Crítica


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Sinopse

Uma crise matrimonial. De um lado, o marido apático que reencontra a emoção em pleno júri popular de um caso de assassinato. No outro, sua mulher, galanteada por um sujeito simpático num cruzeiro dos Romanov.

Crítica

No segundo episódio de The Romanoffs, intitulado The Royal We, há uma típica crise de casal sendo administrada por uma terapeuta. A profissional tenta encontrar os pontos de divergência responsáveis por minar o matrimônio. Michael (Corey Stoll) é apático até nessa sessão com a mediadora que lhe instiga a investigar os motivos do esfriamento doméstico. Já sua esposa, Shelly (Kerry Bishé), é voluntariosa, dada a conversar abertamente sobre frustrações e o que as valha. Na verdade, ela faz uma força danada para salvar a relação, enquanto o marido demonstra uma desorientação não efetivamente perscrutada pelo diretor Matthew Weiner, tampouco como traço familiar, já que ele é um Romanov. Assim como no fragmento inaugural, a trama é bem comezinha, com elementos recorrentes nesse tipo de abordagem de naufrágios maritais. Traições, novas pessoas que mostram, a ambos, chamas aparentemente apagadas, segredos e obsessões, tudo perpassa ordinariamente a história de um amor prestes a acabar.

Recorrendo a diversas convenções, o realizador/showrunner incorre novamente num percurso conhecido, salpicado aqui e acolá com informações acerca da dinastia que unifica as partes de The Romanoffs. Enquanto Michael permanece na cidade para integrar o júri popular encarregado de analisar um caso de homicídio, Shelly embarca no cruzeiro temático, com direito a baile com o “grão-duque”, encenações de eventos importantes da história russa e, claro, um sujeito totalmente disponível para preencher as lacunas deixadas pelo cônjuge. Algo similar acontece com o protagonista, rapidamente enredado pelo perigo das curvas e dos olhares desafiadores da bela Janet (Janet Montgomery). Portanto, ambos encontram em pares diferentes o que os seus não mais atingem. Recorrendo a outro lugar-comum, o homem sucumbe totalmente à luxúria, refestelando-se nos braços da amante, enquanto a mulher interrompe os pleitos de seu desejo urgente e crepitante antes deles se concretizarem.

The Royal We dá um passo adiante – embora ainda bastante tímido – no sentido de estabelecer as circunstâncias como decorrências “naturais” de uma hereditariedade nefasta. No cruzeiro, é oferecida, de maneira um tanto didática, a contextualização dessa linhagem que foi exterminada pelos bolcheviques no século XX. Mas, isso é insuficiente, por exemplo, para construir uma ponte entre o passado sanguinolento, repleto de fratricídios e parricídios, a as atitudes dos personagens no presente. Assim, fica difícil compreender a personalidade de Michael como decorrência de uma herança maldita. O foco do episódio é na desintegração natural de um casamento, com a incomunicabilidade ganhando espaço por conta da predisposição a deixar mágoas e afins crescerem em favor de uma reconfortante, porém falsa, paz cotidiana. Isso, entretanto, é pouco para sustentar intentos sofisticados como a vontade manifestada de criar uma ligação entre o outrora de glórias e violências com um agora igualmente marcado por turbulências.

The Romanoffs continua aquém das expectativas, justamente por investir de menos naquilo que lhe é peculiar, ou seja, na consanguinidade como fator incontornável para a compreensão de determinados comportamentos. Parece que esse pano de fundo é apenas uma desculpa esfarrapada para dourar enredos simples, com gatilhos e encerramentos previsíveis, sobretudo, por conta da recorrência aos clichês totalmente atrelados aos mesmos. Com boas interpretações, ritmo cadenciado corretamente para absorvermos as demandas pessoais, The Royal We é, assim como seu predecessor, tecnicamente eficiente, mas carente de pathos, ressentido da falta de uma pegada que, primeiro, lhe ressalte as singularidades, e, segundo, confira espessura dramática aos acontecimentos. Matthew Weiner conduz tudo de forma burocrática, seguindo um percurso transparentemente meticuloso e, talvez por isso, destituído de vivacidade. O engendramentos de emoções e ações se dá friamente, com pouca paixão.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.