Uma das características mais interessantes do Olhar de Cinema de Curitiba é a atenção dada aos clássicos. O evento paranaense anualmente exibe filmes essenciais em cópias recentemente restauradas, ou seja, em condições que fazem jus às suas relevâncias para a história do cinema. Nesta sexta-feira, 03, uma sessão muito especial conjugou duas obras seminais de cineastas brasileiros que morreram recentemente. Viramundo (1965), de Geraldo Sarno, e A Opinião Pública (1967), de Arnaldo Jabor, foram projetados em sequência, o que evidenciou uma comunicação e, mais do que isso, uma preocupação comum com aspectos e agentes diferentes do tecido social brasileiro nos anos 1960 – década marcada pelo golpe que iniciou a ditadura civil-militar que desgovernou o Brasil por mais de 20 anos. O filme de Sarno observa o movimento de migração de nordestinos para a cidade de São Paulo, sublinhando a falta de oportunidades e um ciclo de miserabilidade praticamente perpétuo. Já o longa de Jabor investiga uma parcela da classe média da cidade do Rio de Janeiro, ressaltando coisas como a alienação política e certo grau de reacionarismo. Assistir a essas duas obras essenciais do cinema brasileiro em conjunto foi uma experiência excepcional.
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Outro momento de destaque entre as exibições de clássicos no 11º Olhar de Cinema de Curitiba foi a projeção neste sábado, 04, de Mandabi (1968), obra fundamental do cinema africano, dirigida por Ousmane Sembène. A história gira em torno de um homem religioso que tenta manter as aparências de tranquilidade financeira, mesmo devendo na praça e tendo dificuldades para honrar as dívidas contraídas. Ele recebe uma ordem de pagamento do sobrinho que migrou à França e entra numa jornada inglória pela burocracia senegalesa que, entre outras coisas, desnuda as precariedades de um país lutando contra o subdesenvolvimento decorrente dos anos de colonização francesa. A sessão aconteceu numa rede que não tem por hábito programar filmes alternativos aos arrasa-quarteirões. Então, enquanto boa parte dos espectadores apinhavam as salas para assistir a dinossauros descontrolados, aviadores destemidos, doutores estranhos ou ouriços azuis mega velozes, um grupo bem menor se maravilhava com um dos grandes filmes da história do cinema. Contradições e experiências que apenas o Olhar de Cinema proporciona.
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