Escolhido Melhor Filme na recente cerimônia do Oscar, 12 Anos de Escravidão (2013) aborda a saga de sofrimento de um negro alforriado que é reconduzido à condição de escravo. Utilizando chave melodramática e contando com respeitável elenco de apoio, o diretor Steve McQueen levou às telas um filme de evidente vocação para a controvérsia, tanto no que diz respeito à sua relevância cinematográfica quanto naquilo que tange sua abordagem social. Uns acham que se trata de um dos filmes americanos mais importantes dos últimos tempos. Claro, há quem considere bastante exagerada essa atenção que o longa vem recebendo. Agora, mais do que nunca, com todos os holofotes voltados para si, 12 Anos de Escravidão será um filme mais e mais discutido. E como debate e conversa é conosco mesmo, convocamos Robledo Milani e Yuri Correa para, respectivamente, atacar e defender a realização de McQueen. E aí, na sua opinião, quem leva a melhor? Confira e participe.
A FAVOR :: “Desperta o melhor e o pior do espectador”, por Yuri Correa
Fria, distante, incômoda, são adjetivos que descrevem a direção de Steve McQueen aqui. E, sim, isso é um elogio. Ao se afastar de seu próprio filme, o diretor cria uma imparcialidade não imposta, mas cedida ao espectador, um vácuo emocional que aqueles do lado de cá da tela devem preencher com seus sentimentos, moralidades e julgamentos. McQueen não toma partidos, não apela, mostra a essência de todos os personagens, inclusive a do nosso protagonista que, apesar de sua situação, não é retratado como um herói injustiçado. Se o revoltante surge em tela, é porque se faz necessário à trama, é um elemento factual para ser considerado pelo público em sua investigação do caráter daqueles personagens. O que, talvez sem que percebamos, acabe revelando mais sobre nós mesmos do que sobre aquelas figuras vistas em tela. E desse ponto de vista, 12 Anos de Escravidão é um filme importante não só pelo tema, mas pela abordagem ironicamente envolvente que tem o potencial de despertar o melhor e o pior do espectador, isso justamente ao mostrar o melhor, e, enfim, muito do pior do ser humano.
CONTRA: “Um drama que não sobrevive a uma análise mais detalhada”, por Robledo Milani
O drama baseado em fatos reais sobre o insólito episódio de um homem negro e livre, nos Estados Unidos pré-Guerra Civil, que é sequestrado e vendido como escravo, situação na qual ele deverá permanecer por, como já adianta o título, 12 anos, é a aposta correta para vencer o Oscar por vários motivos. Nenhum, no entanto, que envolva meramente suas qualidades cinematográficas. Afinal, temos aqui um filme socialmente relevante, que aborda num plano maior uma das maiores injustiças da história norte-americana, e a oportunidade de promover um ‘mea culpa’ era simplesmente irresistível. No entanto, o excesso de participações especiais no elenco – Paul Giamatti, Paul Dano, Quvenzhané Wallis, Alfre Woodard, Benedict Cumberbatch – nos remete de imediato aos dramas comerciais de Lee Daniels, enquanto que algumas soluções – como a participação aos 45 minutos do segundo tempo de Brad Pitt, que surge apenas para resolver o problema – soam simplistas demais. A fotografia épica, o sofrimento mostrado nos mínimos detalhes dos protagonistas, a maldade insana e sem nuances dos vilões, a edição picotada que desfavorece o intérprete… tudo está a favor de provocar reações extremadas do público, porém suavizando a reflexão. Sinal que não sobrevive a uma análise mais detalhada. O que, de fato, procede.