Crítica


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Sinopse

Quando um jornalista pergunta ao CEO de um aplicativo de namoro se ele já se apaixonou, isso desencadeia uma conversa que mudará o curso de suas vidas.

Crítica

O criador de um site de relacionamentos fica surpreso quando uma jornalista lhe questiona se já se apaixonou alguma vez na vida. “Nunca me perguntaram isso antes!”. Ela rapidamente deduz que ele esconde um amor não resolvido. Ele se senta e abre o coração sobre a mulher de sua vida, que deixou escapar. Existe uma facilidade quase fantástica com que o segundo episódio de Modern Love resolve seus conflitos. Em termos de roteiro, estas reviravoltas soam inverossímeis (esse é o nível de questões que a repórter do Times tem a fazer? Os dois adultos atarefados simplesmente decidem passar a tarde no parque, falando sobre amor?), mas ela se justifica dentro da lógica idealista dos romances.

Este segmento reforça a tendência da série a se aproximar das telenovelas, sem qualquer sentido pejorativo do termo. O roteiro empresta dos folhetins as noções de um destino brincalhão, que afasta amantes perfeitos apenas para uni-los de novo no final, além dos conceitos de que o amor supera barreiras, de que é preciso seguir seus sonhos, agir impulsivamente, acreditar na resolução eventual de todos os conflitos. Obviamente, tanto o empresário Joshua (Dev Patel) quanto a jornalista Julie (Catherine Keener) vivem relacionamentos monótonos e desgastados no presente, porque não vivem com a pessoa que realmente deveriam estar. Existe apenas uma possibilidade de amor real para cada indivíduo, sugere o projeto, num raciocínio análogo ao da alma gêmea. Por isso, o curto episódio é dividido em duas metades simétricas: primeiro, ele narra seu amor desfeito, depois, ela narra o amor dela. Ganha um doce quem adivinhar o que acontece com cada um no final.

A lógica folhetinesca também faz com que o amor seja a única preocupação destes indivíduos. Não há questões financeiras, psicológicas, sociais a enfrentar. Joshua e Julie se tornam confidentes porque são românticos inveterados, e se reconhecem um no outro. Por um lado, esta estrutura é conveniente demais (os protagonistas, sentados, simplesmente narram as suas experiências em flashback), por outro lado, ela é tão aberta que permite aos relatos amorosos se desenvolverem com total liberdade, do jeito que quiserem, pelo tempo que for necessário. Nada é mais urgente do que o amor, neste caso. Enquanto o relacionamento de Joshua corresponde a uma crise existencial do hipster nova-iorquino (pelo visto, o perfil privilegiado da série), por outro lado, a história de amor entre Julie e Michael (Andy Garcia) permite enxergar com respeito a possibilidade de novos romances na meia-idade.

Ainda estamos distantes da trilogia Antes do Amanhecer (1994), Antes do Pôr do Sol (2004) e Antes da Meia-Noite (2013), evidente referência ao episódio, em termos de complexidade psicológica, mas o criador John Carney faz o possível dentro de sua cartilha modesta de recursos cinematográficos e metafóricos (a imagem óbvia demais dos gorilas e de Anna Karenina). Patel e Keener são dois ótimos atores subaproveitados no cinema e nas séries, razão pela qual é tão bom vê-los em papéis descompromissados como esses, em posição de protagonismo. O próprio conceito da amizade que une todos os anônimos, ou seja, a humanidade de um espelhando a de todos os demais, caminha em paralelo com a idealização romântica. Com seu segundo episódio, Modern Love abandona a perversidade do piloto e afirma o profundo otimismo nas perspectivas de felicidade da classe média norte-americana.

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Crítico de cinema desde 2004, membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema). Mestre em teoria de cinema pela Universidade Sorbonne Nouvelle - Paris III. Passagem por veículos como AdoroCinema, Le Monde Diplomatique Brasil e Rua - Revista Universitária do Audiovisual. Professor de cursos sobre o audiovisual e autor de artigos sobre o cinema. Editor do Papo de Cinema.
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