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O signo reinando soberano no episódio inaugural da terceira temporada de The Crown é a mudança. Primeiro, pois todo o elenco principal da série foi alterado – algo dentro dos planos da Netflix, produtora que pretende fazer isso a cada biênio. E tal novidade é sinalizada abertamente, com toques metalinguísticos, logo no começo, quando a rainha Elizabeth II (Olivia Colman) é apresentada à nova versão do selo postal estampado com seu rosto. À esquerda, o semblante de Claire Foy, antiga intérprete da monarca; à esquerda o dela, o atual. Há um diálogo algo pesaroso sobre transformações inevitáveis ocasionadas pelo tempo, a transição da juventude para a maturidade e, assim, esse expediente é plenamente assinalado. Mas os ventos frescos também dizem respeito à questão política, uma vez que o Partido Conservador não consegue reeleger o seu primeiro-ministro.
A questão das ambivalências, de certa forma cimentada anteriormente, mas dotada de outros contornos pela ampla troca do elenco, aparece na trama que diz respeito ao curador de quadros da rainha. Suas falas acerca da natureza insuspeita das obras de arte, daquilo que as superfícies escondem, sublinham esses rostos diferentes que encarnam os mesmos personagens de antes, mas noutra fase. Assim, a princesa Margaret (Helena Bonham Carter) continua sendo uma peça da realeza entristecida pelo destino amoroso imposto por sua posição. O casamento caracterizado por ausências e escassez de afeto, aparentemente, está pesando sobremaneira em seus ombros. Mas, Bonham Carter injeta uma melancolia particular a fim de delinear, com matizes próprios, o drama dessa figura que nas outras temporadas tentou de tudo para viver longe das regras.
The Crown continua equilibrando com minúcia as contendas pessoais e as conjunturas sócio-políticas do Reino Unido. O novo primeiro-ministro, Harold Wilson (Jason Watkins), é membro do Partido Trabalhista, portanto um socialista que precisará negociar direta e cotidianamente com a realeza considerada por sua inclinação ideológica uma obsolescência elitista e descartável. O simples fato de existir a renovação direciona a terceira temporada ao desenvolvimento, primeiro, das contestações quanto à validade da monarquia e, segundo, das capacidades diplomáticas de Elizabeth. Isso fica claro na breve cena dos dois conversando pela primeira vez, quando ele, quebrando o protocolo anteriormente pormenorizado, dispara a falar do legado catastrófico de seu antecessor. Parece que a Alteza Real terá de aprimorar a sua capacidade de liderar.
Em The Crown todos os personagens da realeza se equilibram com dificuldades entre o desejo e o cumprimento da função que lhes cabe por hereditariedade ou associação matrimonial. Uns, como a rainha, gradativamente entendem de que modo lidar com as pressões. Olivia Colman carrega, a julgar pelo primeiro episódio, a maturidade curtida por toda sorte de adequações que a personagem outrora encarava com sofrimento mais visível. Philip (Tobias Menzies) pouco se mostra nesse começo, mas provavelmente, inclusive pelo diálogo com um traidor, continuará sendo uma espécie de bomba-relógio, algo também projetado em Antony (Ben Daniels), o marido aventureiro de Margaret. A julgar por esse pontapé inicial repleto de complexidades e minúcias, pode-se esperar uma terceira temporada à altura das outras duas. Tomara.
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