Para cada ação, uma reação. Se num ano a Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood ousou ao apontar como o melhor do ano o sul-coreano Parasita (em 2020), isso só foi possível pois no ano anterior apostaram em algo seguro e pouco comprometedor (Green Book: O Guia, em 2019). O mesmo aconteceu quando escolheram Moonlight: Sob a Luz do Luar (em 2017) logo após Spotlight: Segredos Revelados (em 2016), ou Birdman ou (A Inesperada Virtude da Ignorância) (em 2015) no seguinte ao premiarem 12 Anos de Escravidão (em 2014) – apenas para ficarmos na última década, mostrando o quão regular pode ser esse ciclo. É como se, para cada passo em busca de inovação, ousadia e criatividade, antes fosse necessário reafirmar velhos conceitos, estruturas previamente conhecidas e um formato (e temas) cômodos à maioria. Como no ano passado o vencedor foi o familiar No Ritmo do Coração, certamente a opção mais convencional dentre os dez indicados, não será surpresa se dessa vez os mesmos votantes se permitirem assumir um risco diferenciado. E qual dos indicados dessa seleção abaixo melhor representa essa possibilidade do que aquele que já carrega consigo o mérito de ter sido o campeão de indicações dessa temporada? Com isso em mente, confira as nossas apostas para o Oscar de Melhor Filme:
INDICADOS
Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo
Dono de nada menos do que 11 indicações, Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo é o longa a ser superado nessa corrida. E olha que, se quando lançado, na metade de 2022, o sonho de figurar entre os finalistas do Oscar parecia por demais distante, quando as coisas para o seu lado começaram a esquentar, ainda no início dessa temporada, sua posição parecia mais como o “azarão” da vez, aquele com chances, mas que ainda assim era visto pela maioria mais como uma anomalia do que um candidato sério. Porém, assim que a consagração veio na festa do Critics Choice (Melhor Filme, Direção e Roteiro Original, entre os cinco troféus conquistados), todos começaram a observá-lo com outros olhos. Favorito em categorias disputadas (Atriz e Ator Coadjuvante, por exemplo) e também em diversas técnicas, esse sucesso de bilheteria – faturou nos cinemas mais de quatro vezes o valor do seu orçamento, o que, nesse cenário pós-pandemia, não é pouca coisa – tem tudo para fazer bonito também na noite do dia 12 de março. E, assim, deixar mais uma vez a impressão de que a Academia está, sim, preocupada com o futuro do cinema. Isso, é claro, apenas até o ano que vem, quando outro título bem mais comportado for, novamente, a estrela da vez.
Indicações: Filme, Direção, Atriz, Ator Coadjuvante, Atriz Coadjuvante, Atriz Coadjuvante, Roteiro Original, Trilha Sonora, Canção Original, Montagem, Figurino
Onde assistir? Plataformas de VoD
Os Fabelmans
Steven Spielberg já ganhou o Oscar de Melhor Filme (A Lista de Schindler, em 1994). Porém, Os Fabelmans é nada menos do que décimo terceiro longa dirigido por ele a marcar presença nessa categoria. Isto quer dizer que onze já perderam, e este pode ser o décimo segundo – ou o segundo a alcançar tamanha glória! Qual será o seu destino, portanto? Dos dez finalistas, é tranquilamente aquele com o viés mais cômodo aos votantes – assinado por um diretor reconhecido, além de falar sobre um tema bastante caro a todos os votantes (a paixão pelo cinema, ora). Mas não só por isso: é, também, um dos trabalhos mais pessoais daquele que pode, tranquilamente, ser apontado como um dos mais bem-sucedidos cineastas de todos os tempos. Apostar na sua vitória não seria nenhuma loucura: talvez seja mesmo a junção do merecimento com um histórico invejável. Resta esperar para descobrir a quantos essa narrativa conseguirá convencer.
Indicações: Filme, Direção, Atriz, Ator Coadjuvante, Trilha Sonora, Roteiro Original, Direção de Arte
Onde assistir? Cinemas
Top Gun: Maverick
Grande sucesso de bilheteria do verão norte-americano, essa sequência calcada na nostalgia do original, vinda direto dos anos 1980, faturou mais de US$ 1 bilhão ao redor do mundo num momento em que poucos apostavam no poder de comoção do público do seu protagonista, o astro Tom Cruise. Mas ousaria dizer que, além de um agrado às audiências, esse também seria um filme a entrar para a história como um dos melhores do ano? O primeiro a apostar nessa linha foi o National Board of Review (agremiação de críticos, pesquisadores e estudiosos, uma das mais antigas do gênero, com quase um século de existência), que o elegeu como o seu favorito da temporada. Depois vieram indicações ao Globo de Ouro, ao Critics Choice, ao prêmio do Sindicato dos Diretores e, principalmente, ao Producers Guild of America Awards (PGA), a premiação do Sindicato dos Produtores, aquele que costuma ser o mais forte precursor desta categoria no Oscar. Aprovado pelo público e endossado tanto pela crítica quanto pela indústria? O que mais se pode pedir? Talvez, uma cobiçada estatueta dourada? Quem viver, verá.
