Crítica
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Sinopse
Romântica e idealista, a jovem Catarina chega à Rússia para casar-se com Pedro, o imperador temperamental. Ao encontro desse enlace arranjado, ela se depara com um mundo perigoso. Para modifica-lo, Catarina precisa matar o marido, bater de frente com a Igreja, despistar os militares e angariar a simpatia dos nobres.
The Great
The Great :: T03
The Great :: T02
The Great :: T01
Episódio | Data de exibição |
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The Great :: T01 :: E01 | 15/05/2020 |
Crítica
A ópera-bufa é o sedimento de The Great. De modo mordaz e agridoce, a série aborda as intrigas palacianas da Rússia no século 18. Seu criador, Tony McNamara – roteirista de A Favorita (2018), daí as óbvias semelhanças com o filme –, se vale com frequência do escárnio e do ridículo para observar a parcela que, dentro da estrutura monarquista, tende a ser vista como superior. Estreitamente ligados à ideia de hereditariedade sagrada, reis, condes, rainhas, princesas e afins habitam um imaginário privilegiado, apartados da plebe, gozando de uma existência distante das agruras comuns aos meros mortais. É justamente por mostrar incessantemente que há vasta podridão nesse reino fervilhante, para isso sinalizando a banalidade excêntrica de homens e mulheres tão mundanos quanto predizem anseios, dores e dúvidas manifestados infantilmente, que a série consegue a proeza de entreter e divertir sem alienar. É uma comédia sarcástica, um tanto perversa e corajosa em determinados momentos, o que é muito no cenário norte-americano dado à homogeneidade.
A protagonista de The Great é Catharina, a Grande (Elle Fanning), personagem factual adiante eternizada por seus feitos ostentando a coroa. Todavia, na primeira temporada ela é uma menina alemã recém-emancipada que rapidamente tem seus desejos de felicidade conjugal embaraçados pelo marido tão cruel quanto imaturo. Peter (Nicholas Hoult) faz o que bem entende, passando por cima de sentimentos e outros componentes vitais, mas que à sua empossada magnitude parecem meras veleidades. O exagero é um signo imprescindível nessa farsa toda falada em inglês, na qual a acuidade histórica é mandada às favas. Importa é a capacidade de fabulação a partir do diálogo entre fatos e aquilo que melhor se expressa por meio das eventuais distorções. Tanto que no letreiro há um asterisco remetendo ao subtítulo “ocasionalmente verdade”, algo que aponta diretamente a essa vontade de não ficar preso à verdade, de libertar-se, de pervertê-la e subverte-la visando efeito desejado. Obviamente as coisas não aconteceram desse jeito, mas por que não fantasiar sobre o sabido?
Boa parte dessa primeira temporada de The Great se dá no processo de Catharina encontrar meios e parceiros para aplicar um golpe de estado. Vislumbrando a possibilidade de levar a Rússia a um patamar menos obscuro e violento, ela projeta acabar com o marido volátil e criar alguma ordem advinda da racionalidade. Especificamente nesse caminho de construção de uma alternativa à nação, McNamara lança luz sobre a opulência dos poderes da côrte, dos Exército à Igreja. Para ascender ao trono não basta ter boa vontade e conexões, é preciso fazer conluios nem sempre progressistas, ou seja, deixar pelo caminho da mudança alguns elos menos revigorantes, assim prestando tributo à tradição. De certa maneira, há a demonstração do vício das forças enraizadas que, concomitantemente, drenam possibilidades de avanço e se perpetuam. Tudo às custas do sofrimento dos desvalidos, como mostra a resistência da burguesia diante de ideias, tais como tratar igualmente servos infectados pela varíola. Há bons espaços para a briga entre mundos de difícil coexistência.
Um dos grandes méritos de The Great é o desempenho do elenco. Elle Fanning consegue ser uma imperatriz voluntariosa, mas carente de predicados para liderar imediatamente. É uma personagem evidentemente em processo de amadurecimento. Nicholas Hoult deita e rola como o monarca imprevisível, homem capaz de arbitrariedades apenas porque ninguém o censura. Entretanto, da metade da primeira temporada em diante sua imbecilidade cede espaço para nesgas de sensibilidade e até a certa fragilidade, por meio da qual pode-se entende-lo como um menino assustado, mas mimado o suficiente para transformar seus medos em gestos potencialmente agressivos a outrem. Entre os coadjuvantes mais imediatos, destaque ao ótimo desempenho de Adam Godley como o representante da Igreja e, por isso mesmo, de um pilar bastante reacionário, e também ao trabalho excepcional de Douglas Hodge na pele do general bonachão que certamente teve dias melhores na carreira militar, bem como na vida amorosa. Eles formam um time coeso que amplia essa tragicomédia.
O nível de bizarrice nobre apresentada em The Great passa pela falecida monarca exposta no palácio – cadáver devidamente trajado com pompa e circunstância – e essa mesma defunta violada por um antigo aristocrata num instante de bebedeira. Tony McNamara não se restringe ao campo das sugestões, frequentemente afrontando suscetibilidades para que se tenha um painel paradoxalmente fidedigno de uma realidade desbragadamente deturpada. No despropósito se encontram mecanismos para iluminar a sociedade em que o hedonismo é misturado com o medo. Uma fidalga transa com o imperador literalmente diante dos olhos do marido (resignado e falsamente em júbilo) por saber que é preciso empanturrar o rei daquilo que o alimenta a fim de proteger-se e sobreviver. Às vezes extraindo graça dos descomedimentos constantes, noutras se vestindo com as cores cinzentas do drama, o criador estabelece uma narrativa calcada em saturações de diversas naturezas, assentando a partir das exorbitâncias seu olhar sincronicamente ferino e debochado.
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Grade crítica
Crítico | Nota |
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Marcelo Müller | 8 |
Daniel Oliveira | 6 |
MÉDIA | 7 |