Dois vencedores da Palma de Ouro em Cannes, dois premiados nos festivais de Gramado e do Rio de Janeiro, um drama premiado no Festival de Berlim, um sucesso indie norte-americano, o capítulo final de uma cultuada trilogia, um blockbuster hollywoodiano, o retorno de um diretor vencedor do Oscar e um trabalho polêmico que combina suspense com pornografia. Estes foram os melhores filmes de 2013 de acordo com a Equipe de Críticos do Papo de Cinema. Abaixo, você poderá conhecer um pouco melhor sobre cada um destes títulos, na opinião de cada um dos dez críticos do site. O ano que está acabando foi, realmente, singular. Mas o melhor é que ainda vem muita coisa boa por aí. É pra ficar atento, com um olhar no que passou, e na expectativa pelo que ainda vai surgir. Confira!
10. Frances Ha, por Renato Cabral
Parceria de Greta Gerwig e Noah Baumbach, Frances Ha resulta em uma das mais frenéticas e sensíveis histórias de crescimento pessoal e profissional, além de fazer uma bela homenagem ao cinema francês com referências à Nouvelle Vague e ao cinema de cineastas como Leos Carax. Mas mais do que isso, a produção resume quase que uma geração atual de jovens pressionados por se encaixarem em uma carreira artística. Carismática, Frances Halliday é uma bailarina que tenta a vida em Nova York, onde divide um apartamento com sua melhor amiga, Sophie. Quando Sophie decide se mudar sem ela, nossa protagonista se vê forçada a amadurecer, voar solo e aceitar que nem sempre as perspectivas que temos são as que a vida preparou para nós. Nessa jornada de autodescoberta, ela acabou conquistou plateias com seu amadurecimento tardio, otimismo e muitas trapalhadas.
9. Antes da Meia-Noite, por Conrado Heoli
A terceira parte da trilogia de Richard Linklater, formada também por Antes do Amanhecer (1994) e Antes do Pôr do Sol (2004), foi descrita carinhosamente por Ethan Hawke como “a série menos lucrativa de todos os tempos”. A saga romântica de Jesse e Celine, roteirizada por Linklater, Hawke e pela atriz Julie Delpy, já venceu no passado o Festival de Berlim e foi indicada ao Oscar de Melhor Roteiro Original. Este novo contato com um dos casais mais encantadores do cinema é tão especial quanto os outros, porém supera seus predecessores pela expectativa gerada ao redor deste novo filme, realizado 18 anos depois do primeiro encontro dos dois. Antes da Meia-Noite foi apontado como um dos melhores do ano por inúmeros críticos, entre eles o incensado Peter Travers, da revista Rolling Stone, como um retrato maduro e singular das relações contemporâneas ao longo dos anos. Que venha o próximo episódio da franquia mais honesta e fascinante que existe.
8. Um Estranho no Lago, por Pedro Henrique Gomes
Um assassinato aos olhos de quem quiser ver, se alguém quiser ver. O sexo, também ele, disposto ao olhar de quem se interessar. O recorte que o diretor Alain Guiraudie opera em Um Estranho no Lago é fiel à cumplicidade das ações de seus personagens. Morte e sexo, filmados sem pudor, abandonando a “aura” do instinto humano em pleno ato, contornando os desejos que se anunciam nos corpos, nos olhares. A atmosfera repleta de mistérios da carne, sintetizada na morte e no sexo, compõe o acorde do filme, que é erigido sem qualquer pressa, na tranquilidade de quem sabe o que quer com suas imagens. Este trabalho de Guiraudie trata de coisas simples com a serenidade de quem pensa nelas com intenso respeito. Se o cuidado na depuração das cenas compõe o clima de tensão que se pretende estabelecer, o tal lago faz valer sua calma para criar o contragolpe, forjando um equilíbrio fundamental. Não podemos deixar esse filme morrer.