Indicações: Filme, Roteiro Adaptado, Som, Efeitos Visuais, Montagem, Canção Original
Onde assistir? Telecine/Globoplay, Paramount+ e plataformas de VoD
Os Banshees de Inisherin
Um dos campeão de indicações deste ano, com 9 citações ao todo, Os Banshees de Inisherin é o segundo filme do diretor Martin McDonagh a fazer bonito com os membros da Academia – seu longa anterior, Três Anúncios para um Crime, recebeu sete indicações (inclusive Melhor Filme) e ganhou em duas. E como o mesmo raio não cai duas vezes no mesmo lugar, pode-se depreender que o cineasta é bastante prestigiado pelos seus colegas. Mas será suficiente para garantir essa vitória? Vencedor do Globo de Ouro (como Melhor Filme em Comédia ou Musical) e presente em praticamente todas as listas de associações de críticos ou das grandes premiações da indústria, esta produção irlandesa tem, por outro lado, sido visto por muitos mais como uma história curiosa, certamente dona de muitos méritos, e menos como um conto apaixonante e motivador de torcidas calorosas. Enfim, é aquele a que todos aplaudem, mas que será responsável por poucas lágrimas do caso de uma eventual derrota.
Indicações: Filme, Direção, Ator, Ator Coadjuvante, Ator Coadjuvante, Atriz Coadjuvante, Roteiro Original, Trilha Sonora, Montagem
Onde assistir? Cinemas
Elvis
O mais curioso desse filme é perceber sua presença nas exatamente mesmas indicações que outro longa dirigido por Baz Luhrmann conquistou duas décadas atrás, Moulin Rouge: Amor em Vermelho (2001) – com a diferença que aquele disputou em Melhor Atriz e, esse mais recente, em Melhor Ator (ou seja, ambos tiveram seus protagonistas indicados). Se o conto de amor e perda estrelado por Nicole Kidman foi premiado apenas pelo seu visual (Direção de Arte e Figurino), é mais do que provável que o mesmo se repita com Elvis. Afinal, se antes Luhrmann era acusado de estar “à frente de sua época”, a impressão dessa vez é que ele teria ficado “parado no tempo”, apenas reproduzindo os mesmos cacoetes narrativos e de estilo que marcaram quase todos os longas de sua filmografia. Presente por aqui mais pela força do personagem homenageado, é um título dono de tantos excessos que, mesmo quando acerta, tais conquistas são logo eclipsadas pela derrapada seguinte. Pode ter chegado longe, mas não mais do que isso.
Indicações: Filme, Ator, Maquiagem & Cabelos, Som, Fotografia, Direção de Arte, Figurino, Montagem
Onde assistir? HBO Max e plataformas de VoD
Entre Mulheres
Num ano em que nenhuma mulher foi indicada à categoria de Melhor Direção (ainda mais após duas vitórias femininas, em 2022 e em 2021), Entre Mulheres cumpre o papel de representar o cinema feito por elas em uma seleção na qual acomodá-lo é mais fácil (afinal, aqui são 10 finalistas, ao contrário dos cinco das demais). O filme dirigido por Sarah Polley tem elenco majoritariamente feminino – Frances McDormand (também produtora), Claire Foy, Rooney Mara e Jessie Buckley são algumas delas – e trata de um tema de urgente debate (a opressão religiosa e o assédio sexual). Indicado ao Critics Choice e ao Film Independent Spirit, foi ignorado pelo Globo de Ouro, pelo Bafta e – mais grave! – pelo PGA. Se chegou ao Oscar – e com apenas duas indicações, aqui e em Roteiro Adaptado – é por trazer à tona uma discussão que não pode ser ignorada. Mas que não se imagine ser dono de alguma chance de vitória.
Indicações: Filme, Roteiro Adaptado
Onde assistir? Inédito nos cinemas
Nada de Novo no Front
Refilmagem de um longa vencedor do Oscar de Melhor Filme (Sem Novidade no Front, 1930), esse longa alemão é o estrangeiro da vez (assim como foram o japonês Drive My Car, em 2022, o sul-coreano Parasita, em 2020, ou o mexicano Roma, em 2019), e por estar disputando também a categoria de Melhor Filme Internacional – na qual figura como favorito – muito podem considerar essa prêmio de consolação mais do que suficiente (a exceção foi justamente Parasita, o único a ganhar em ambas as disputas em 94 anos de premiação). É pouco provável que essa mesma sorte se repita dessa vez. Mas, pelo forte impacto que teve também nas categorias técnicas – recebeu impressionantes 9 indicações ao todo – é bem pouco provável que saia da festa de mãos abanando. Mas não com o troféu principal.
