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O presidente Jair Bolsonaro falou algumas vezes que se pudesse acabaria com a Ancine, a Agência Nacional do Cinema, mimetizando a atitude autoritária do “caçador de marajá” Fernando Collor de Mello diante da extinta Embrafilme. Sem alternativas cabíveis para evitar o colapso de uma indústria pulsante e lucrativa, o que tal atitude traria de benefício à classe? Você acertou se pensou: NADA. Pois bem, como não foi possível desarticular a instituição, a política vigente parece ser a de torna-la obsoleta, quando não contraproducente. Senão vejamos. Passado mais de um mês após a reunião do Comitê Gestor do Fundo Setorial Audiovisual, cujo assunto principal foi a retomada dos investimentos num setor tão combalido por conta das paralisações necessárias diante de uma pandemia, nada aconteceu. Sabe aquele papinho de recrutador que para encerrar o encontro diz: “vamos ficar com seu currículo e qualquer coisa a gente te liga”? Pois, é, a Ancine tampouco tem “ligado” a quem deveria.

Recentemente, a entidade aprovou que os Drive-in sejam reconhecidos como a primeira janela. Assim, possibilitou aos filmes incentivados com recursos públicos, obrigados contratualmente a terem premières nas telonas, que estreiem nesses espaços alternativos enquanto a pandemia perdura e os protocolos de distanciamento ainda se fazem essenciais. Na teoria parece bom, mas na prática a coisa não é bem assim, pois para estar apto a isso os Drive-in precisam seguir uma série de regras quase proibitivas nesses tempos de adaptação – ver mais sobre isso neste link. Não há muito tempo, a Ancine exonerou a então coordenadora de Gestão de Negócios, Mastroiane Bento Dias, por ela ter se recusado a paralisar as contratações de projetos. Ou seja, se a atitude é assertiva o servidor corre risco.

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Nos bastidores da Ancine ordens contraditórias criam deliberadamente um clima de confusão. Embora contratações de projetos estejam suspensas por decreto, aos produtores é possível continuar se candidatando. Bombas de fumaça para despistar um desmonte, inclusive com recusa de encarar a imensa quantidade de liminares judiciais que já obrigam a Ancine a dar prosseguimento a processos paralisados há bastante tempo. Multas por descumprimento se avolumam e a tão propalada dificuldade financeira cresce, com a aparência anuência dos mandatários.

De acordo com o jornalista Jotabê Medeiros, do site Farofafa, em matéria da qual nos valemos como inspiração e fonte para esta, há também um aparelhamento político da instituição, com cargos importantes sendo distribuídos ao chamado Centrão, numa velha prática chamada “toma lá, dá cá”, aliás, esta que Jair Bolsonaro atacou veementemente durante a sua raivosa campanha rumo ao planalto. Então, por fora, a Ancine está operacional, despachando, expedindo e deliberando. Uma breve pesquisa no Google nos mostra que aparentemente a entidade está “analisando a prestação de contas de cerca de 4 mil projetos”, “marcando reuniões importantes”, mas, na prática os produtores estão sofrendo à míngua. Mas, é bom que cuidemos também de algo: lá atrás, a Embrafilme foi gradativamente sendo tornada obsoleta, o que facilitou seu processo de extinção por conta da falta de resistência da opinião pública. Não é cabível que a Ancine seja extinta. Ela precisa apenas voltar a ser efetivamente relevante.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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