Ruy Guerra festival de gramado papo de cinema

Desde 2007 uma nova homenagem tem espaço dentro da programação oficial do Festival de Gramado – como se fossem poucas as já instituídas! É o Kikito de Cristal, que tem como justificativa reconhecer a carreira de grandes cineastas latino-americanos. E depois do brasileiro Eduardo Coutinho e do cubano Julio Garcia Espinosa, chegou a vez do moçambicano Ruy Guerra (acima). Autor de um dos maiores clássicos do Cinema Novo Brasileiro – para onde veio aos 19 anos de idade – é lembrado até hoje por títulos como Os Cafajestes (1962) e Os Fuzis (1964). Numa carreira relativamente curta (em produção), porém extensa (em duração), teve outros destaques nos anos 80 (Ópera do Malandro, de 1985, e Kuarup, de 1988), embora seus últimos trabalhos, já nos anos 2000 (Estorvo, de 2000, e O Veneno da Madrugada, de 2006), tenham passado em brancas nuvens tanto pela crítica como, principalmente, pelo público. Mesmo assim, foi uma lembrança mais do que justa, e o tom emocionado do seu discurso de agradecimento nos fez, os presentes, lembrar dos porquês de um Festival de Cinema – ao contrário dos estrelismos do dia anterior.

A mostra competitiva de longas nacionais exibiu, no seu último dia, um filme bonito, porém estranho. Trata-se de Corpos Celestes, primeiro trabalho de Marcos Jorge, feito ainda antes do seu surpreendente Estômago (que recebeu 5 indicações ao Prêmio Guarani 2009, inclusive à Melhor Filme, e ganhou em 3 categorias: Ator, para João Miguel, Roteiro Adaptado e Revelação do Ano, para Fabiúla Nascimento). Aqui ele divide os créditos da direção com Fernando Severo, e os dois contam a história de um homem (Dalton Vigh, quando adulto, e Rodrigo Cornelsen, na infância) que decide ser astrônomo após ficar amigo de um americano cheio de hábitos curiosos, ainda quando era criança. É um filme interessante, de fotografia envolvente e conduzido com carinho, mas dono de um roteiro que não entrega facilmente suas intenções, trabalhando mais com a subjetividade dos personagens do que com um enredo que necessite evoluir linearmente. É um filme que provoca admiração, mas não levanta paixões. Certamente deverá ser lembrado na noite de premiação, porém não nas categorias principais.

Gigante festival de gramado papo de cinema

A boa surpresa da sexta-feira, no entanto, vem de perto – do Uruguai. Foi o filme Gigante, de Adrian Biniez. Chegando cheio de pompa à competição latina em Gramado, após a consagração no Festival de Berlim deste ano, onde levou três prêmios do júri oficial, inclusive o Urso de Prata, Gigante veio para fazer frente à outro companheiro de Berlim, o peruano A Teta Assustada. São duas produções excelentes – sem sombra de dúvidas as melhores apresentadas nesta temporada em Gramado, independente da categoria ou metragem – que deixaram o público em estado de graça. Brincando com os silêncios e os sentimentos internos dos personagens principais – um segurança e uma atendente da limpeza de supermercado – consegue construir uma bela história de amor, daquelas que nos faz torcer pelo final feliz. Conseguindo preparar inteligentes armadilhas para o espectador, porém sem nunca desrespeitar a inteligência deste, é uma obra de respeito, alegre, emocionante e madura. Louvável em todos os seus aspectos, despertou a simpatia do público desde a sua apresentação, quando o protagonista Horacio Camandule (ao lado), que estava presente, introduziu a trama esbanjando carisma e atenção. Com Gigante e A Teta Assustada o Festival de Gramado de 2009 mostrou mais uma vez o futuro deste evento está, cada vez mais, na internacionalização.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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