Crítica


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Sinopse

Lacie Pound vive em um mundo onde as pessoas podem avaliar popularidades com cinco estrelas. Lacie, que é obcecada por ser bem recebida, começa o episódio com um índice de aprovação em torno de 4.2. Naomi, a amiga de infância de Lacie, pede a ela para ser sua dama de honra em seu casamento. Naomi tem uma classificação de 4.8 e muitos amigos seus que possuem uma "classificação alta" vivem em uma ilha particular. Lacie acredita que se ela entregar um discurso de honra perfeito, sua classificação será elevada até os 4.5 ela precisa.

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Crítica

O cenário é uma sociedade aparentemente perfeita. Todos lindos, bem arrumados, dando bom dia e boa tarde. Um clima de positividade no ar. Logo, a gente entende o porquê. Quanto “melhor” a pessoa for, mais likes ela ganha nas redes sociais. E estes likes se traduzem na própria vida de cada um. Quanto maior sua média, mais popular você é. Consequentemente, há mais chances de ser um membro ativo dessa comunidade acima dos padrões. Na verdade, não parece apenas um capítulo de Black Mirror. O primeiro episódio da terceira temporada, Nosedive, retrata uma realidade bem presente em época de Facebook e Instagram, em que o maior número de curtidas numa foto ou publicação aumenta as supostas qualidades do indivíduo, mesmo que seja tudo imagem, não apenas a vida real.

É nesse contexto que conhecemos Lacie, interpretada por Bryce Dallas Howard. Ela é uma simples trabalhadora que vive com um sorriso forçado no rosto toda vez que sai de casa, onde mora com o irmão despretensioso. A garota quer ser mais do que é, algo claro já na cena em que pratica seu sorriso no espelho. Pretende morar num condomínio luxuoso, mas precisa aumentar sua média. Por enquanto, ela está bem. Estável. Na média. Mas ela não quer ser mediana. Lacie tem como objetivo o mesmo nível de Naomie (Alice Eve), sua amiga de infância que vai casar com um bonitão rico. Uma foto postada nas redes faz com que a “amiga” lembre de Lacie e a convide para ser sua dama de honra. É a chance da protagonista conhecer outras pessoas do alto escalão, subir sua média e conseguir a vaga da tal casa que tanto deseja.

A sociedade retratada na direção de Joe Wright é tal qual os belos filmes de época do cineasta: um visual luxuoso, nobre, ainda que contemporâneo, tempo contrário de seus filmes como Orgulho e Preconceito (2005) e Desejo e Reparação (2007). O tom claro, quase onírico, das imagens, reflete as vestes brancas e cores pálidas dos personagens. Não à toa um dos que se destaca é um negro, curiosamente, com uma pontuação bem abaixo da média geral (fato que se explica por ter terminado o noivado com outro rapaz), o que fez todos se virarem contra ele. Há uma cutucada no racismo aqui, mas a discussão é mais ampla sobre o mundo de aparências. Lacie se esforça a cada segundo para ser irritantemente simpática com todos. Tanta forçada de barra acaba gerando alguns pontos negativos, pois muitos percebem que não é esse seu estado natural.

A construção de Bryce Dallas Howard para sua personagem é assustadoramente afetada, da maneira certa. Ela é um embuste ambulante. Alguém que prefere fingir que está tudo bem só para conquistar pontos com os outros. No caso, literalmente. O fato da atriz estar "mais cheinha” não é à toa. Ela representa aquela camada dos excluídos que vive em busca da perfeição dita pela sociedade. Especialmente, sobre seu corpo. Os resquícios do peso, que vem desde a infância (mencionado especialmente em sua relação passivo-agressiva com Naomie) representam exatamente aquilo que vemos nas redes sociais do mundo aqui de fora. Corpos perfeitos, muitas vezes com a ajuda de filtros e Photoshop, em cenários lindos e deslumbrantes. O desejo de ser que reflete para outros se sentirem mal a ponto de buscar o mesmo objetivo.

Só que nem Naomie é tão perfeita assim quanto parece. Na conversa online com a amiga, seu pouco resquício de humanidade exala quando convida Lacie para ser sua dama de honra, já que a garota entende que todos ao seu redor são personalidades fúteis que não a conhecem a fundo. Afinal, quem para de verdade para saber mais do outro quando apenas o que está na superfície parece importar? Nosedive pode até aparentar ser leve na sua construção, com humor ameno (ainda que desemboque na acidez ao seu fim) e pouca violência. Talvez sua mensagem, um pouco mais mastigada que o normal da complexidade de Black Mirror, seja até mais interessante que a própria produção. Porém, são tantos méritos nesse jogo em que a realidade é tão presente, que fica difícil ser indiferente à narrativa que se tem em mãos. E, se curtiu o texto, dá cinco estrelas pra aumentar minha média? Se não, fuck it!

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é crítico de cinema, apresentador do Espaço Público Cinema exibido nas TVAL-RS e TVE e membro da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul. Jornalista e especialista em Cinema Expandido pela PUCRS.
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