Crítica


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Sinopse

Os bruxos são seres dotados de capacidades extraordinárias. Geralt de Rivia, um dos mais poderosos deles, utiliza as suas habilidades em função da caça de monstros. A mesma humanidade que eles mantêm em segurança os hostiliza simplesmente por serem diferentes.

Crítica

A aparente calmaria no começo de The Witcher é rompida pela luta do protagonista, Geralt de Rivia (Henry Cavill), para sobreviver ao ataque da besta fera semelhante a uma aranha gigante. Essa quebra abrupta e desajeitada de atmosfera – antes a câmera se detinha num veado que bebia calmamente nas margens do lago – aponta à falta de sutilezas visível em todo o primeiro episódio desta aguardada série produzida pela Netflix. É consagrado pouco tempo para que conheçamos os personagens, afinal de contas aos condutores parecem mais pertinente enfileirar profecias, missões praticamente impossíveis e dilemas resolvidos com a mesma superficialidade de suas apresentações. O bruxo hostilizado é auxiliado por uma mulher considerada perigosa em virtude de sua ligação com Lilith, entidade tida como maligna nas cercanias. Ora ela funciona como um inquietante interesse romântico, ora somente como uma peça mal encaixada.

Há um artificialismo latente em The Witcher. Do ponto de vista da produção, a verossimilhança de alguns cenários é comprometida tanto pelas escolhas fotográficas quanto pela pós-produção que denuncia a utilização de chroma-key, por exemplo. Nada tão acintoso, mas perceptível o suficiente para entregar o processo. O próprio protagonista é apontado sem grande potência dramática, num trânsito meio burocrático pelas demandas, sendo entendido como uma peça fundamental para algo que provavelmente ainda será plenamente entendido. A narrativa dessa fração inaugural é bifurcada: de um lado, Geralt tem de escolher quem matar numa disputa inserida com desprovidão de contextos; de outro, um reino aparentemente forte está prestes a ser subjugado pela força de um inimigo, levando consigo a esperança de dias felizes da princesa Ciri (Freya Allan). Nesse jogo de entrelaçamento incorre-se numa ligeira confusão.

É muita mitologia conjurada em pouco tempo. Os roteiristas se esforçam para condensar em uma hora os eventos que fazem a existência de Geralt apontar à de Ciri. Essa necessidade impõe a correria desenfreada, um ritmo contraproducente ao desvelamento das circunstâncias, bem como ao envolvimento do espectador com os personagens. Henry Cavill, a priori, mantém um semblante único, o “introspecto incomodado com a configuração do mundo”, se restringindo a reproduzir o mesmo sem variações ao longo do episódio. Em somente um instante ele demonstra habilidades de luta, quando Geralt precisa tomar uma posição para resolver pendências que se dispõem no horizonte. É cedo para fazer um juízo de valor mais acurado, afinal estamos falando do episódio piloto, de um décimo do todo, mas, a considerar somente por esses 60 minutos do debute as intrigas são tratadas como elemento central, mas nem por isso devidamente organizadas.

Alardeada previamente como uma série despudorada em relação ao sexo e à violência, The Witcher decepciona em ambos os quesitos nesse O Começo do Fim. A única interação carnal é malsucedida de tão evasiva. Até os efeitos especiais deixam um pouco a desejar, vide a cena do protagonista entrando num espaço por meio da magia que o diferencia dos demais. Apenas uma sequência faz jus à expectativa, a supracitada do protagonista partindo para cima dos homens que o ameaçam na cidade de Blaviken. Não há preocupação em situar geograficamente o espectador, o que gera a ignorância quanto a distâncias a serem percorridas e o espaço que separa o bruxo matador de monstros e a nobre investida de uma capacidade extraordinária que começa a se manifestar. Julgar uma série pelo episódio inaugural tende a ser bastante reducionista, pois certas tramas se assentam com o decurso das parcelas, mas, aqui, a soma das fragilidades entrava a gana de seguir adiante.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.