Crítica


8

Leitores


4 votos 8.6

Sinopse

Castle Rock é uma cidade fictícia localizada no Maine, nos Estados Unidos. Lá, passado e presente se cruzam através das histórias de terror das quais não apenas se ouve falar, pois elas são vividas e sentidas por seus moradores. Nesta estranha cidade, todo o universo de Stephen King se encontra.

Crítica

No segundo episódio de Castle Rock há uma abertura significativa, proporcionada pela narração de Dale (Terry O'Quinn), o diretor de Shawshank que cometeu suicídio bem no dia em que se aposentava da penitenciária. A função desse dispositivo é, com o devido peso póstumo, mostrar o que acontece na cidade, criando uma espécie de mitologia maligna. Vários episódios de brutalidade são alinhavados pela voz desse homem que se expressa como alguém que encarou a face do diabo e teve conversas esclarecedoras com Deus. Aliás, segundo ele, o Todo Poderoso mostrou que, para além do metafórico, o mal está encarnado em Castle Rock, fazendo da localidade amaldiçoada, sobretudo em virtude da presença de um menino que nunca mais deveria vez a luz do sol. A esfera religiosa é, também, percorrida por Henry (André Holland), filho do pastor assassinado, incriminado por todos como culpado do ocorrido. Ele retorna à congregação local, sendo considerado redimido, ou seja, uma figurinha carimbada do cristianismo.

Lá, inclusive, nos bancos da igreja, ele conhece a curiosa Jackie Torrance (Jane Levy), que quebra o silêncio velado e diz exatamente como Castle Rock entende o que fatidicamente lhe aconteceu no passado. Uma curiosidade: Torrance é o sobrenome do protagonista de O Iluminado, obra de Stephen King que ficou amplamente conhecida pela adaptação cinematográfica dirigida por Stanley Kubrick. Há relação, já confirmaram os criadores da série. Nesse segundo momento, percebe-se a exploração de elementos e personagens periféricos, o que amplia a abordagem, tornando-a ainda mais próxima ao terror, seja ele o associado à possível existência de uma criatura maligna que amaldiçoa os locais, ou o que diz respeito aos danos psicológicos ocasionados exatamente por essa aura opressora que paira sobre o condado excluído do mapa. Neste sentido, Molly (Melanie Lynskey), que havia aparecido de relance anteriormente, aqui ganha espaço considerável para deixar uma pista quanto à sua importância ao desenrolar da trama.

Menina que mantinha contato com Henry na infância, trocando mensagens à distância, ela virou uma adulta com distúrbios que a fazem refém de medicamentos/drogas. Sua conduta torta com a irmã que demonstra preocupação chama atenção suficiente, mantendo-a no radar, em meio a tantos personagens envolventes, donos de traços característicos que os tornam relevantes dentro do que se está construindo. O prisioneiro misterioso (Bill Skarsgård) ganha outro status a partir do momento em que sua presença, já atemorizante, é significada pela fala do narrador-defunto, de quem foi cativo durante bastante tempo. Dale imputa a esse jovem de olhos refratários a um escrutínio óbvio toda a carga de tragédias que se abateu sobre Castle Rock, pintando-o como um demônio, ou algo desse naipe, o que faz com que cada movimento seu gere uma expectativa no espectador. Não é difícil, em meio a esse processo, imaginar o destino do novo colega de cela, assim que, por conta de uma medida austera, ele é transferido.

O segundo episódio de Castle Rock, portanto, cumpre a função que dele se espera, expandindo as conjunturas apresentadas e propondo outras que substanciam as iniciais. O subtexto político continua presente, com menções a George Bush pai como “o Bush do bem”, além de alusões à falência do modelo prisional privado. Não à toa, uma morte decorre da necessidade de aglutinar encarcerados para diminuir custos. Um personagem chega a verbalizar que algo como uma cadeia não deveria permanecer nas mãos de quem a vê como um negócio. Alan (Scott Glenn), ex-policial que vive com a mãe de Henry, Ruth (Sissy Spacek), outrora notório por encontrar o garoto no lago congelado após dias de desaparecimento, também ganha espaço, ensaiando se tornar uma das principais figuras da série. Representante da velha guarda, não afeito a tecnologias digitais e afins, ele vira beneficiário de um testamento macabro, recebendo a missão de salvaguardar Castle Rock do mal prestes a ser reativado.

As duas abas seguintes alteram o conteúdo abaixo.
avatar
Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.