Crítica


5

Leitores


2 votos 9

Sinopse

Ainda no Egito para tentar impedir que Arthur ressuscite a deusa Ammit, Steven se envolve gradativamente com Layla, a ex-esposa de sua outra personalidade, Marc. E isso gera um conflito entre os dois homens que coexistem.

Crítica

O tema do quarto episódio de Cavaleiro da Lua é, além da continuidade da busca pela deusa Ammit, o possível envolvimento amoroso entre Steven (Oscar Isaac) e Layla (May Calamawy), a quase ex-esposa da outra personalidade do protagonista. Para simplificar, bastaria dizer: “falta química ao casal”. Mas, de que modo podemos ler objetivamente essa “falta de química”? Primeiro, atentando para o fato de que Layla não parece minimamente atraída por Steven, algo que torna a aproximação deles um tanto forçada. Segundo, percebendo que o flerte da parte dele é algo também pontual (até conveniente, por assim dizer). Além disso, a trama não fornece terreno suficiente para o interesse romântico ser algo desagregador entre Steven e Marc – quando muito há tentativas cômicas de desaprovação. Nada que passe além de uns olhares mais maliciosos. A incursão do casal pelas profundezas de um dos monumentos mais conhecidos do Egito traz à tona outra tentativa malfadada de fazer a personagem feminina ter alguma relevância: Marc deve alguma coisa a ela.

Os idealizadores de Cavaleiro da Lua usam e abusam dos lugares-comuns para tentar fazer dessa relação um aspecto importante da trama. Mas, para isso, não estão dispostos a dar tempo aos sentimentos de Layla por Marc e tampouco à compreensão do que é determinante para ela se interessar por Steve. No entanto, fica implícito que Layla vê no “desconhecido” a prudência e o carinho que sente falta no quase ex-marido. Simples demais para ganhar tanta atenção em meio a uma história que envolve deuses em disputa e outras figuras para lá de conhecidas. Dentro desses clichês utilizados superficialmente pela produção está o fato de Layla não saber exatamente quais foram as circunstâncias que levaram à morte de seu pai. A participação de Marc é um clássico empecilho para ela atingir a felicidade com qualquer uma das personalidades vividas bem por Oscar Isaac. Aliás, em um momento podemos ver o ator modificando repentinamente de semblante para sinalizar a troca entre bonzinho e destemido. Mas, o talento do ator guatemalteco-americano é sabotado pelo roteiro.

Continua prevalecendo o gosto de aventura burocrático-genérica. Já vimos essas dinâmicas em vários filmes e séries semelhantes em intenção e abordagem. Para se ter uma ideia, no divertido Tudo Por Uma Esmeralda (1984) há ainda um componente erótico entremeando as relações do explorador e da mulher que o acompanha. No entanto, como em boa parte das produções da Marvel, aqui a sexualidade parece sumariamente banida da equação amorosa, o que a torna desprovida de tensão. Assim sendo, a atração fica subordinada aos termos de um romantismo frouxo. Parece que ninguém sente desejo, paixão ou algo mais caloroso nesse universo que acaba se assemelhando a tantos outros. Então, seguimos na trilha da correria pontuada por várias explicações, circunstâncias importantíssimas sem tempo ou espaço para serem devidamente grandiosas, além de pouco super-herói em cena. Há um paradoxo na forma como o enredo se desenrola: é muita coisa para pouco tempo, mas, curiosamente, o andamento parece arrastado e moroso. Culpa dos caminhos traçados, mas também dos condutores que não conseguem imprimir intensidade à trama.

Porém, é bom sinalizar que, quando tudo parecia cozinhando beeeeeem lentamente em banho-maria, acontece algo nos últimos minutos que pode chacoalhar as estruturas da minissérie. Até esse momento, a saúde mental do protagonista tinha sido pouquíssimo investigada para além da constatação. Quando muito, algumas citações aqui, outras acolá, mas nada verdadeiramente relevante. Quando Marc acorda num sanatório depois de ser atacado, com internos e equipes tendo os mesmos rostos de quem preenche a sua aventura pessoal, podemos colocar em dúvida a “realidade”. Consciente ou inconscientemente, é um aceno ao clássico mor do Expressionismo Alemão, O Gabinete do Dr. Caligari (1920), no qual somos igualmente informados de que tudo antes de determinado ponto não passava de uma construção psíquica de uma mente delirante. Resta agora esperar o quinto (e penúltimo) episódio para saber se os criadores mergulharão profundamente nessa confusão ou se isso tudo se trata somente de uma tola cortina de fumaça que antecede o mais do mesmo.

As duas abas seguintes alteram o conteúdo abaixo.
avatar
Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *