Os filmes estrangeiros não precisam nem de uma cópia em 35 milímetros pra dar um laço nos brasileiros da mostra competitiva- a exceção parece ser mesmo o longa de Selton Mello, O Palhaço, fora de competição (se estivesse na disputa, sairia campeão em praticamente todas as categorias, ao menos até agora).
Na segunda e na terça feira, os longas latinos foram exibidos em DVD, por atraso na chegada dos rolos para a exibição. Uma pena, porque As Más Intenções tem toda pinta de ser favorito em várias categorias, e foi exibido em uma cópia muitas vezes fora de foco e com marcas d’água – provavelmente uma cópia de teste, em baixa qualidade, uma espécie de rascunho do diretor, apesar do corte ser mesmo o final.
O mesmo ocorreu com a exibição de A Lição de Pintura. O diretor Pablo Perelman (acima) deu a notícia antes da exibição: só havia chegado a cópia em DVD. Pena, muita pena. A linda fotografia, quase como quadros pintados à óleo – belo trabalho de linguagem cinematográfica, aliás, ligando perfeitamente o assunto do filme a um elemento técnico – ficaria ainda mais bonita se fosse vista em uma cópia de 35 mm. Nada que tenha, porém, prejudicado o ótimo roteiro e as belas atuações do protagonista mirim (mais um desta edição).
Depois da justíssima e bonita homenagem à atriz Fernanda Montenegro, que ganhou o Troféu Oscarito, o filme chileno ganhou ainda mais envergadura, comparado com o brasileiro da noite. As Hiper Mulheres é um belo estudo antropológico, e que deve ser muito útil no ambiente acadêmico. Mas é só. Nada do que se passa na tela remete a uma linguagem minimamente cinematográfica, o que só foi confirmado a partir do debate com os diretores (abaixo). Dizem eles que, por muitas vezes, apenas abriam a câmera e esperavam tudo acontecer, para que os índios não se intimidassem com uma presença estranha. Quase um Big Brother, tido hoje em dia por muitos especialistas como – vejam só – um belo estudo antropológico do que é a sociedade moderna. Contraditoriamente, ao mesmo tempo em que não queriam ser notados, os diretores também dizem ter encenado algumas situações para poder mostrar coisas que não seriam possíveis ser mostradas espontaneamente. Logicamente, essa encenação fica clara na grande tela, e o pouco de força das imagens logo vai embora sem a espontaneidade indígena.
As Hiper Mulheres é um longa de pouca contextualização e um argumento fraco. Mas serve muito bem como um registro de um ritual que, se não fosse filmado, provavelmente um dia seria perdido – situação que encontra eco em uma das próprias histórias do filme. Tem sua importância, mas não como cinema.