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Sinopse

Num encontro às cegas, Cecília e Marcos desenvolvem uma química instantânea. Mas a pandemia logo aparece, os obrigando a ficar confinados à distância. Ela está na casa da mãe controladora; ele, obrigado a fechar um recém-inaugurado negócio, está cheio de boletos para pagar. Será que eles conseguirão manter a chama acesa?

Carenteners


Carenteners :: T01

Episódio Data de exibição
Carenteners :: T01 :: E01 30/06/2020

Crítica

Apesar de ter pouco mais de cinco minutos, o episódio inicial de Carenteners revela muito sobre a série que está por vir. A começar pelo fato de ser esta uma produção sui generis, filha de seu tempo, no sentido de assumir os signos de uma vida em quarentena como narrativa. Para tanto, a série mergulha fundo na proposta do screenlife, popularizada pelo suspense Buscando... (2018), no sentido de mostrar tudo o que acontece através de alguma tela, seja ela de celular ou mesmo de computador. Dentro desta realidade, faz bastante sentido.

Isto porque, como todos que estão ou passaram pela quarentena bem sabem, a vida em pandemia exige distanciamento social e, como tal, a comunicação à distância explodiu como nunca. Dos onipresentes WhatsApp e Facebook à descoberta das conferências via Zoom e semelhantes, tornou-se corriqueiro ver o outro apenas através de alguma telinha, o que dá ao screenlife um contexto essencial para que tal história seja contada, pelo fato de que os dois protagonistas não estão no mesmo ambiente. Desta forma, seu uso não se trata propriamente de uma opção narrativa, como aconteceu em Buscando..., mas sim da falta de outras opções. Bem-vindo ao novo normal, também no audiovisual.

Entretanto, limitar Carenteners a esta peculiaridade seria simplório e até injusto. Há na série toda uma contextualização de forma a trazer leveza a um tema naturalmente pesado, seja buscando um linguajar antenado com os jovens que valorize piadas e situações típicas da pandemia ou mesmo citações à internet e à cultura pop facilmente reconhecíveis, como o "lookinho apocalíptico" que de imediato remete a Breaking Bad (2008 - 2013) ou mesmo a brincadeira da mensagem via aplicativo para e.borgo, referência escancarada a um dos produtores da série, Erico Borgo, ex-Omelete e um dos criadores da CCXP. São pequenos easter eggs que, se não são essenciais à narrativa, trazem um toque de diversão ao exibido.

Também através do linguajar adotado pode-se já ter uma ideia sobre o perfil dos personagens principais, Cecília e Marcos, interpretados por Ana Tardivo e Mateus Sousa. Se ela por um lado é mais expressiva e até histriônica, é também capaz de soltar comentários mordazes sobre o mundo em pandemia, como as citações à precariedade do trabalho e mesmo ao fato de ser jornalista formada. Cecília aparenta ser do perfil engajado, antenada com o mundo à sua volta, enquanto Marcos adota um estilo mais low profile, empreendedor e conformado com o súbito fechamento de seu negócio - ao menos por enquanto, preocupações financeiras não surgiram, de lado a lado. A opção por um casal interracial, sem apontar o dedo a tal questão, é também uma boa sacada, não apenas pelo que representa como sociedade mas, também, pelo diálogo buscado com uma geração que, ao menos nas redes sociais, é bastante politizada. Não por acaso, este primeiro episódio também (já) levanta a questão do cancelamento de ídolos, de forma bem humorada.

Em meio a tantos elementos promissores, Carenteners apresenta também um revés incômodo em relação ao modo invasivo com o qual é inserido o merchandising, direcionando a história de forma que a empresa patrocinadora apareça em destaque. Não precisava, ou ao menos poderia ser bem mais sutil - o audiovisual brasileiro ainda tem muito a aprender neste sentido, com seu conterrâneo dos Estados Unidos.

Divertido e bem realizado, Carenteners começa com o pé direito. A curta duração faz com que muito do visto se resuma a breves esquetes sobre este novo mundo à nossa volta, sendo um desafio trazer profundidade a tais personagens no decorrer da temporada. Vale ainda ficar atento às inserções visuais nos painéis que anunciam o dia exato da quarentena, sempre com animações pontuais sobre aquele momento da vida em confinamento. São pequenos detalhes que demonstram o cuidado com o qual a série foi produzida, ao menos em seu início.

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Jornalista e crítico de cinema. Fundador e editor-chefe do AdoroCinema por 19 anos, integrante da Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema) e ACCRJ (Associação de Críticos de Cinema do Rio de Janeiro), autor de textos nos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros", "Documentário Brasileiro - 100 Filmes Essenciais", "Animação Brasileira - 100 Filmes Essenciais" e "Curta Brasileiro - 100 Filmes Essenciais". Situado em Lisboa, é editor em Portugal do Papo de Cinema.
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