
Modernos de Meia Idade :: T01
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David Kohan, Max Mutchnick
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Mid-Century Modern
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2025
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EUA
Crítica
Leitores
Sinopse
Modernos de Meia Idade segue três melhores amigos, homens gays de uma certa idade. Eles decidem se aposentar juntos após uma morte acidental e fixar residência em Palm Springs, cidade situada no Deserto de Sonora, no sul da Califórnia, famosa pelas águas termais, hotéis elegantes, campos de golfe e spas. Mas todo paraíso esconde seu defeitos. Comédia.
Crítica
A ideia não é particularmente nova. Mas talvez esteja justamente essa reciclagem contemporânea um dos maiores charmes de Modernos de Meia Idade, série que teve sua primeira temporada com dez episódios lançada pela plataforma Hulu (no Brasil através da Disney+) de uma forma curiosamente discreta, apesar dos créditos estrelados que reúne. É de se imaginar que essa (falta de) estratégia tenha mais a ver com a empresa-mãe, casa do Mickey Mouse e símbolo do “entretenimento para toda família”, e menos com a ausência de atrativos envolvidos. Pois estes existem, e por todos os lados. Mas em tempos de extrema-direita no governo (nos EUA, ao menos) e movimentos retrógrados indo contra avanços de representatividade de minorias historicamente sub-representadas, um programa que fale de três amigos abertamente gays morando juntos e enfrentando em conjunto as dificuldades da homossexualidade ao se aproximarem da maturidade é, obviamente, um avanço. Mas, pelo jeito, não para todo mundo.
O início é exatamente o mesmo de O Clube das Desquitadas (1996) – que, inclusive, havia sido aproveitado em Desperate Housewives (2004-2012) – ou seja, com o falecimento de um amigo em comum. Os três remanescentes do até então quarteto se reúnem após anos afastados, e a proximidade do fim que a morte representa motiva um convite inesperado: e se decidissem todos morar juntos? A similaridade com a clássica The Golden Girls (1985-1992) não para por aí. Assim como Dorothy, ao convidar Rose e Blanche para viverem com ela, deixava apenas para a última hora avisar que sua própria mãe, Sophia, também era sua hóspede há alguns anos, da mesma forma Bunny “esquece” de informar Jerry e Arthur que Sybill, sua genitora, divide com ele o mesmo teto. O marketing de Modernos de Meia Idade pode reforçar a ideia de três protagonistas, mas o desenrolar dos episódios deixará claro que são quatro os nomes dignos de atenção. Ao menos, infelizmente, até que uma tragédia da vida real decida interferir na comédia da ficção.
É provável que a maioria dos espectadores que chegarem até o programa criado por David Kohan e Max Mutchnick (dupla vencedora do Emmy por Will & Grace, 1998-2020) tomem tal decisão atraídos pelas presenças de ou Nathan Lane, ou Matt Bomer. Ambos são nomes de sucesso, porém voltados a públicos distintos. O primeiro entrega uma performance que pouco se distingue de sua emblemática composição em A Gaiola das Loucas (1996), por mais que em um momento ou outro se perceba a engenhosidade vista em tipos como o de Os Produtores (2005) ou mesmo em Only Murders in the Building (2021-2022) – participação que lhe valeu um Emmy. Ele é tanto o elo entre os outros dois amigos, como também aquele responsável por oferecer uma conotação mais “família” ao show. Seus anseios são movidos por carências e pequenas intrigas entre parentes próximos, e as interferências tanto materna, como da irmã recém separada, conferem ao conjunto um tempero de renovado interesse. Por outro lado, é ele aquele com dificuldades de relacionamentos, sempre ansioso por se sentir validado e merecedor de atenção. A semelhança destes sentimentos com os vividos por tantos homens gays de meia idade merecia um olhar mais detalhado.
Percorrendo outro caminho, Bomer faz uma jogada acertada ao fazer de Jerry Frank um tipo que lhe parece natural, por mais que tenha evitado ao longo de sua filmografia. O “bimbo”, ou “bobo-gostosão”, lhe surge aparentemente sem esforços, ao mesmo tempo em que revela a diversidade do intérprete, percorrendo caminho distinto ao por ele experimentado em títulos como Companheiros de Viagem (2023) ou The Normal Heart (2014) – dois trabalhos que lhe valeram indicações aos Emmy. Ele poderia ser apontado como o vértice cômico do trio, por mais que episódios como Love Thy Neighbor (T01 E07) – no qual insiste em fazer amizade com uma vizinha de visão política conservadora e anti-gay – ou Turbulence (T01 E03) – em que reencontra a filha da qual estava há anos afastado – coloquem em evidência uma complexidade que vai além das reações imediatas. Sua relação com Mason (Zane Phillips, de Fire Island: Orgulho & Sedução, 2022) também é outro ponto que joga a seu favor: longe de se mostrar como um ser sexual interessado apenas em corpos padronizados – por mais que esse seja seu campo de atuação na maior parte do tempo – estará na empatia por aqueles enfrentando o mesmo tipo de dilema religioso que ele já vivenciou um dos seus diferenciais.
Por fim, eis que Nathan Lee Graham (Zoolander, 2001) entrega o tipo mais rico, porém menos explorado. Aquele que teve que lutar sozinho, que criou um nome de respeito em um mercado extremamente competitivo, que enfrenta dificuldades financeiras e que melhor estabelece uma dinâmica com a matriarca é também o que invariavelmente acaba resignado a uma piada de ocasião, a uma tirada de efeito ou a um figurino um pouco mais chamativo – como se isso fosse tudo o que lhe estivesse ao alcance de oferecer. Fosse outro o destino, não seria de se estranhar se Linda Lavin (vencedora de dois Globos de Ouro por Alice, 1976-1985) terminasse por roubar as atenções. No entanto, a veterana atriz faleceu por complicações de um câncer no fígado, aos 87 anos, após ter gravado apenas sete dos dez episódios dessa temporada de estreia. Sabiamente, ao invés de inventarem uma desculpa qualquer para retirá-la de cena, os produtores trataram de inserir a triste notícia no programa. Assim, além de alongarem sua participação por mais um derradeiro capítulo, o nono foi inteiramente dedicado a sua partida, como um tributo a altura da intérprete.
Não por acaso, o décimo e último segmento se chama The Show Must Go On – ou seja, o show deve continuar. Os três até tentam se reinventar por meio de uma inserção da irmã de Bunny, mas seria por demais forçado uma solução tão imediata. A dinâmica entre os três amigos fica mais do que estabelecida ao longo desse ano inaugural, e uma eventual – ainda que não necessária – segunda temporada deverá ter como compromisso se aprofundar nessa identidade tão particular, não apenas como válvula de escape ou dispositivo cômico, mas dona de particularidades, anseios e expectativas singulares. Modernos de Meia Idade busca ser amplo em sua representatividade ao colocar no centro de sua ação três homens homossexuais de raças, idades e origens distintas. Mas, no final das contas, o que resta é uma semelhança que vai além da primeira impressão. Tal qual essa iniciativa, que se demonstra inovadora no começo, mas que nada mais faz do que reforçar conceitos que há anos vem sendo explorados pela televisão norte-americana. Afinal, gays e héteros podem ser mais próximos em hábitos e costumes do que os preconceituosos gostariam de comprovar.


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