Crítica


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Sinopse

Matheus e João Pedro, dois irmãos que – logo após a perda do pai – presenciam um evento estranho no céu: a queda de uma pedra misteriosa. João Pedro, com 12 anos, fica obcecado pelo objeto e decide procurar uma resposta na convenção anual de ufólogos, no interior do estado. Matheus, com 20 anos, alheio às crenças do irmão, busca apenas fugir de seu momento difícil voltando para sua cidade natal, onde quer reencontrar sua namorada de infância.

Crítica

Criada por Gabriel Faccini, Tiago Rezende e Tomás Fleck, com direção de Emiliano Cunha, a série Horizonte B é um sopro de novidade nas telinhas. Com quatro capítulos, exibidos primeiramente na TVE apenas para o Rio Grande do Sul, e, depois, liberados para todo o país via Netflix, esta ficção científica infanto-juvenil acerta ao não tratar seu público-alvo com condescendência. A trama é séria, com peso em certos momentos, colocando seus jovens protagonistas em perigos reais e palpáveis. Existe, como poderia se esperar de um exemplar de sci-fi, espaço para a imaginação e uma saudável predisposição para o fantástico. Produzida e filmada totalmente no Rio Grande do Sul, a série tem tudo para encontrar um público maior estando facilmente disponível em uma plataforma de streaming do tamanho da Netflix.

Na trama, acompanhamos a trajetória dos irmãos Matheus (Eduardo Cardoso) e João Pedro (Carlos Aleixo). Logo após a morte do pai, os dois encontram uma estranha pedra vinda do espaço e, João, de apenas 12 anos, se encanta pelos mistérios que aquele artefato pode trazer. Matheus, do alto de seus 20 anos, não dá muita atenção ao achado. Sua preocupação maior é reencontrar um amor do passado, Mariana (Anelise Vargas), que retornou de viagem à Europa e passará pouco tempo em Santa Maria, cidade natal de ambos. Desafiando sua mãe (Liane Venturella), Matheus foge de casa com o carro do pai e vai ao encontro da ex-namorada – sem saber que está levando o irmão caçula de carona. O menino quer aproveitar o deslocamento do irmão para visitar uma convenção de ufologia nas proximidades. Essa pequena aventura se torna ainda maior quando um homem suspeito (Marcos Contreras) se aproxima dos dois com o pretexto de ajudá-los, depois de uma pane no carro. Mal eles sabem que a pedra que João carrega é muito mais importante que ambos poderiam imaginar.

Dividida em quatro capítulos (Luto, O Brilho das Pedras, Melquíades e Ruídos), Horizonte B utiliza muito bem a narrativa seriada para contar sua história. Como de praxe, o primeiro episódio apresenta os protagonistas, a trama e os objetivos de cada um dos personagens centrais. Já no segundo e no terceiro, predominam o desenrolar da trama e as dificuldades pelas quais passam os heróis. O quarto fecha as pontas soltas e, claro, deixa espaço para uma segunda temporada. Os ganchos para os episódios seguintes são fortes e, provavelmente, farão com que o espectador assista à série por completo, de uma vez. Com apenas 26 minutos por capítulo, para qualquer um acostumado ao binge watching (assistir a vários episódios de uma vez), não chega a ser um desafio.

Com um time de jovens talentos por trás das câmeras, começando pelos criadores da série e seu diretor, passando pelos diretores de fotografia Bruno Polidoro e Lívia Pasqual e o montador Vicente Moreno, Horizonte B impressiona tecnicamente, embora nunca tente chamar a atenção para essas qualidades. Aqui, a história e seus personagens parecem estar em primeiro lugar, com uma dupla de protagonistas interessante, passando ambos por um momento transformador. A perda do pai é um óbvio catalisador para rebeldias, mas existem mais elementos no seio daquela família, que vão sendo explicados com o desenrolar dos episódios, nos fazendo entender as atitudes de cada um dos personagens. Esse cuidado com o background de Matheus e de João Pedro é importante, tornando a caça às pedras quase um MacGuffin, elemento importante aos que vivem a história, mas não tanto ao espectador. A relação entre os irmãos é mais rica, embora algumas mudanças de atitude, principalmente de Matheus, sejam explicadas de forma fraca pelo roteiro – sobretudo sua decisão de caçar a pedra, colocando ambos em demasiado perigo.

Eduardo Cardoso e Carlos Aleixo carregam bem a história, porém Marcos Contreras parece se divertir mais ao viver um homem misterioso, passeando por uma zona cinzenta que nem sempre dá as caras em produções infanto-juvenis. Isso separa Horizonte B de outras séries voltadas a esse público, que geralmente pesam a mão na criação de heróis e vilões estanques. O Gomes de Contreras é o destaque da série por não ser facilmente identificável entre essas duas caixinhas pré-estabelecidas. Uma pena que os demais antagonistas não tenham semelhante dualidade – ou até mesmo o tempo para mostrar outras tintas. Melquíades (Milton Mattos) e seus capangas, esses, sim, acabam sendo os vilões corriqueiros e, por isso, menos interessantes. Mesmo que Mattos capriche no tom ameaçador, seu personagem não ganha o tempo necessário para soar verdadeiramente perigoso.

Com bom ritmo e história dona de potencial alto para engajar o público, Horizonte B é uma bela surpresa. Num momento em que as séries estrangeiras fazem tanto sucesso entre o público nacional, é ótimo acompanhar um projeto brasileiro com qualidade para brigar pela atenção do espectador. Espera-se que ganhe uma segunda temporada, para não só vermos os mistérios dos artefatos especiais sendo mais explorados, mas também a continuação da relação dos dois irmãos.

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é crítico de cinema, membro da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul. Jornalista, produz e apresenta o programa de cinema Moviola, transmitido pela Rádio Unisinos FM 103.3. É também editor do blog Paradoxo.
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