Nesta sexta-feira, 26 de março, chega ao Amazon Prime Video a primeira série de ficção original da empresa: 5X Comédia, uma adaptação da peça de teatro homônima. O conceito das cinco esquetes cômicas foi levado ao contexto da pandemia de Covid-19 e ao isolamento social. Ao longo dos episódios, o espectador descobre o personagem hipocondríaco (Gregório Duvivier), o porteiro do prédio (Rafael Portugal) explorado pelo morador rico (Gabriel Godoy), que não quer se expor ao vírus, o youtuber disposto a tudo para conseguir likes (Yuri Marçal), a mulher em crise financeira (Martha Nowill) que passa a fazer apresentações virtuais de sexo…
Mas as pessoas em casa não estariam cansadas de ouvir falar diariamente sobre a pandemia? Em coletiva de imprensa nesta quarta-feira, 24, Malu Miranda, diretora de conteúdos originais da Amazon, explica:
“Quando a Monique [Gardenberg] veio com essa ideia em março do ano passado, a gente entendia que estava num momento que ia transformar o planeta, e que era muito importante falar sobre isso. É claro que ninguém sabia, e ainda não sabe, quanto tempo isso vai durar. Mas era necessário retratar este momento que a humanidade está passando, e esse registro vai ficar para sempre. Essa série é sobre todas as formas de amor, nossos medos, nossa solidão e incerteza, e o que nos fortalece. A gente é extremamente solidário com o que todos os seres humanos estão passando agora, mas o projeto traz uma leveza em relação a tudo por que estamos passando”.
“É um desafio criar algo para ser filmado nesta situação, primeiro por ser feito remotamente, e depois porque talentos do mundo inteiro já vêm tratando desse assunto”, completa Monique Gardenberg. “Assim como Chaplin fez O Grande Ditador (1940) em plena guerra, Lubitsch fez Ser ou Não Ser (1942), e Jojo Rabbit lidou com temas complexos, meu desafio era saber como trazer o riso de forma responsável. A forma responsável é através da dor, com um lado também assustador. A gente vai rir, se emocionar e se assustar com a nossa própria realidade. A comédia é um espelho. A minha busca foi contar isso de maneira diferente, para surpreender o espectador. A gente tem que continuar falando e elaborando estas questões. Talvez a chave da comédia seja a mais pertinente neste momento, por ter uma função coletiva”.
Gregório Duvivier evoca sua experiência pessoal de isolamento: “Tem muitas pandemias dentro da pandemia, muitos isolamentos dentro do isolamento. Eu passo por fases diferentes durante o dia, do desespero ao ódio e à frustração. Você olha o jornal e sente uma coisa, olha o extrato bancário e sente outra. É um turbilhão de quarentenas dentro da mesma quarentena. Isso está retratado nessa série. Não são as mesmas cinco histórias, e nem são as histórias que estamos vendo por aí. Não é apenas um lamento pelo fato de estar todo mundo confinado. Falar de pandemia é falar de solidão, mas também de solidariedade, de família, de amor, de hipocondria, de morte”.
Intérprete de um empresário negacionista e pouco preocupado com a saúde dos trabalhadores ao redor, Gabriel Godoy confessa que ficou preocupado em fazer um projeto sobre a pandemia enquanto ela ainda atinge números expressivos no Brasil. “Tem um receio quando te chamam para fazer uma série no meio da pandemia, mas também é um combustível quando te convidam para trabalhar. Além disso, era uma comédia! A comédia precisa promover o debate e a reflexão. Quando chegou meu episódio, vi que era bem pesado: existem vários Edgares por aí”.
Uma das maiores curiosidades em relação a 5x Comédia diz respeito ao processo de filmagem remota. No episódio Hipocondríaco, por exemplo, a diretora simula a convivência dos personagens na mesma casa, embora as filmagens tenham ocorrido em três lugares diferentes.
“Esse era o meu maior tesão”, confessa Gardenberg. “A gente teve um rigor muito grande em filmar remotamente. Não queria deixar figurino e fotografia deverem para qualquer série filmada presencialmente. Tivemos atritos com as equipes porque me diziam que eu queria um padrão alto demais para um projeto remoto. No final, tivemos uma direção de arte bastante rígida, escolhendo uma paleta de cores para cada episódio. A Katiúscia Canoro, por exemplo, estava em Florianópolis, e precisamos comprar os mesmos objetos [para reproduzir a ideia de estarem na mesma casa]. Foi reconfortante saber que podemos fazer remotamente, porque precisamos continuar criando. Quando eu quero me acalmar neste turbilhão, eu vejo filmes e séries. É isso que me resgata”.
“Pensar que o Rafael Portugal nunca saiu da casa dele, mas estava ao mesmo tempo na recepção de um prédio, num hospital de luxo e num quartinho, foi o nosso grande desafio”, continua a criadora, a respeito do episódio Colapso. “Eu passei cinco semanas sem sair do meu quarto, e dirigi uma série. Nós usamos a irmã do Gregório, a namorada do Gabriel e a namorada do Yuri para segurarem a câmera. O foco era feito remotamente. Foi um trabalho lindo de colaboração”.
Obviamente, este dispositivo afetou diretamente a rotina dos atores, que literalmente incorporaram a equipe de filmagem em seus lares. “De repente, chega na tua casa câmera, lapela e boom, e você precisa se virar, e fazer todas essas funções. Aprendi algo completamente novo, que eu não tinha como artista”, explica Gabriel Godoy.
Gregório Duvivier brinca que sua família está sendo explorada com a carga de trabalho intensa dentro de casa, o que inclui as gravações de Greg News e Porta dos Fundos. Mas aponta a satisfação de poder viabilizar esses projetos durante a crise:
“Talvez há dois, três anos a gente nem conseguisse fazer essa série, mas as ferramentas melhoraram muito. Hoje podemos falar com várias pessoas ao mesmo tempo, e dá certo. É claro que não tem o calor humano, mas acho que a interação imprime. A coisa de equilibrar o drama com a comédia, a tristeza com o humor, é onde mora o filé mignon da dramaturgia e da vida também. A encruzilhada do drama e da comédia é também o ponto em que se percebe que vamos morrer, e exatamente por isso precisamos saber rir da vida”.
Malu Miranda já pensa no futuro: “Esta é uma nova era para o Brasil. Provavelmente daqui a 20, 30 anos, ainda vamos ver projetos que refletem sobre o período que atravessamos agora”.
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