Cine Esquema Novo 2021 :: Balanço da 14ª edição

Publicado por
Marcelo Müller

Sediado tradicionalmente na cidade de Porto Alegre, o Cine Esquema Novo tem um grande diferencial em relação à boa parte dos eventos cinematográficos do Brasil. Nele, há espaço cativo à videoarte, às instalações e às demais possibilidades do audiovisual. No que tange aos espaços, contempla, além de salas convencionais de cinema, as galerias de arte e os espaços públicos da capital gaúcha. A pandemia da Covid-19, que praticamente resumiu a fruição à tela do computador e/ou à televisão, impôs um desafio adicional à equipe de curadores: como resolver a questão de garantir tais experiências? E a resposta veio por meio dos Cadernos de Artistas. Ao todo, 31 selecionados abriram seus baús de criação, permitindo-nos acesso a rascunhos, anotações, rabiscos, reflexões pré e pós-realização. Enfim, o diálogo pôde ser ampliado para além da exibição dos filmes. Claro, debates e outras atividades paralelas, outra marca registrada do CEN, também fizeram presente no cardápio da edição que superou expectativas e desafios.

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Outra curiosidade bem-vinda que destaca o Cine Esquema Novo no cenário dos eventos brasileiros é a não segmentação por duração, formato e/ou gênero. A mostra competitiva engloba curtas, médias, longas, animações, documentários, ficções, mocumentários, experimentações, etc. Desse modo, filmes que exploram o romantismo estão lado a lado com obras que extraem força da retórica política intensa. Tentativas de provocar rupturas por meio de sons e imagens convivem harmônica e complementarmente com obras menos preocupadas em subverter as lógicas da narrativa clássica. Então, palmas à curadoria que soube muito bem criar um itinerário possível em meio a tantas diferenças. Mais que pensar a separação entre um filme do outro, o Cine Esquema Novo sublinhou a importância das singularidades para termos uma ideia acentuada de vivência, reprodução e expressão pela arte.

Em 2021, o grande homenageado foi o ator/cineasta Welket Bungué, nascido na Guiné-Bissau, mas radicado ora no Brasil, ora no continente europeu que o viu crescer. Depois de (re)ver os curtas dele disponíveis, inclusive o mais recente, exibido no Festival de Berlim 2021, fizemos uma entrevista exclusiva com esse jovem eloquente e evidentemente apaixonado por realizar e refletir sobre o cinema. O resultado você pode ler aqui. Além disso, o Papo de Cinema conferiu de perto boa parte das produções que estrearam no Cine Esquema Novo 2021. Alguns debutes foram regionais, outros nacionais e houve ainda vários deles a nível mundial. Do diálogo existencialista do gaúcho Eu Não Sou um Robô (2021) ao debate necessário sobre a saúde mental da população negra, visto em As Vezes que Não Estou Lá (2021), o recorte promovido pela curadoria permitiu um diversificado com propostas e iniciativas diversas e plurais. A Chuva Acalanta a Dor (2021) dialoga mais que o imaginado inicialmente com Para Colorir (2021), ainda que eles sejam objetos cinematográficos vindos de constelações aparentemente antagônicas.

O Cine Esquema Novo aconteceu de 08 a 15 de abril e já anunciou seus vencedores (que confere numa das notícias relacionadas acima). Entretanto, o sucesso foi tamanho que os organizadores resolveram promover um “chorinho”, esticando a disponibilidade das sessões até domingo, 18. Então, não perca a oportunidade de assistir a algumas dessas obras instigantes, umas calcadas em processos referenciais, outras discutindo o corpo e a ancestralidade, além das demais propostas contempladas na edição do CEN em tempos de pandemia. Porém, o maior mérito dos organizadores em 2021 foi ter feito do limão uma limonada, ou seja, encarar a necessidade de isolamento por conta da situação atípica da pandemia e não medir esforços para oferecer ao público uma possibilidade de ser instigado.

As duas abas seguintes alteram o conteúdo abaixo.
Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.