Crítica


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Sinopse

Elena Greco e Raffaella Cerullo são duas melhores amigas, além das melhores alunas da escola. Porém, enfrentam a resistência dos pais: a mãe de Elena quer que ela pare de estudar para ajudar em casa, assim como o pai de Raffaella, que não dispõe de dinheiro para bancar os estudos da filha.

Crítica

Quem é, afinal, a amiga genial? Essa é a questão que muitos nem chegaram a perceber, mas que vem perseguindo desde o início os mais atentos dentre os sintonizados na trajetória das vizinhas e companheiras Elena Grecco (Margherita Mazzucco) e Rafaella Cerullo (Gaia Girace). Como a história de My Brilliant Friend é narrada em primeira pessoa por Elena – na voz de Alba Rohrwacher – seria natural que a expressão que dá nome à série – e ao livro no qual o programa se baseia, lançado no Brasil como A Amiga Genial, escrito por Elena Ferrante – tivesse sido proferida pela própria. Mas somente quem completar todo o caminho é que irá descobrir o quão equivocado fora tal suposição. Não é Lenu que considera Lila sua ‘amiga genial’. É a outra que a vê assim, para espanto tanto dela quanto de grande parte da audiência. Mas, no entanto, basta um segundo de respiro para que a verdade se torne evidente. Afinal, a tímida e estudiosa garota cheia de espinhas no rosto e escondida atrás de grandes óculos é que sempre serviu de exemplo para a outra, que tudo o que fez, desde muito pequena, foi se esforçar ao máximo para tentar, ao menos, estar à altura daquela que alcança os mesmos méritos de forma tão natural que nem chega a se dar conta.

Esta parece ser tanto a genialidade de Ferrante – também envolvida com a escrita dos roteiros da série – como do diretor Saverio Costanzo – vencedor do David di Donatello, o Oscar italiano, por Private (2004). Afinal, ele guardou até o último instante essa importante revelação – ou seria a confirmação de uma antiga suspeita? – para, quando decidido a desvendá-la, a fazer de forma simples e direta, em meio a um diálogo um tanto corriqueiro, deixando claro que é o inesperado que toma parte da vida dessas meninas. Garotas que sempre estiveram sob os olhares de tantos – seja dos moradores próximos, que as cercavam do alto dos blocos residenciais onde moram, ou mesmo dos familiares e demais amigos, constantemente atentos a tudo que elas faziam e, principalmente, deixavam de fazer. A implicância com os Solara, o medo dos Carracci, a revolta dos Peluso, a determinação de Scanno, a maestra que perde a memória para não se decepcionar com futuros há muito almejados e nunca alcançados, os amores que não se concretizam e os sonhos que ficam apenas na vã esperança.

Esta miríade de possibilidades se encontra numa festa de casamento, aquela que deveria significar o fim de uma fase, mas que pode ser apenas a porta de entrada para mais problemas e desavenças. As duas estão enamoradas – Lila já noiva, Lenu apenas no início de um namoro – mas é evidente que nenhuma delas está, de fato, apaixonada. A primeira assim se encontra para se livrar de pretendentes indesejados e, mais do que isso, alcançar a independência paterna que tanto desejava. A segunda, no entanto, não quer ficar para trás, pois assim sempre se sentiu, e está disposta a tudo – até ficar ao lado daquele por quem não sente mais do que um mero afeto – para sentir-se ao menos em iguais condições. Assim foi durante toda a vida que conhecem, ao menos até aquele momento. Desde crianças, e durante a adolescência, uma estava constantemente correndo para alcançar a outra. Agora, no entanto, são mulheres – já menstruaram, possuem peito e corpos formados, vistosos e cobiçados. E não há mais espaço, nem tempo, para brincadeiras.

Qual será o futuro de Lenu e Lila? A Série Napolitana de Elena Ferrante é composta por quatro volumes – os seguintes são História do Novo Sobrenome, História de Quem Vai e de Quem Fica e História da Menina Perdida. Como ficamos sabendo no primeiro capítulo, as duas já são idosas, e estão há muito sem se falarem. Lila está perdida, e é o filho dela que decide ir atrás de Lenu, em busca de alguma pista ou informação que possa levá-lo ao paradeiro da mãe. Terão seguido amigas? Por quanto tempo? Ou a separação foi brusca e traumática? Já renovada para uma segunda temporada – História do Novo Sobrenome será a base do ano dois – My Brilliant Friend termina sua primeira jornada no exato ponto em que o livro se encerra: de olho nos pés do inimigo, lá onde foram parar os sapatos que, mais do que couro e cola, guardam ambições e tristezas e, agora, uma traição que muito provavelmente não será perdoada. Elena (Lenu) e Raffaella (Lila) ainda tem muito o que trilhar. Uma ao lado da outra, uma à frente da outra, uma no encalço da outra. Como tem sido até agora, e como deverá ser até quando for possível.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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