Indicações: Filme, Filme Internacional, Maquiagem & Cabelos, Trilha Sonora, Som, Efeitos Visuais, Roteiro Adaptado, Fotografia, Direção de Arte
Onde assistir? Netflix
Triângulo da Tristeza
Vencedor da Palma de Ouro no Festival de Cannes (o mesmo prêmio conquistado por Parasita e que deu início à sua jornada rumo à consagração no Oscar), poucos apostariam que acontecerá com essa produção sueca o mesmo ocorrido com seu colega sul-coreano três anos atrás. Aplaudido por muitos na mesma proporção em que é atacado por outros tantos, esse misto de escatologia e crítica social, de deboche e sátira, de reflexão e piadas baratas deixou muita gente incomodada com cenas que investem no grotesco e na provocação, obrigando esse tipo de espectador a se arriscar em reflexões que na grande maioria das vezes, por mais óbvias que possam ser consideradas, acabam por ser desconsideradas. Tanto é que no Critics Choice e no Globo de Ouro foi indicado como Melhor Filme de Comédia, ao mesmo tempo em que ficou de fora das listas de melhores do ano do National Board of Review, Sociedade Nacional dos Críticos de Cinema dos EUA ou do PGA. Por outro lado, no outro lado do Atlântico se consagrou no European Film Awards. Uns amam, outros odeiam. O que ninguém fica, certamente, é indiferente.
Indicações: Filme, Direção, Roteiro Original
Onde assistir? Cinemas
Tár
Todd Field dirigiu apenas três longas: e todas as suas investidas por detrás das câmeras lhes renderam indicações ao Oscar. Por Tár ele recebeu mais três (Filme, Direção e Roteiro Original). Mas se nenhuma das anteriores foram convertidas em vitória, é pouco provável que alguma dessas novas tenha destino diferente. Escolhido como o Melhor Filme do ano pela Sociedade Nacional dos Críticos de Cinema dos EUA, foi indicado ao Critics Choice, ao Globo de Ouro e ao Gotham, além de outras tantas premiações, sem, no entanto, ser bem-sucedido em nenhuma delas. Resta ver o que pode acontecer no Bafta, no PGA ou no Film Independent Spirit, onde também concorre, mas sem muito protagonismo. Eis aqui o tipo de filme que a maioria respeita, mas poucos amam (ou mesmo entendem). Sem esquecer outros tantos que nem sequer o viram, justamente por se tratar de uma produção pequena, de lançamento limitado (arrecadou pouco mais de US$ 6 milhões nas bilheterias norte-americanas) e dona de apostas arriscadas. É, portanto, a indicação de prestígio. E não mais do que isso.
Indicações: Filme, Direção, Atriz, Roteiro Original, Fotografia, Montagem
Onde assistir? Cinemas
Avatar: O Caminho da Água
Alguém ainda duvida do poder de James Cameron? O fato de Avatar (2009) ter se tornado a maior bilheteria de todos os tempos foi contra todas as previsões. Mas o que dizer de O Caminho da Água, que até o momento já ultrapassou os US$ 2 bilhões ao redor do mundo e ocupa agora a terceira colocação entre os maiores sucessos de público da história? No entanto, mesmo com todo esse sucesso, o anterior, das nove indicações ao Oscar recebidas, ganhou em apenas três técnicas, falhando nas principais. E não há motivo algum para pensar que nesse sua segunda investida pelo mundo de Pandora a situação será diferente. Sua inclusão por aqui é quase uma declaração, uma tentativa de reafirmar que o cinema está vivo, e bem. Mas será mesmo?
Indicações: Filme, Efeitos Visuais, Direção de Arte, Som
Onde assistir? Cinemas
Aftersun
Indicado ao Bafta e premiado no British Independent Film Awards (em ambos como “Melhor Filme Britânico”), o longa de estreia da diretora Charlotte Wells aqueceu o coração de muitos por onde passou durante o ano de 2022. Desde sua estreia no Festival de Cannes (de onde saiu com o prêmio da crítica) até a indicação solitária ao Oscar na categoria de Melhor Ator (para um hipnotizante Paul Mescal), este é um trabalho que merecia ter sido recebido de forma mais efusiva na maior festa do cinema mundial. Indicado ainda ao Film Independent Spirit Awards e na premiação da Sociedade Nacional dos Críticos de Cinema dos EUA, foi presença constante nas listas de melhores do ano em diversas agremiações regionais de críticos por todos os EUA. Falhou, no entanto, em figurar entre os dez indicados ao PGA – A Baleia, Pantera Negra: Wakanda para Sempre e Glass Onion: Um Mistério Knives Out, ocuparam esse espaço, mas sem maiores repercussões – e essa ausência foi decisiva para ficar de fora também por aqui. O que não deixa de ser uma imensa lástima.
Indicações: Ator
Onde assistir? MUBI
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