Crítica


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Sinopse

Kenny, um adolescente, instala um removedor de malware em seu laptop depois que sua irmã pegou-o emprestado sem permissão. Usando o primeiro link de pesquisa, para um site chamado "Shrive", ele consegue remover o vírus. No entanto, um arker oculto ganha acesso à webcam do laptop e grava Kenny se masturbando na frente do mesmo. O arker envia um e-mail para Kenny dizendo-lhe para fornecer seu número de telefone, ou o vídeo dele se masturbando seria liberado para todos na sua lista de contatos. Kenny aceita e envia seu número.

Black Mirror


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Crítica

Shut Up and Dance pode ser traduzido livremente como Cala Boca e Dança, o que não faz o menor sentido diante da trama do terceiro episódio desta temporada, a primeira produzida especialmente para a Netflix. Tem mais lógica, no entanto, a adaptação exibida na plataforma de streaming: Manda quem Pode. E obedece quem tem juízo, seria o complemento. Pois, durante pouco mais de cinquenta minutos de duração, acompanhamos diversas pessoas – cinco, para sermos mais exatos –estranhas umas às outras, realizando tarefas aparentemente aleatórias e contra suas vontades. O que as liga e, mais importante, por que estão executando tais ações? Esse mistério, ao menos, logo é revelado. Mas segue perturbador imaginar quem estaria por trás de tais ordens. E é justamente esse o mote de toda a série Black Mirror.

Kenny (Alex Lawther, que viveu o jovem Alan Turing no oscarizado O Jogo da Imitação, 2014) é um rapaz franzino que causa pouca impressão em quem, por ventura, nele reparar. De físico discreto, rosto cheio de espinhas e barba incipiente, mais balbucia do que realmente fala. É bruto com a irmã mais nova, dissimulado com a mãe e praticamente invisível diante dos colegas de trabalho, uma lanchonete onde ganha alguns trocados como faz tudo: limpando mesas, levando lixo para fora, ajudando na cozinha. Nos primeiros minutos da trama, a única vez em que o vemos sorrir é ao se dirigir a uma menina que esqueceu um brinquedo no restaurante, que lhe agradece ao tê-lo de volta. Finalmente alguém parece ter notado sua existência. Mas ao que ele, enfim, está atento?

À noite, como muitos outros adolescentes iguais a ele, o garoto se tranca no quarto, abre o laptop e desabotoa a calça. Não precisa ser um gênio para suspeitar o que vem a seguir. Mas o segredo da direção de James Watkins (A Mulher de Preto, 2012) está justamente neste elemento: imagina-se o que se desenrola naquele quarto, porém a certeza só vem muito depois – se é que, em algum momento, ela chega. Após sair do banheiro para lavar as mãos, ele volta para sua escrivaninha e percebe um novo e-mail, de remetente desconhecido. “Nós sabemos o que você fez”, afirma a mensagem, para logo abaixo exibir um vídeo do que teria acontecido instantes antes naquele mesmo local. O pânico toma conta, e ele fecha o computador. Logo em seguida, dando-se conta de que não teria como fugir, o liga novamente. Um segundo recado exige o número do seu telefone. A partir daquele momento, deverá fazer tudo o que lhe mandam, sob o risco de ter o seu "segredo" vazado online para todos os seus contatos.

O medo é tamanho que Kenny pouco pensa, apenas reage. No dia seguinte, se vê numa correria para chegar ao alto de um prédio de estacionamentos, onde outra pessoa, supostamente em situação similar, lhe entrega uma caixa com um aviso: “frágil”. Ali está um bolo, que deve ser levado até um quarto de hotel no outro lado da cidade. Lá, encontra Hector (Jerome Flynn, de Com Amor, Van Gogh, 2017), que também se vê em apuros e passa a ajudá-lo, como se estivessem em uma gincana infernal. Juntos, assaltam um banco e se dirigem a um descampado, longe da cidade. Lá, ao se separarem, o protagonista encontra mais uma vítima em potencial. O pecado deste parece ter sido o mesmo que o seu. Para se verem livres, devem lutar um contra o outro, até a morte. O sobrevivente ganha tudo – dinheiro, alívio, liberdade. Mas seria tão simples assim deixar o que foi vivido neste dia para trás? E a que preço?

A maratona é incansável, e Alex Lawther é um intérprete à altura das exigências que o papel lhe faz: por mais estranho que tudo possa soar, ficamos ao seu lado do início ao...bem, quase até o fim. A reviravolta no encerramento é de derrubar qualquer um, destruindo expectativas e obrigando àqueles na audiência a revisarem seus conceitos e olhares. Se o objetivo de Watkins e dos roteiristas William Bridges (responsável também por T04E01 USS Callister, 2017) e Charlie Brooker era provocar e exigir uma reflexão mais profunda, aqui encontramos material perfeito para isso: tem-se um dos enredos mais realistas, que poderia se passar nos dias de hoje, sem invenções futurísticas, deixando claro que os perigos – ou seguranças – oferecidas pelas novas tecnologias estão mais próximas do que desejaríamos acreditar. Mas um que outro elemento, como a caroneira que deveria servir como recurso cômico, ou a chefe do protagonista que insiste em ser atenciosa com ele – uma atitude que não se justifica – quase põem tudo a perder. Objetivo é direto, é eficiente com o pouco que oferece – e, com menos ainda, beiraria à perfeição.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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