Crítica


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Sinopse

A batalha derradeira entre Daenerys e Cersei pode acabar com Porto Real. Duas líderes implacáveis, dispostas a ultrapassar limites para decidir quem deve ocupar o trono de ferro.

Crítica

Confirmando o desenhado desde praticamente o começo – a despeito do entendimento de alguns como simplesmente uma jornada de ascensão obstinada, de atos espúrios justificáveis, rumo ao topo –, Daenerys (Emilia Clarke) foi ao encontro da sina que corre em suas veias, sendo a protagonista de The Bells (ou Os Sinos, em tradução direta), o penúltimo e violento episódio de Game of Thrones. Sim, pois, apesar de seu carisma, das dificuldades que teve que ultrapassar para minimamente sobreviver às adversidades, a mãe dos dragões havia dado vários sinais claros do que a aguardava quando próxima ao trono de ferro. Aliás, talvez essa seja sua grande tragédia, o fato de não ter alternativas diante do destino dos Targaryen, linhagem capaz de feitos extraordinários, tais como montar dragões e a imunidade impressionante ao fogo, mas cuja fragilidade emerge na iminência da soberania, os fazendo entrar numa espécie de combustão simbólica. Não houve qualquer mudança drástica, portanto, pois a propensão à vilania da Quebradora de Correntes foi sinalizada ao longo de todas as temporadas anteriores.

Apenas para exemplificar, quando Daenerys tomou a Baía dos Escravos, promovendo um bem social, cedeu à brutalidade e espalhou a cabeça dos antigos senhores, como mensagem, ao longo da estrada que dava acesso ao local, mesmo que estes não tivessem poder para combatê-la. Então, a personagem de Clarke sempre foi ambígua, oscilando entre a vontade genuína de encabeçar mudanças, claro, desde que isso não ficasse no caminho de sua coroação, objetivo máximo. E, prestes a chegar ao fim, Game of Thrones apresentou um amontoado de corpos incinerados, resultado do pendor dos Targaryen por um desses lados. Após a execução de uma figura presente na série desde o começo, a rainha que reclama seu tão sonhado trono parece a heroína ideal, uma vez que em poucos minutos consegue aniquilar a frota marítima inimiga, neutralizar as defesas da cidade e ainda abrir caminho para os seus muitos aliados em terra. Todavia, entendendo que rendição não lhe parecia o bastante, começa a carbonizar mulheres, crianças, em suma, o povo que desejara antes liderar.

Neste penúltimo episódio de Game of Thones, assim como nos imediatamente pregressos, desdobramentos que poderiam ser emblemáticos se deram apressadamente, com pouca perspicácia diretiva para gerar, a partir deles, um impacto condizente com as expectativas fomentadas. O embate entre Sandor (Rory McCann) e seu irmão finalmente acontece, mas de maneira burocrática, emoldurado por efeitos de computação gráfica que mal delineiam as limitações espaciais, uma vez que os dois batalham num caótico cenário literalmente desmoronando. Arya (Maisie Williams), outrora a grande heroína, serve de testemunha das atrocidades de Daenerys, fazendo o possível para salvaguardar a vida de inocentes que, ao largo das maquinações palacianas e militares, obra dos nobres disputando poder, acabam sendo as maiores vítimas do destempero de alguém que chega a exprimir pesar por não ser amada em Westeros. Nessa terra onde amor e ódio se avizinham, o segundo assume as rédeas. Jon Snow (Kit Harington) limitou-se a observar impotente o despotismo vindo do céu.

Dois personagens essenciais, ao que parece, deram adeus numa cena entre a emoção contida, a inevitabilidade do encontro antes do fim e a (novamente) falta de jeito da direção para conferir ao instante o peso dramático equivalente à sua imensa importância. Anticlímax total. Em The Bells, Game of Thrones se esforçou a olhos vistos para tornar sobressalente a insustentabilidade de Daenerys como postulante ao torno. Objetivo alcançado. Tornou-se absolutamente evidente que há apenas uma pessoa com predicados suficientes para ser consagrado monarca dos sete reinos, embora sua omissão diante de tantos sinais claros também possa ser considerada uma falha grave. Todavia, essa temporada derradeira, diferentemente das excelentes cinco primeiras, não está para sutilezas e complexidades. Desse modo, não é difícil antecipar o que esperar do excerto final, uma vez que há dois candidatos para um trono. Uma foi definitivamente desenhada como incapaz e, pior, perigosa. O outro, a despeito da displicência, é altivo, sem vaidade evidente e competente. Realmente lamentável que um dos programas mais celebrados em anos acabe tão desajeitadamente.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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