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“Ai meu Deus, estou na mesma sala que a Margot Robbie!”. Um jornalista, aguardando pela coletiva de imprensa, não conseguia esconder a empolgação de se encontrar diante de Margot Robbie, Mary Elizabeth Winstead, Jurnee Smollett-Bell, Rosie Perez, Ella Jay Basco e a diretora Cathy Yan, os principais nomes por trás de Aves de Rapina, superprodução da Warner prevista para fevereiro de 2020. A Comic Con Experience tem essa característica singular: o evento mistura profissionais e fãs, de modo que diversas figuras da imprensa se transformavam em jovens diante dos seus ídolos.

Felizmente, o evento correspondeu à alta expectativa das dezenas de convidados presentes: o elenco e a diretora, ao lado dos dois produtores, foram não apenas bastante simpáticos e disponíveis às perguntas, mas também demonstraram maturidade para responder a questões mais complexas, como a ética de representar personagens violentas no cinema. Afinal, em Aves de Rapina: Arlequina e sua Emancipação Fantabulosa, a personagem rompeu o relacionamento com o Coringa, e prefere se unir a outras vilãs para salvar uma garota, vítima de um chefe do tráfico. Abaixo, você descobre os destaques dessa conversa:

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Coletiva de imprensa em São Paulo

De Esquadrão Suicida (2016) a Aves de Rapina

Margot Robbie abriu a conversa falando sobre suas motivações de retomar a personagem: “Havia muito da personalidade da Arlequina que a gente não tinha conseguido explorar em Esquadrão Suicida. Eu não estava pronta para parar de interpretá-la. Queria ver, em especial, como ela interagiria com outras mulheres, como ela ficaria num grupo de garotas”.

A diretora Cathy Yan concorda que esta produção será muito diferente do filme de 2016: “Eu cresci vendo Batman, então para mim foi uma honra comandar esse universo. Adorei explorar um lado novo de Gotham – muito mais colorido, como vocês vão ver!”. Jurnee Smollett-Bell inclusive brincou que esta seria a primeira vez em que os fãs descobririam Gotham sob a luz do dia, ao contrário das habituais representações sombrias da cidade. “Sinto que estou numa nova fase da DC”, completou a jovem atriz.

Viva a diversidade

Um dos principais tópicos de discussão durante a coletiva de imprensa foi a oportunidade de ter um longa-metragem de ação dirigido e estrelado por mulheres, que comandam as lutas sozinhas, sem precisar ser salvas por homens. Robbie antecipou que a história “vai apresentar o estilo individual de luta de cada uma delas, mas depois elas perceberão que funcionam muito melhor em grupo”.

Rosie Perez fez questão de frisar que a representatividade vai além do protagonismo feminino: “O elenco é predominantemente multiétnico, e atrás das câmeras também. O fato de sermos fortes e estarmos lutando contra vilões é apenas a cereja do bolo. Estas mulheres são complexas, e não objetificadas pelas câmeras. O feminismo não é apenas para mulheres: trata-se de igualdade”.

Ela ressaltou a importância de ser uma mulher latina de 55 anos de idade participando de cenas de ação e integrando a luta ao lado das novas gerações. As atrizes inclusive afirmaram que o ponto de vista feminino teria sido um atrativo para Ewan McGregor e Chris Messina, que integraram este universo especialmente pela oportunidade de reconfigurar as regras do gênero.

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Lute como uma garota

A diretora fez questão de frisar que as coreografias de luta tiveram os mesmos coordenadores da saga John Wick, exigindo treino duro das atrizes durante meses para fazerem suas próprias cenas de ação. “Elas provavelmente quiseram me matar. Desculpa!”, disse a diretora, em referência às longas cenas com um ou dois minutos ininterruptos, com várias personagens lutando ao mesmo tempo. “E se alguém errasse, a gente precisaria começar tudo de novo!”, lembram as atrizes. “A gente pensou em denunciar você algumas vezes!”, brincou Smollett-Bell.

A preparação física constituiu o principal desafio para o elenco, que confessa ter ficado “cheio de roxos”. “Mas depois aprendi a dar um chute incrível! É impressionante o que consegue adquirir através da profissão de atriz”, completa Smollet-Bell. “Foi ótimo poder chutar as bolas de alguns caras gigantes”, afirmou Ella Jay Basco. “Essas personagens são exemplos reais para todas nós!”, ironizou Robbie. Perez confessou ter machucado gravemente o joelho no início das filmagens, embora tenha sido aconselhada a continuar treinando outras partes do corpo até fortalecer o joelho a ponto de continuar a se exercitar. Para ela, tamanha cobrança significou um incentivo e uma responsabilidade.

“Já vimos muitos heróis de capa, voando graças a vários efeitos especiais”, ressalta a diretora. “Mas nós queríamos trazer algo diferente às cenas de ação. As meninas fizeram quase todas as cenas de ação sozinhas. As explosões eram reais, produzidas em set, e os cenários também eram reais. Queríamos criar a impressão de algo mais realista, mais próximo de identificação”.

(Anti-) heroínas

Quando questionada sobre a responsabilidade de se tornar um modelo de representatividade para jovens garotas, Robbie e as outras atrizes levaram a conversa descontraída a uma reflexão mais profunda: “Quando interpretei a Arlequina pela primeira vez, nunca pensei que ela seria considerada um modelo. Ela é uma sociopata, presa em um relacionamento tóxico. Fiquei surpresa. Quando aceito convites para algum filme, sempre penso se ele vai trazer algo positivo ao mundo, mas ao mesmo tempo, preciso honrar o universo próprio ao filme. Depois pensei que talvez as pessoas tenham se identificado com as falhas da Harley, e com a possibilidade de superá-las”.

Mary Elizabeth Winstead comemorou o fato de estas personagens serem falhas, e mesmo imorais em alguns momentos: “Agora temos anti-heroínas mulheres no cinema, algo que antes era reservado aos homens. São as falhas que tornam estas personagens interessantes. Mesmo assim, elas querem trabalhar juntas, e buscam melhorar como pessoas, apesar destas falhas”.

“Queríamos mostrar mulheres reais, com fraquezas e imperfeições”, concorda Smollett-Bell. “Estávamos sedentas por ver o mundo real no cinema de ação”, ao que Basco completa: “Esse é um filme realista. Elas não são mulheres perfeitas, vivendo num mundo perfeito. As personagens enfrentam os mesmos problemas de qualquer pessoa”.

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Detalhe do cartaz de Aves de Rapina

Adaptação, porém original

Aos fãs dos quadrinhos originais da Arlequina, Cathy Yan confirmou que a história certamente deve muito ao material de origem, mas não se baseia em nenhuma história em particular, o que conferiu muito mais liberdade às criadoras. Margot Robbie confessa ter devorado todo o conteúdo literário relacionado à personagem, apenas para se chocar com a violência da Arlequina em algumas histórias, especialmente “Behind Blue Eyes”, quando a atitude em relação a uma garotinha é mais do que condenável:

“Percebi então que ela é uma anti-heroína, mas não uma vilã. Arlequina faz muitas coisas ruins, mas ao mesmo tempo, ela se sente culpada por isso. Ou seja, ainda existe esperança para ela”. Devido a esta complexidade, a atriz afirma ser possível ter tanto carinho pela personagem, mesmo sem defender as suas atitudes.

(O Papo de Cinema é um veículo credenciado oficial da CCXP 2019)

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Crítico de cinema desde 2004, membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema). Mestre em teoria de cinema pela Universidade Sorbonne Nouvelle - Paris III. Passagem por veículos como AdoroCinema, Le Monde Diplomatique Brasil e Rua - Revista Universitária do Audiovisual. Professor de cursos sobre o audiovisual e autor de artigos sobre o cinema. Editor do Papo de Cinema.
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