Uma ensolarada e agradável manhã de sábado deu início às atividades do segundo dia de programações do 42º Festival de Cinema de Gramado. Como tradicionalmente ocorre, enquanto o Palácio dos Festivais reprisava os longas-metragens exibidos na noite anterior, o Recreio Gramadense serviu de cenário para debates com as equipes dos filmes Isolados (2013), de Tomás Portella, e A Despedida (2014), de Marcelo Galvão. A primeira coletiva de imprensa apresentou um grupo mais defensivo e preocupado em destacar o processo de produção do filme, com Regiane Alves e Bruno Gagliasso discorrendo sobre suas caracterizações, a roteirista Mariana Vielmond assumindo as referências de O Iluminado (1980) e Ilha do Medo (2010) e Portella justificando suas escolhas estéticas embasado no que o espectador espera de um filme de suspense.
Já o debate com o time de A Despedida foi mais leve e pautado essencialmente na trindade que tornou o filme possível: Marcelo Galvão, diretor, Nelson Xavier e Juliana Paes, casal de protagonistas dessa tocante história. Juliana, que assumiu ter terminado a sessão às lágrimas, ressaltou também o empenho de Xavier na construção de um papel tão complexo. Galvão, por sua vez, foi seguro em suas ponderações e dedicou o filme ao seu avô e também para sua equipe, que assina com ele a direção do longa-metragem.
Após um intervalo de almoço para o público apreciar as delícias gastronômicas da Serra gaúcha, a programação seguiu com os primeiros nove filmes da Mostra Gaúcha de curtas que concorrem ao Prêmio Assembleia Legislativa. Com qualidade superior aos títulos exibidos no ano passado, a exibição sequencial apresentou trabalhos relevantes e alguns de grande destaque, como Linda – Uma História Horrível, de Bruno Gularte Barreto, O Relâmpago e a Febre, de Gilson Vargas, além daquele que merece menção como o melhor filme do Festival até o momento: Caçador, de Rafael Duarte e Taísa Ennes Marques. O drama de proporções épicas concentra impressionantes qualidades numa narrativa universal, atemporal e excepcionalmente fotografada.
Na programação desse segundo dia de um festival que ainda não definiu muitas temáticas, uma unidade entre os curtas em competição apareceu em suas fotografias amplificadas num preto e branco bonito e dramático, enquanto os longas se aproximam ao apresentar histórias de guerras passadas. O primeiro curta, o paraibano Contínuo, de Carlos Ebert e Odécio Antonio, retrata os transtornos de um homem imerso num mundo quadrado, burocrático e sem cores. A direção de Ebert e Antonio pontua a narrativa do curta obssesivamente, como o protagonista, num jogo de planos e enquadramentos inteligente e engenhoso. Já a exibição do interessante La Llamada, curta produzido na escola de cinema cubana de San Antonio de Los Baños, foi dedicada ao cineasta Eduardo Coutinho pelo diretor Gustavo Vinagre. A homenagem possivelmente orgulharia o documentarista, uma vez que o filme emula a interação íntima entre entrevistador e entrevistado que Coutinho dominava singularmente.
Entre a projeção de Contínuo e La Llamada, no entanto, dois momentos marcaram este dia de festival por motivos distintos. O primeiro deles foi a exibição em competição do longa-metragem Os Senhores da Guerra (2014), de Tabajara Ruas, que tomou conta do Palácio dos Festivais com sua grandiosa equipe e foi ovacionado pela mesma ao encerramento da sessão. Produção que retrata um período dramático do Rio Grande do Sul, o filme foi defendido pelo cineasta, que disse que o filme discorre sobre “a história da construção do país e do nosso estado”. Na sequência, uma bonita apresentação introduziu o grande homenageado da noite com o troféu Cidade de Gramado: o astro Rodrigo Santoro. O ator, que havia confessado mais cedo sua alegria por receber tal distinção, fez um discurso emocionado interrompido por suspiros e lágrimas, onde destacou as grandes passagens de sua carreira como vivências e aprendizados inesquecíveis. Por fim, o ator foi aplaudido entusiasticamente por um palácio já um pouco vazio – afinal, grande parte da equipe de Os Senhores da Guerra já havia deixado o espaço para celebrar a estreia de seu filme.
Como já havia ocorrido no primeiro dia de festival, o segundo longa da mostra competitiva foi iniciado com considerável atraso: a projeção se iniciou após às 23h, sendo que estava programada para 21h30min. O drama de guerra A Estrada 47, de Vicente Ferraz, já exibido na última edição do Festival do Rio, foi apresentado pelo diretor como inédito, uma vez que o filme recebeu um novo corte para o Festival de Gramado. O detalhe curioso é que a produção foi a vencedora justamente do prêmio de melhor edição no festival carioca. Ao lado de Júlio Andrade, Daniel de Oliveira e outros membros de sua equipe, Ferraz relatou algumas experiências inesquecíveis e difíceis da produção e dedicou a sessão aos afligidos pelo atual conflito na Faixa de Gaza.
O saldo do dia, com um total de 13 filmes exibidos, foi em geral morno e pouco memorável. Os títulos exibidos nas competitivas principais podem até levar alguns prêmios em categorias técnicas ao fim do festival, porém o grande momento deste segundo dia é merecidamente do curta-metragem gaúcho Caçador. E que venham as novas sessões!
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