Terceiro longa-metragem do diretor sul-africano Neill Blomkamp, Chappie (2015) é protagonizado por um robô, o primeiro que possui, além da inteligência lógica vista em seus similares responsáveis pela segurança pública, a capacidade de emocionar-se. Assim, a velha questão intrínseca à nossa evolução tecnológica coloca em xeque os valores de uma sociedade ainda despreparada para conviver com seres a priori projetados apenas para obedecer, vistos como ameaça à hegemonia da raça humana quando ganham autonomia. Chappie teve uma recepção morna, passando longe do esperado sucesso de bilheteria. Para debater sobre a nova realização de Neill Blomkamp, chamamos ao Confronto da semana os críticos Robledo Milani e Thomás Boeira, respectivamente atacante e defensor do filme. Quem leva a melhor nesse embate de ideias? Confira e não deixe de opinar.
A FAVOR :: “Protagonista carismático, inserido num contexto curioso”, por Thomás Boeira
Quando alguém estreia com um grande filme, normal esperar que seus trabalhos seguintes sejam tão bons ou até melhores. Mas não é bem isso que vem acontecendo com Neill Blomkamp. Depois de ser elogiado por público e crítica em virtude de Distrito 9 (2009), o cineasta não conseguiu a mesma recepção com Elysium (2013) e Chappie. No entanto, vale dizer que, apesar de não alcançarem o mesmo nível, as duas obras não chegam a ser ruins, tendo elementos interessantes que as tornam eficientes. Em Chappie, Blomkamp novamente entra na área da ficção científica, retomando algumas coisas vistas em seus filmes anteriores e trazendo várias ideias bacanas já exploradas no cinema, como o uso de inteligência artificial, a possibilidade de replicar a consciência humana, a influência da sociedade sobre o indivíduo e até mesmo um pouco de religião (através do personagem de Hugh Jackman). É muito interessante vê-las na tela. A bagunça temática é compensada pelo personagem-título (vivido por Sharlto Copley), protagonista carismático, inserido num contexto curioso. Assim, Chappie pode até ser problemático, mas não o suficiente para afirmar que Blomkamp usou todo talento apenas no começo.
CONTRA :: “Sem personalidade ou características marcantes, torna-se impossível uma identificação com o espectador”, por Robledo Milani
Após ser indicado ao Oscar de Melhor Filme por seu trabalho de estreia, o diretor sul-africano Neill Blomkamp tem se preocupado em desfazer a imagem de nova promessa de Hollywood, em um processo semelhante àquele vivido uma década antes por M. Night Shyamalan. Mas se o universo deste era o do suspense com reviravoltas mirabolantes, Blomkamp prefere a praia da ficção científica futurista decadente. Foi assim em Elysium, que até ganhava pontos por trazer no elenco os brasileiros Wagner Moura e Alice Braga. Mas o que pode ser usado a favor deste seu mais recente esforço? Chappie nada mais é do que a enésima releitura do clássico Pinóquio (1940), que desde seu lançamento já foi revisto inúmeras vezes, até pela própria Disney (Wall-E, 2008), passando pelo spielberg-kubrickiano A.I.: Inteligência Artificial (2001). Porém, ao contrário destes, o robô que quer ter emoções reais enquanto foge do sentimentalismo ingênuo de Dev Patel e das armações de Hugh Jackman (com o pior corte de cabelo desde Tom Hanks em O Código Da Vinci, 2006) é quase um alienígena, sem personalidade ou características marcantes, tornando impossível uma identificação com o espectador. Soma-se a isso um roteiro esquemático e previsível e, pronto: tem-se em mãos um dos piores lançamentos desta temporada.