apresentou nível altíssimo entre os curtas-metragens da Mostra A Imaginação como Potência. Quatro filmes tensos e claustrofóbicos – a maioria bastante escura e silenciosa – questionam a ordem e a estética dominante através de experiências de dilatação do tempo (Pattaki) e fragmentação da narrativa (Inabitáveis), aproximando-se da performance (O Verbo se Fez Carne) em temáticas anticolonialistas e defensoras dos indivíduos LGBT (A Felicidade Delas, Inabitáveis). Trata-se de uma seleção radical que funciona muito bem em conjunto.

A 23ª Mostra de Tiradentes continua no domingo, dia 26, com a exibição dos longas-metragens inéditos Sertânia, de Geraldo Sarno, e Um Dia com Jerusa, de Viviane Ferreira. Entre os curtas-metragens, a Mostra Foco Minas tem sua segunda sessão, enquanto a Mostra Panorama exibe seus primeiros filmes.

As duas abas seguintes alteram o conteúdo abaixo.
Crítico de cinema desde 2004, membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema). Mestre em teoria de cinema pela Universidade Sorbonne Nouvelle - Paris III. Passagem por veículos como AdoroCinema, Le Monde Diplomatique Brasil e Rua - Revista Universitária do Audiovisual. Professor de cursos sobre o audiovisual e autor de artigos sobre o cinema. Editor do Papo de Cinema.

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