Crítica


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Sinopse

A família Levin está melhorando de vida, mas como lidar com a possibilidade de um novo presidente, fascista e populista?

Crítica

O “se” talvez seja a palavra mais inquietante de todos os tempos. Afinal, dependendo para qual lado cai a moeda, tudo pode mudar. É a partícula condicionante, aquela que pode alterar todo o cenário. A minissérie The Plot Against America – que poderia ser traduzido literalmente como A Trama contra a América – parte justamente deste conceito: o quão diferente seriam os Estados Unidos se o rumo da nação, justamente em um dos momentos mais críticos de sua história, tivesse sido outro? Fala-se, portanto, especificamente do ano de 1940, quando o democrata Franklin D. Roosevelt venceu o republicano Wendell Willkie para o posto de presidente dos EUA. A reeleição de Roosevelt foi decisiva para a entrada do país na Segunda Guerra Mundial, que determinou, inclusive, o fim do conflito nos anos seguintes. Mas e se o candidato do Partido Republicano tivesse sido outro? Alguém como o herói nacional Charles Lindbergh, o primeiro homem a voar sozinho sob o Oceano Atlântico? Um homem populista, que tinha como intenção fechar o país e ignorar os problemas externos? A realidade certamente seria diferente.

No primeiro episódio – de um total de 6 – que foi dirigido por Minkie Spiro (realizadora indicada ao Directors Guild of America por seu trabalho em Fosse/Verdon, 2019), o espectador não é levado aos bastidores da Casa Branca ou da disputa presidencial. Pelo contrário, os protagonistas são os membros de uma família de judeus em um subúrbio de New Jersey. Os Levin são trabalhadores, construíram e conquistaram tudo o que possuem com muito suor e esforço, e prezam pela ordem e o respeito. Tanto é que Herman (Morgan Spector, de Punhos de Sangue, 2016) acabou de ser ofertado com a possibilidade de uma promoção no trabalho. Com isso, poderão se mudar para uma casa maior, mais espaçosa... mas também em outro bairro. E sair da comunidade, onde todos se conhecem pode ser problemático. Ainda mais em tempos de xenofobia e preconceitos crescentes. Exatamente o que o discurso de Lindbergh, tão difundido pelos jornais e pelas rádios – lembre-se, estamos no início dos anos 1940, e se nem a televisão existia, que dirá da internet e das redes sociais) – insiste em promover e repercutir.

Dois integrantes da família, no entanto, destoam do núcleo central. A primeira a chamar atenção é Evelyn (Winona Ryder), cunhada de Herman e irmã da esposa dele, Elizabeth (Zoe Kazan). Professora, mesmo sendo mais velha, segue solteira. Os encontros amorosos com o amante não parecem ter futuro, e ela parece destinada a uma vida solitária. Assim como Alvin (Anthony Boyle, de Tolkien, 2019), o primo causador de problemas, que é acusado de ladrão por uns e coleciona dívidas com outros. É o rapaz inquieto, que está sempre procurando confusão. Os dois – Alvin e Evelyn – são os mais suscetíveis a um discurso que estimula o nacionalismo e o individualismo, justamente por estarem desgarrados. Da mesma forma, os outros, que sempre agiram da forma correta e estão encontrando os meios de melhorarem suas vidas e daqueles ao seu redor, demonstram, sintomaticamente, serem os mais receosos pelas mudanças que podem acontecer.

The Plot Against America é baseada no livro homônimo de Philip Roth. Considerado um dos maiores romancistas norte-americanos, foi premiado com o Pulitzer, com o National Book Award e com o Man Booker, entre outros reconhecimentos. Suas obras, no entanto, poucas vezes foram tratadas com a mesma reverência pelo cinema. Fatal (2008), talvez seja a melhor das adaptações, mas é um filme que pouca gente assistiu – mesmo tendo os oscarizados Ben Kingsley e Penelope Cruz como protagonistas. O último longa feito a partir de um dos seus livros, Pastoral Americana (2016), nem chegou a estrear nos cinemas. É de se questionar se agora, no formato de minissérie, e sendo exibida pela HBO – uma das grandes plataformas de streaming e televisão – consiga, finalmente, atingir um maior alcance. Pelo que é visto nesse capítulo de estreia, as expectativas são as melhores. Basta, agora, torcer para que se concretizem com a força e a objetividade que esse discurso merece, tanto pela excelência dos envolvidos, como pelo impacto que esse discurso preserva até os dias de hoje.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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