Crítica


5

Leitores


1 voto 8

Sinopse

Marc/Steve vai ao Egito para impedir que Arthur ressuscite a deusa Ammit. Ele vai se reunir com os demais avatares dos deuses, uma reunião em que as artimanhas do vilão são colocadas à mesa e debatidas entre divindades.

Crítica

Chegamos à metade de Cavaleiro da Lua. E cresce a sensação de que, guardadas algumas peculiaridades, a minissérie segue à risca um roteiro que tem se tornado comum nos produtos da Marvel para streaming: há uma missão a ser cumprida; o herói se prontifica (aqui depois de relutar); e em torno da tarefa surgem pequenos conflitos que nem são bem desenvolvidos. O foco não é necessariamente o personagem, mas a situação no geral. E isso é fundamental para determinar, pelo menos por aqui, o até agora morno resultado. Temos em cena um protagonista em constante conflito – na verdade, três existências singulares coabitando um corpo. No entanto, os idealizadores não contam a história tendo como foco central os personagens, preferindo subordiná-los à intriga que envolve conspirações faraônicas, deuses coléricos e profecias egípcias sendo mal trabalhadas. Em vez de partir da investigação dessa tensão humana que existe entre Steve e Marc (Oscar Isaac) precisando aprender a conviver e colaborar aos poucos, o roteiro transforma essas pequenas tensões em meros obstáculos a serem vencidos.

Portanto, não se trata de um protagonista fracionado que preciosa se organizar para impedir o vilão de cumprir a sua intenção nefasta. Trata-se de uma trama envolvendo poderes inimagináveis que, por acaso, depende da evolução pessoal de alguém que se descobre possuidor de duas personalidades. Parece que não faz tanta diferença, mas faz. De onde partir para contar a história determina a ênfase, o norte, em suma, a prioridade. E em Cavaleiro da Lua a prioridade está cada vez mais definida como a ação envolvendo um personagem que tinha tudo para ser fascinante, mas não é. Nesse terceiro episódio, Marc/Steve vai ao Egito para impedir que Arthur (Ethan Hawke) ressuscite a deusa Ammit. Do país asiático vemos apenas: as pirâmides, o deserto, uma feira (postiça) lotada e um ricaço colecionador de artes. E tudo o que ali acontece é rápido e sem grande impacto dramático. Culpa da displicência com a qual as subtramas são apresentadas, organizadas e desenvolvidas. Por exemplo: a reunião com os deuses, uma ocasião que aparentemente é repleta de pompa e circunstância, não é bem assim.

Pode-se continuar afirmando que Cavaleiro da Lua tem os mesmos problemas estruturais de boa parte das séries/minisséries da Marvel: muita histórica para pouco tempo. Curiosamente, mesmo com generosos seis episódios de cerca de 50 minutos cada à disposição, os criadores ainda conseguem deixar no ar uma sensação frequente de atropelo e superficialidade. E isso acontece pela forma como eles conduzem situações que pedem uma grandiosidade e um relevo que nunca acontece. Voltando à reunião dos deuses. Em poucos instantes, Steve/Marc está diante dos avatares de seres mitológicos superpoderosos (sem muito tempo para expor a própria sina), e Arthur aparece para se defender das acusações daquilo que realmente está fazendo. E os deuses “compram” a versão do vilão como se apenas a sua palavra, o “olha, não estou fazendo nada”, fosse mais que suficiente. Esse tipo de fragilidade e incongruência se torna um empecilho e tanto, especialmente porque enfatiza a displicência antes mencionada. Enquanto isso, o protagonista é reduzido a ser visto como o homem capaz de virar a chave e ser outro.

Há evidentemente traços de uma dimensão trágica até o momento negligenciada em Cavaleiro da Lua. Marc está se sacrificando para que sua amada não seja a próxima “vítima” de Khonshu (voz de F. Murray Abraham); Steven está evidentemente se afeiçoando aos poucos à esposa de sua outra personalidade enquanto tenta entender o que está acontecendo; Khonshu é um deus colérico que também pode ser entendido como um poço de ressentimento por ter sido banido. Tudo isso está lá, à disposição para quem quiser acessar, desde que superficialmente. Parece que os idealizadores da minissérie estão mais preocupados em estabelecer as regras de um mundo ao qual ainda não tínhamos sido apresentados do que construir uma dinâmica consistente o suficiente para nos interessarmos por ela. Em meio a isso, o aspecto da ação ainda é sacrificado. No terceiro episódio pouca coisa acontece nesse sentido, pois o roteiro segue empenhado em empilhar fatos, lançar perguntas (aqui, sobretudo, algo que diz respeito ao passado do interesse amoroso do protagonista), mas nada ao ponto empolgar e/ou emocionar.

As duas abas seguintes alteram o conteúdo abaixo.
avatar
Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *