Catherine Hardwicke é uma pessoa que impressiona fácil. Chegando aos seus 60 anos, a diretora não aparenta a idade. Talvez o segredo seja o sorriso nada contido, o tom calmo e um otimismo que se reflete muito em seu mais recente projeto, Já Sinto Saudades (2015). Iniciando sua carreira oficialmente no cinema há mais de 12 anos com o elogiado Aos Treze (2003), agora Hardwicke reúne nas telas duas queridinhas do cinema mundial: a americana Drew Barrymore e a australiana Toni Collette. A diretora nos apresenta uma história sobre amizade e empoderamento das mulheres em meio à descoberta de um câncer de mama. Com uma carga tão pesada e uma responsabilidade ao abordar o assunto, ela constrói uma bela história repleta de muito senso de humor e otimismo, mesmo quando as perspectivas são as piores. Na entrevista a seguir, conversamos sobre este momento de lançamentos de filmes sobre câncer, igualdade de produção para as mulheres em Hollywood, suas protagonistas em Já Sinto Saudades e claro, se ela está ou não envolvida no remake de Tomb Raider.
O que a atraiu primeiramente no projeto?
Todos conhecemos alguém que já passou por um câncer. Conheço amigos, meu pai também havia superado um câncer e estava sempre fazendo as piadas mais engraçadas o tempo todo. Simplesmente insano. Ele foi engraçado durante todo o caminho e pensei: “Gosto disso!“. A roteirista (Morwenna Banks) é uma comediante. Então ela deu esse toque. E a Toni e Drew, nossa! Elas são tão engraçadas. Muitas das falas entre elas foram improvisadas. Então pensei que era algo bom de explorar, esse tipo de humor, essa força de vida que vai em frente independente do que aconteça. E ver como uma doença afeta seus filhos, sua mãe, seu marido, seu amante, seu melhor amigo. Afeta a todos e é o seu espírito que vai levantá-los.
E o interessante é que você não esqueceu que existe uma vida sexual também.
Exato! Ela ainda quer se sentir viva, sexy. Até mesmo quando perde um pouco de seu poder: os cabelos e os seios. Mas ela ainda sente isso, precisa disso.
O seu filme traz muita dignidade para com os personagens e as pessoas que sofrem com câncer, embarcando nessa nova linha de produções que abordam a temática, como A Culpa é das Estrelas (2014) e Eu, Você e a Garota que vai Morrer (2015). Como você vê esses filmes?
Esse assunto sempre foi um certo tabu. Aquela coisa que você não sabe como falar e agir com o seu amigo se ele está assim, doente. Acho que atualmente existe uma abertura que as pessoas estão escrevendo lindos blogs pessoais, tirando fotos e dizendo “Você não é um único passando por essa experiência“. É algo muito humano poder compartilhar. Então quando assistimos o meu filme ou esses outros filmes nos cinemas, você pode notar que existe um luto, uma emoção comunal que não compartilhamos tanto atualmente. Acho que são tempos de maior abertura, o mundo está mudando. Espero que para melhor.
Um dos pontos mais fortes do filme é o elenco. Como foi a escalação? Drew e Toni estavam envolvidas desde o começo do processo de criação?
Eu sabia que Toni havia lido o roteiro e gostado. Então comecei a assistir algumas coisas que ela havia feito e, é claro, ela não tem medo. Tentará de tudo e se colocará 100% em um projeto. É de uma bravura incrível. Então pensei: ela provavelmente perderá o peso necessário. Teve que fazer dieta, cortar o cabelo frente às câmeras… não teve medo algum. Realmente muito forte. E amamos e acompanhamos Drew desde E.T.: O Extraterrestre (1982) e a assistimos passar por tantas coisas, tantos desafios… mãe solteira, o pai e os problemas com suicídio e agora é essa mulher forte de negócios, tem um filho, escreveu um livro, toda essa vida e esse amor nisso. E é doida! Nós nunca sabemos o que fará a seguir. Então, amo isso. Ela precisava ser mais estável para ser um contraponto e balancear a personagem de Toni, que é a mais pirada. Para mim, daria tudo para Drew Barrymore ser minha melhor amiga. Ela é muito legal!
Recentemente, aqui no Brasil, presenciamos um episódio em que o protagonismo de uma mulher foi praticamente roubado. A diretora Anna Muylaert, de Que Horas Ela Volta? (2015), foi impedida de falar sobre seu filme durante um debate por dois diretores com comentários machistas e misóginos. O filme dela trata sobre a história de uma empregada doméstica de forma digna. É um retrato nada costumeiro. Você vê uma mudança, uma igualdade ocorrendo? As mulheres ganhando mais espaço e protagonismo no cinema?
Acho fantástico que estamos dando um destaque a esse assunto. Sabe, há 12 anos filmei Aos Treze (2003) e dos filmes realizados pelo mundo que são lançados comercialmente nos Estados Unidos anualmente apenas 4% são feitos por mulheres. Isso é uma loucura! E não está mudando. Todo mundo está comentando e acho que esse será o ano em que isso irá mudar. Se você ver, todo homem que está lá fora e que é um produtor executivo ou um financiador diz que fará um filme dirigido por uma mulher. Mas apenas um com uma mulher e vinte outros filmes com homens. Quando tivermos paridade nisso, aí sim teremos igualdade. Nós não queremos mais isso. Queremos ter equilíbrio.
Agora, depois de Já Sinto Saudades e o vídeo para a faixa de Lady Gaga (“Till it Happens to You”) escrita por Diane Warren, quais são os seus projetos futuros? São verdadeiros os rumores de seu envolvimento no remake de Tomb Raider?
Nunca ouvi falar disso! Ninguém me contatou a respeito. É meio engraçado, não sei se é real. Mas acabei de escrever um roteiro que espero realizar. É uma história sobre a origem de Diane Warren, que escreveu “‘Till it Happens to You“, interpretada por Lady Gaga, e a música tema do nosso filme, The Crazy Ones, interpretada por Paloma Faith. Quando muito nova, Diane era uma delinquente juvenil e todo o tipo de coisas ruins aconteceram com ela, até mesmo foi presa. O roteiro se chama One Track Line. E agora ela é uma das mais bem-sucedidas compositoras… Ela fugiu de casa e era uma bagunça, sofreu bullying. Diziam que não tinha talento, que era surda. Todas as coisas ruins possíveis lhe disseram e ainda assim Diane seguiu em frente.