Crítica


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Sinopse

Ramon está vendo os números "11-11" nos lugares mais inesperados, e isso o leva a começar um tratamento psiquiátrico. Enquanto isso, seus pais - Greg e Audrey - enfrentarão esse problema cada um a seu modo, enquanto que as irmãs Ashley e Kristen são presas após se envolverem em uma confusão com ativistas de um movimento anti-aborto. Já Duc, o filho mais velho, precisa ir para um outro país - está em Vancouver para uma reunião de negócios - para lidar com sua propensão ao celibato.

Crítica

O que você está fazendo aqui?”, pergunta o amante, ainda na cama. E o outro, como resposta, oferece apenas: “estou aqui porque é onde devo estar. Apenas sinto isso. E não quero ir para nenhum outro lugar”. Esta passagem, que se desenvolve quase sem maiores repercussões imediatas, dá com precisão o tom de It’s Coming, segundo episódio da Here and Now, minissérie de apenas uma temporada criada por Alan Ball, roteirista vencedor do Oscar por Beleza Americana (1999) e responsável por séries de sucesso como A Sete Palmos (2001-2005) e True Blood (2008-2014). Esta sua mais recente produção pode não ter obtido a mesma repercussão dos trabalhos anteriores, mas não é por isso que deixa de merecer uma devida atenção. Principalmente, como é possível observar nestes dois capítulos iniciais, por sua dedicação ao que parece fazer melhor: construir personagens realmente interessantes, envoltos por dramas fora do comum, mas, ainda assim, absolutamente humanos.

Ramon (Daniel Zovatto) está em pânico. Após começar a enxergar os números 11-11 nos mais estranhos lugares, como uma insuspeita alucinação, ele começa a duvidar de sua sanidade. Enquanto os pais surtam, cada um a sua maneira – Audrey (Holly Hunter) regressa ao período conturbado que viveu ao lado do irmão doente durante a adolescência de ambos, enquanto que Greg (Tim Robbins) encontra suas próprias dificuldades para lidar com a chegada aos 60 anos – os irmãos do garoto vão enfrentando também seus fantasmas. Cabe, portanto, a Henry (Andy Bean), o flerte de ocasião, a tarefa de ficar ao lado daquele que teme, mais do que qualquer outra coisa, ver tudo ao seu redor desabar. O elo mais inesperado será aquele que irá lhe oferecer a sustentação necessária. Ao menos por enquanto, é claro.

Uma passagem que não pode passar ignorada em It’s Coming é a prisão das irmãs Ashley (Jerrika Hinton) e Kristen (Sosie Bacon). A segunda, após perder a virgindade em uma transa sem proteção, fica preocupada com a possibilidade de estar grávida ou ter pego alguma doença. A mais velha é que irá assumir a responsabilidade de lhe oferecer o amparo necessário. Ao irem a uma clínica para exames, são confundidas por ativistas de um movimento anti-aborto, e acabam se metendo em uma confusão que termina com as duas na delegacia. Os quatro filhos do casal Bayer-Boatwright não possuem ligações genéticas entre si – os três mais velhos são adotados, e apenas a caçula é do mesmo sangue dos pais. Ashley é negra, enquanto que Kristen é branca. E as diferenças entre elas representarão um abismo pelo modo como são tratadas pelos policiais. Esse tipo de abordagem, longe de ser panfletária, mostra bem a força do texto – e das imagens – proporcionadas pela criação de Ball.

Mas o que, afinal, está chegando – alusão óbvia explícita no título deste episódio? O “onze-onze” é, nos últimos instantes, compartilhado pelo patriarca, e o que dava sinais de ser uma viagem pessoal de um começa a ser transmitida aos demais familiares. Seria isso que, de um modo ou de outro, Audrey tanto desejava ao propor com efusão uma reunião com os filhos para discutirem em grupo os problemas de cada um? Ou apenas queria um modo ligeiramente civilizado de impor suas próprias vontades? Ainda é cedo para tirarmos conclusões precipitadas, mas a dica está dada: serão os laços que os unem a força dessa história, mais do que os eventos que tentarão separá-los.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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