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Sinopse

Cleve Jones é um jovem gay que não é aceito pelo pai. Roma Guy está na África em uma missão humanitária e se apaixona por uma colega de trabalho. Ken Jones é um militar enviado à Guerra do Vietnã que sofre pela morte do colega pelo qual era apaixonado. Nenhum deles quer continuar vivendo em segredo. De uma forma ou de outra, todos acabam indo para São Francisco.

Crítica

A mais importante série da televisão norte-americana desde Raízes (Roots, 1977)”. Assim a revista The Advocate definiu When We Rise, produção exibida nos Estados Unidos pela ABC e que no Brasil foi batizada pelo Canal Sony como Quando Fazemos História ou A Nossa Luta (é possível encontrar os dois títulos, seja no site oficial ou nas chamadas do canal). E a comparação, de fato, faz sentido – talvez não na hipérbole, mas, sim, em sua relevância social. Criada, desenvolvida, roteirizada e, em alguns episódios, dirigida por Dustin Lance Black – roteirista vencedor do Oscar por Milk: A Voz da Igualdade (2008) – o programa se propõe a ser para a comunidade LGBT de hoje tão fundamental e importante quando a série sobre as origens da escravidão foi para os afrodescendentes no final dos anos 1970. E pelo que o primeiro episódio deixou vislumbrar, grande parte dessa ambição parece ter sido atingida.

Este, na verdade, não é o primeiro episódio da minissérie que, afinal, será composta por apenas uma temporada – é, sim, apenas a primeira parte dele. Nos Estados Unidos, When We Rise foi exibido em quatro capítulos: Noite 1, no dia 27 de fevereiro, Noite 2: Partes 2 e 3, em 01 de março, Noite 3: Partes 4 e 5, em 2 de março, e Noite 4: Partes 6 e 7, em 3 de março. No total, foram 341 minutos – ou 5h41min. No Brasil, no entanto, dividiu-se a primeira noite em duas partes – da mesma forma como se apresentavam as demais – e todas foram exibidas em separado, resultando em 8 episódios de, aproximadamente, 45 minutos cada. Uma solução prática que não afeta em nada a proposta original e possibilita uma aproximação maior do público com os três núcleos narrativos iniciais.

Para melhor entender When We Rise, melhor voltar a outro trabalho de Dustin Lance Black, o já citado Milk: A Voz da Igualdade. No filme dirigido por Gus van Sant – que, aliás, é responsável por este capítulo de estreia da minissérie – Sean Penn vivia Harvey Milk, o primeiro político declaradamente gay a ser eleito nos Estados Unidos – e que fora assassinado por um dos seus oponentes. Dentre tantas pessoas importantes que cruzaram pela vida de Milk e por ele foram tocados, um foi o jovem Cleve Jones, vindo do interior, saído de uma casa cujo pai não aceitava sua orientação sexual. Se no longa vencedor de dois Oscars (além de Black, Penn também foi premiado com a estatueta dourada, reconhecido como Melhor Ator) o papel coube ao excelente Emile Hirsch, aqui ele é interpretado primeiro por Guy Pearce, nos dias atuais, e pelo novato Austin P. McKenzie, em sua juventude. Ou seja, de coadjuvante antes, aqui os holofotes estão sobre ele – ou quase isso. Afinal, não apenas sua história é que importa aqui.

Ao seu lado estão Roma Guy (Mary-Louise Parker e Emily Skeggs), uma garota de cabelos Playmobil que irá encontrar o amor nos braços de outra mulher, e Ken Jones (Michael Kenneth Williams e Jonathan Majors), um militar negro que após perder o rapaz pelo qual era apaixonado como baixa de guerra, acaba sendo transferido de volta aos Estados Unidos. Importante perceber como cada um é desenhado: Cleve luta pela paz; Roma está empenhada pelos direitos das mulheres; Ken tem como foco o preconceito racial. Os três, portanto, são ativistas. Mas não da causa gay. Essa entrará em suas vidas quase que ao acaso. Seus destinos, evidentemente, estarão ligados. É questão de tempo. Aqui, no entanto, os vemos rumo a uma jornada que irá mudar a vida de muitos, e não apenas a de cada um deles.

O verão do amor virou o inverno da heroína”, afirma o rapaz que recebe Cleve para hospedá-lo em suas primeiras noites em São Francisco. Estamos no início dos anos 1970, pouco tempo após Stonewall e o início dos protestos em nome da liberação LGBT que tomou conta do país dali em diante. A capa da revista Life aponta os principais fatos de 1971, e entre eles está o movimento gay. Cleve, Roma e Ken são tocados pela mesma manchete, ainda que cada um ao seu modo. Sem demonizar a religião – um dos momentos mais bonitos desse episódio de estreia é entre Cleve e uma freira – nem o exército – a paixão entre Ken e seu colega oficial é tão singela quanto trágica – When We Rise ainda guarda espaço nestes primeiros instantes para a participação feminina, desprezada pelos oficiais da polícia, dividida internamente e numa constante busca por aceitação. Participações especiais de estrelas como Rosie O’Donnell e Whoopi Goldberg destacam a importância deste olhar. Em resumo, tem-se um início promissor, que mantém as expectativas em alta, dando as pinceladas iniciais de uma história que tem tudo para ser marcante e, principalmente, significativa. Basta seguir os passos aqui indicados.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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