7. Amor, por Danilo Fantinel
Um dos romances mais contundentes da última década, Amor aborda a exclusiva dedicação de Georges (Jean-Louis Trintignant) a sua mulher Anne (Emmanuelle Riva) no crepúsculo da vida de ambos. Casados, envelheceram juntos como amigos e amantes, aproveitando intensamente os prazeres franceses como deveriam todos os seres humanos deste mundo. Porém, sem aviso, a vívida Anne sofre um derrame, dando início a um longo processo de declínio que imprime um novo cotidiano e um novo convívio entre o casal, agora regido pelos desafios impostos pela doença. Georges evita auxílio especializado por discordar dos métodos. Prefere cuidar sozinho da mulher, oferecendo o conforto que só ele pode destacar. No entanto, o percurso torna-se extremamente difícil, não apenas pelas dificuldades naturais decorrentes da condição de Anne, mas principalmente devido à dor emocional provocada pela finitude física sofrida por quem se ama. A decrepitude da mulher, testemunhada com pesar pelo marido e filmada com crueza e realismo pelo austríaco Michael Haneke, torna-se também um obstáculo para o público por vários motivos, sendo o principal deles a certeza de que final semelhante pode ser experimentado por qualquer um de nós.
6. Killer Joe, por Robledo Milani
Foi preciso apenas um chapéu de cowboy, um par de botas bem lustras e, acima de tudo, uma coxinha de galinha frita, para que este longa dirigido por Willian Friedkin conquistasse de vez um lugar em nossas memórias. Lançado em 2011, levou dois anos para chegar aos cinemas brasileiros, mas a espera foi mais do que recompensada: poucas vezes Matthew McConaughey esteve tão bem, neste trabalho que significou o início de uma importante virada em sua carreira; Emile Hirsch revelou todo o descontrole de um rapaz sem “eira nem beira”; Juno Temple virou a face da ingenuidade e poder; e o casal formado por Thomas Haden Church e Gina Gershon é tão patético quanto um perfeito retrato da América atual. O texto certeiro de Tracy Letts – autor também do recente Álbum de Família (2013) – não perdoa nenhum dos personagens, com exceção, talvez, do Joe do título, aquele que pouco sabemos de onde vem e para qual destino se encaminha. Menos, aqui, definitivamente, é mais. Mais tenso, mais intenso, mais marcante. Um filme que por pouco não passou desapercebido, mas que merece ser descoberto como poucos.
5. Tatuagem, por Matheus Bonez
Tatuagem não é só um filme sobre o romance gay entre o artista revolucionário Clécio (Irandhir Santos) e Fininha (Jesuíta Barbosa), um militar que está descobrindo sua sexualidade. O longa de Hilton Lacerda trata da liberdade em seus vários tons: de voz, de expressão, de paz, de amor. Tendo como pano de fundo a ditadura militar – que, aos poucos, vai se entrelaçando na história com o todo da trama – o conto de um Brasil que busca sua voz chegou aos cinemas do país em um ano crucial, onde protestos tomaram conta da maioria dos 27 estados. Mas suas qualidades não se restringem a estes fatos verídicos. Com um elenco afiado em mãos, um roteiro naturalista e uma direção sem pudores (porém, nunca ofensiva), Lacerda entregou uma das maiores surpresas do ano. Impossível sair da sessão sem ficar com algumas imagens gravadas na memória, especialmente a do número do Cu. Sim, o palavrão musicado, com vários traseiros à mostra em um show de dança que, para alguns, pode até chocar, mas na verdade toca na essência do filme: a de uma sociedade que fala demais sobre pluralidade, mas é tão restrita quanto as suas ações.
