Gilda Nomacce :: “Mil e uma vidas” da atriz são tema de homenagem na cidade natal de Ituverava

Publicado por
Bruno Carmelo

Para os entusiastas do cinema brasileiro, Gilda Nomacce se tornou um nome fundamental em produções ousadas, tanto de gênero quanto dramáticas. Originária de Ituverava, no interior de São Paulo, ela começou a atuar desde cedo, formando-se em artes dramáticas em Londres, antes de se especializar nos Estados Unidos, na Rússia e então no prestigioso Centro de Pesquisa Teatral, de Antunes Filho.

Nomacce nunca parou de atuar tanto no teatro (O que Você Foi Quando Era Criança?, 2005, Soslaio, 2007, Music-Hall, 2009) quanto na televisão (vide as séries A Garota da Moto, 2016, Assédio e Samantha!, 2018). No cinema, divide-se entre os longas-metragens (Quando Eu Era Vivo, 2014, Califórnia, 2015, Como Nossos Pais, 2017, Onde Quer que Você Esteja, 2019) e os curtas-metragens (Um Ramo, 2007, O Segredo da Família Urso, 2014, Lilith, 2018, entre outros).

A atriz ficou conhecida por abraçar os gêneros mais distintos, do terror sangrento às comédias e dramas queer, apostando com generosidade no trabalho de jovens cineastas. Ela já foi indicada duas vezes ao Prêmio Guarani de Cinema, como atriz coadjuvante em Quando Eu Era Vivo e Ausência (2015), e recebeu uma indicação ao Grande Prêmio do Cinema Brasileiro pela atuação em As Boas Maneiras (2018).

 

Gilda Nomacce em A Passagem do Cometa (2017)

 

O cinema de volta

Agora, a contribuição artística de Gilda Nomacce será tema da Mostra “As Mil e uma Vidas de Gilda Nomacce”, no Centro Cultural Cícero Barbosa Lima Jr. em Ituverava, dia 21/12. O curador Lúcio Lima Jr. explica o recorte desta homenagem: “Penso que assisti a uma boa parcela dos filmes de Nomacce para a mostra. Selecionamos os curtas em vertentes temáticas: drama, LGBT, comédia e terror. Privilegiamos o filme Onde Quer que Você Esteja, dos mineiros Bel Bechara e Sandro Serpa, por ainda estar em cartaz nas salas de cinemas do Brasil e por ser um filme sensível e comovente. Passaremos cenas de Gilda em A Garota da Moto, para o público poder gargalhar e se identificar com o trabalho já conhecido da atriz na televisão. Também haverá cenas de Gilda com atores renomados para despertar tal identificação”.

“Poder trazer a arte do cinema, que é uma arte de luta e resistência, para a minha cidade Ituverava me traz grande alegria, já que pouco a pouco as salas de cinemas por lá e por todo Brasil foram se extinguindo”, explica a atriz ao Papo de Cinema. “Levar o cinema para o lugar da minha infância e adolescência é também um ato político e não cabe em palavras o que sinto ao contribuir com essa história”.

“Foi na minha infância em Ituverava que eu fui fisgada pelo cinema. Nas salas de cinema que havia lá, eu sonhava acordada que um dia eu estaria ali na tela. Minha paixão e persistência pelo ofício de ser atriz me deu essa homenagem linda, a oportunidade de ver na tela na minha cidade, que eu amo tanto e da qual tenho muito orgulho”, completa.

 

 

Sem censura

Lima Jr. garante que mesmo os trabalhos mais radicais da atriz serão exibidos: Gilda transpira revolução, então conservadorismo é uma palavra que não existe no nosso dicionário. Ter Gilda aqui conosco é uma grande honra. Além de contar com sua energia, aura, luz e talento, ela nos cederá uma oficina gratuita, a todos interessados na arte de interpretar, atores e amadores. Leide Jaob e eu faremos um curta-metragem documentário do workshop”.

De fato, a cineasta Leide Jacob é conterrânea e amiga próxima de Gilda Nomacce. Juntas, trabalharam no curta-metragem Pagar 4 Nunca Mais (2018), sobre a luta da mãe da cineasta, Leide Moreira, contra as consequências da esclerose lateral amiotrófica (ELA). Jacob explica: “A ideia de documentar a homenagem e oficina é mostrar a potência da Gildinha, de seu trabalho, suas conquistas e principalmente o quão o cinema resiste. Enquanto em Ituverava não há mais cinema, a cidade vai a Berlim através da Ituveravense Gilda Nomacce.

 

Ituverava – Berlim

Jacob faz referência ao longa-metragem Meu Nome É Bagdá (2020), dirigido por Caru Alves de Souza, selecionado para o Festival de Berlim 2020. No filme, centrado na vida de garotas skatistas, Gilda interpreta uma mulher de Ituverava, dona de um bar onde ocorrem as manifestações de operárias de uma fábrica. O bar, cenário importante da trama, ostenta uma bandeira ituveravense.

Nomacce tem presença confirmada na 70ª Berlinale para apresentar o filme ao público local e à imprensa estrangeira. Vale lembrar que, na primeira leva de filmes anunciados, o cinema nacional já conta com três títulos escolhidos: além de Meu Nome É Bagdá, serão exibidos Cidade Pássaro e APIYEMIYEKÎ. Como afirma a atriz, defender o cinema nacional, especialmente em seu formato mais livre e inventivo, dentro das salas de cinema, constitui um ato de resistência, seja ele em Ituverava ou em um dos maiores festivais de cinema do mundo.

 

As atrizes Gilda Nomacce e Julia Katharine em Filme-Catástrofe (2017)

 

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Crítico de cinema desde 2004, membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema). Mestre em teoria de cinema pela Universidade Sorbonne Nouvelle - Paris III. Passagem por veículos como AdoroCinema, Le Monde Diplomatique Brasil e Rua - Revista Universitária do Audiovisual. Professor de cursos sobre o audiovisual e autor de artigos sobre o cinema. Editor do Papo de Cinema.

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