Crítica


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Sinopse

Dois amigos da adolescência se reencontram após anos afastados. Quando decidem jogar uma partida de um videogame que promete total imersão no mundo virtual, os sentimentos que irão explorar poderão mudar as vidas de cada um deles para sempre.

Black Mirror


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Crítica

Danny chega na boate de mansinho. Dá uma olhada no ambiente, como se procurasse por alguém – ou pelo que fazer. Mas não leva muito tempo nesse esforço de ‘reconhecimento’, por assim dizer. Logo identifica sua ‘presa’. Afinal, ele é o homem, o caçador. E ela está aparentemente sozinha, no bar, ocupada apenas com sua bebida. É para o lado dela que se dirige, e a conversa deixa rapidamente claras as suas intenções. Enquanto o flerte entre os dois se desenvolve, Karl se aproxima e os abraça: “como é bom vê-los”. Rapaz e moça, até um segundo atrás meros desconhecidos, agora se abraçam e caminham juntos até a pista de dança. “Esse faz-de-conta que você fez me deixou excitada”, murmura ela no ouvido dele. Pois é sobre essa vontade de ser quem você não é que se debruça Striking Vipers, primeiro episódio da quinta temporada de Black Mirror, série que recomeça com fôlego após o tropeço que foi o longa interativo Bandersnatch (2018).

Eles são jovens, e enquanto Danny e a namorada, Theo, se divertem na cama, Karl é mais rápido em dispensar a garota daquela noite. É no sofá do apartamento que os três dividem que parece ficar mais confortável. Talvez fosse passar a noite sozinho jogando videogame, mas assim que o casal chega ao gozo, ela cai no sono, ao mesmo tempo em que ele se levanta para fazer companhia ao amigo. A empolgação dos dois é tamanha que a garota acorda, o suficiente apenas para reclamar com eles. “Façam menos barulho”, é o que diz. Não há ciúmes ou inveja no seu protesto. Ela não se mostra contrariada pelo namorado não ter permanecido na cama com ela. Entende bem como as coisas funcionam. Ela teve sua vez, agora é o momento do outro.

Se essas linhas parecem bem delimitadas, quando muitos anos se passam e todos se tornaram adultos, os limites parecem mais confusos. Isso porque Danny e Theo se mudaram, possuem casa própria e filhos, são responsáveis e maduros. Karl é quem segue pulando do quarto para a sala, sempre com uma nova conquista, tendo como constante apenas o videogame para finalizar cada noite. Quando um novo modelo do jogo é lançado, garantindo total imersão no mundo virtual, decide que é hora de reencontrar o velho amigo. Afinal, é o aniversário dele. E melhor presente não há. Ainda mais se usarem seus antigos avatares: Danny é Lance, guerreiro e atlético, enquanto que Karl prefere Roxette, destemida e impiedosa.

Se Black Mirror ficou conhecida por combinar inovações tecnológicas com grandes medos da humanidade, o diretor Owen Harris se tornou referência no programa por inserir nessa mistura muito sentimentalismo. Foi assim em Be Right Back T02 E01 (2013), quando uma viúva se via diante de um boneco do marido já falecido, e também em San Junipero T03 E04 (2016), com duas garotas vivendo uma paixão que talvez não tivesse espaço na vida real. Em sua terceira incursão pelo programa criado por Charlie Brooker, a pergunta que faz é: o que importa mais, quem somos à luz do dia e em frente a todos os outros, ou o que sentimos quando a noite cai e ninguém mais está por perto?

Anthony Mackie, como o protagonista, tem uma das performances mais dramáticas de toda a sua carreira, mas a revelação aqui é Yahya Abdul-Mateen II, que deixa de lado a ferocidade do vilão Manta, de Aquaman (2018), para revelar um viés mais sensível da sua personalidade. Nicole Beharie (Shame, 2011) se desloca com tranquilidade entre esses dois homens que podem, ou não, estarem lhe traindo, enquanto que Pom Klementieff (a Mantis de Guardiões da Galáxia Vol. 2, 2017) e Ludi Lin (o Black Ranger de Power Rangers, 2017) oscilam com cuidado entre a leveza e o arrependimento como as figuras imaginadas que transformam um contexto de luta em desejo e atração. Defendidos com segurança por um elenco coeso e sob uma direção que não tem pressa em transmitir suas intenções, Striking Vipers pode não ser um dos momentos mais revolucionários de Black Mirror, mas certamente cumprirá sua função de deixar muita gente refletindo sobre as ações e sentimentos aqui explorados.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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