4. Azul é a Cor Mais Quente, por Dimas Tadeu
Não é por mera formalidade que o vencedor da Palma de Ouro em Cannes garantiu seu lugar aqui no nosso Top 2013. Emocionante, intenso, visceral e verdadeiro são apenas alguns dos predicados do filme que tem dado o que falar no Brasil e no mundo, tanto entre cinéfilos como entre o público em geral. Ao contar a história de Adèle e Emma, a menina de cabelos azuis que batiza o filme, Kechiche presenteou as plateias de todo o mundo com um belo conto sobre o amadurecimento, a descoberta do amor e de seus rumos incertos. E também o chocou, com cenas quentes de sexo lésbico, filmadas com demorada e necessária poesia. Cheio de subtextos e permeado por uma crueza típica do diretor, o filme tem um dos finais mais enigmáticos e interessantes do ano, fechando a obra com chave de ouro e garantindo seu lugar entre os melhores aqui do Papo de Cinema.
3. Gravidade, por Rodrigo de Oliveira
No dicionário cinematográfico, bem ao lado do verbete “cinema espetáculo”, uma foto de Gravidade deveria ser colocada, tamanha a perfeição alcançada por Alfonso Cuarón neste seu trabalho. Se o espectador precisava de algum motivo para sair de casa e encarar as filas do cinema, o pagamento do estacionamento e os caros ingressos praticados atualmente, este era o pretexto perfeito. Isso por que a experiência de assistir a Gravidade na telona dificilmente será replicada em casa, por maior que seja seu televisor. Sandra Bullock nos guia por uma aventura de tirar o fôlego, lutando por sua vida em pleno espaço, enquanto precisa resolver assuntos pendentes com cicatrizes de seu passado. Isso tudo acontece sem diálogos expositivos, sem flashbacks desnecessários, sem as artimanhas que tanto conhecemos. Ela está sozinha no espaço, perdida, desorientada. Seu renascimento se dá diante de nossos olhos, em uma belíssima cena que fecha um dos momentos mais tensos do filme. Cuarón esconde os cortes de início, fazendo tomadas que aparentam ser um longo plano-sequência, levando sua plateia a passear pelo espaço junto com seus protagonistas. Provando que um épico espacial não precisa ser longo, com seus 90 minutos de duração, Gravidade dá seu recado e é, certamente, um dos melhores filmes de 2013.
2. Tabu, por Marcelo Müller
Tabu é um filme de roupagem saudosista, que renova o circuito a partir dos limites de sua janela 4:3 e do preto e branco, atributos hoje estranhos às salas de cinema. Tal aspecto visual é utilizado para registrar a parábola inicial, a Lisboa contemporânea, e também a pretérita colônia portuguesa na África misteriosa. A estética remonta os filmes mudos dos primórdios, alusão evidenciada, sobretudo, na segunda parte, onde os diálogos são abolidos em prol da narração e dos sons cotidianos. Mesmo assim, cabe à palavra (impostada) ressaltar a beleza das imagens, o que confere a Tabu atmosfera poética. Homenageando Murnau, Miguel Gomes fala sobre amores impossíveis, colonização e a relação dos dominados coadjuvantes com os conquistadores protagonistas, desde os primórdios até hoje.
1. O Som ao Redor, por Willian Silveira
Assisti a O Som ao Redor pela primeira vez no Festival de Cinema de Gramado, em uma sala tomada por expectativa. Toda ela justificada, pois quem conhecia a carreira do diretor Kléber Mendonça Filho, construída até então com bons curtas, Enjaulado (1997), Vinil Verde (2004) e Recife Frio (2009), para citar alguns, sabia do que o ex-crítico de cinema era capaz. Mas não se podia esperar tanto. A história da organização informal que se articula para ocupar a lacuna deixada pela segurança pública do Recife é apenas parte do enredo que, mesmo quando descrito nos pormenores, torna-se incompleto. Impossível descrever em palavras a construção visual e auditiva, protagonista a sua maneira. Em tudo que está ao redor, na impossibilidade limítrofe de uma película holística, o filme de Mendonça não chegava para ser o melhor filme brasileiro já realizado, mas – próximo e até mais importante – para ser um filme brasileiro sem precedentes.
OS DEZ MELHORES DE 2013 NA OPINIÃO DE CADA CRÍTICO: