Todo ano é a mesma coisa: a Academia começa a anunciar seus indicados ao Oscar e o pessoal em casa fica de queixo caído pela falta de alguns filmes, intérpretes, diretores. Não dá para agradar gregos e troianos, mas, muitas vezes, injustiças realmente ocorrem, mesmo que seja apenas na opinião dos críticos. No caso deste nosso top dos esnobados, lembramos não apenas de filmes que ficaram totalmente de fora, porém também daqueles que mereciam MAIS indicações. Isso que nem dissertamos mais sobre Birdman ou (A Inesperada Virtude da Ignorância) e O Grande Hotel Budapeste, os dois longas mais lembrados do ano com nove indicações cada. Porém, o primeiro ainda merecia estar em Melhor Montagem e Melhor Trilha Sonora, enquanto o segundo foi esquecido em Melhor Ator com um divertidíssimo Ralph Fiennes. Já que, apesar dos pesares, as duas produções fizeram bonito na festa, voltamos nossos olhos para outras que foram quase totalmente esquecidas. Quer saber se algum favorito seu está listado aqui? Confira!
O Abutre (Nightcrawler, 2014)
O mais injustiçado dos postulantes ao Oscar é O Abutre (2014), de Dan Gilroy. A lembrança na categoria Melhor Roteiro Original é pouco para fazer jus ao filme, que merecia, chutando baixo, estar entre os indicados a Melhor Filme, Direção e, principalmente, Ator e Atriz Coadjuvante. Jake Gyllenhaal desempenha o melhor papel de sua carreira como esse aficionado por teorias corporativas que entra no ramo do sensacionalismo sem medo de sujar as próprias mãos de sangue. Já Rene Russo não deixa por menos, na pele de uma mulher que faz de tudo por audiência. Mas não foi suficiente para a Academia, que preteriu o ator, colocando no páreo, por exemplo, um apenas bom trabalho como o de Bradley Cooper em Sniper Americano, e a atriz, indicando Meryl Streep pelo decepcionante Caminhos da Floresta. O Abutre é daqueles filmes que chegam devagar, sem fazer muito barulho, sem grandes coberturas prévias, e que mostram por que está redondamente enganado quem estereotipa o cinema norte-americano com base nos grandes sucessos de bilheteria. Da jornalista que alimenta a fome voraz do protagonista pela tragédia ao espectador que a empanturra com altos índices de audiência, todos são culpados nessa cadeia que se retroalimenta. Talvez tenha sido um pouco demais para a galera do Oscar. – por Marcelo Müller
O Ano Mais Violento (A Most Violent Year, 2014)
Margin Call: O Dia Antes do Fim (2011) foi o primeiro longa-metragem da carreira do jovem diretor, e praticamente desconhecido, J. C. Chandor. A produção de elenco estelar seguia um grupo de pessoas-chave em um banco de investimento ao longo de 24 horas, ao passo que os estágios iniciais de uma crise começam a ocorrer. Não muito longe do que é visto em sua mais nova empreitada, O Ano Mais Violento, que confirma Chandor como um promissor autor no cinema americano ao colocar crise e ambição lado a lado para tratar da história de um imigrante, Abel, e sua esposa, Anna, que lutam para proteger sua empresa e família durante o ano de 1981, um dos mais violentos e de alta corrupção em Nova York. Um belo misto de Stanley Kubrick em De Olhos Bem Fechados (1999) com um anti-O Poderoso Chefão (1972), o filme se destaca pelas questões morais que apresenta muito bem canalizadas pelas atuações de Oscar Isaac e Jessica Chastain. Isaac por sinal, carrega a produção com uma presença de cena brilhante. Chastain por sua vez, com as feições delicadas, nos entrega uma personagem decidida e persuasiva, nada boba. Um tanto quanto esquecido nessa temporada de prêmios, as indicações mais que merecidas seriam nas categorias de ator, atriz coadjuvante e, sem dúvida, em roteiro original. – por Renato Cabral
Uma Aventura Lego (The Lego Movie, 2014)
A felicidade irradiante dos personagens de Uma Aventura Lego parece não ter contagiado os votantes da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood. Surpreendentemente, o filme dirigido por Phil Lord e Chris Miller, dado como indicado certo na categoria de Melhor Animação deste ano, ficou de fora da briga. Como explicar o fato de uma das produções mais elogiadas do ano não estar entre as cinco mais? As especulações são as mais variadas. É possível que a imaginação fértil dos diretores, mesclada a uma narrativa quase histérica e colorida, tenha afastado os votantes mais velhos e conservadores. Outro ponto que não é bem visto pela Academia é o merchandising agressivo e um filme que leva uma marca em seu título pode ter colocado reticências na cabeça dos membros responsáveis pelos votos. É lógico que o filme foi feito para vender brinquedos. Mas os realizadores conseguiram ir além disso, construindo uma história que brinca pela enésima vez com a figura do escolhido, com a jornada do herói, colocando no caldo um sem número de referências à cultura pop, misturando novos personagens a outros já reverenciados. Ao menos, a música-chiclete Everything is Awesome foi lembrada como Melhor Canção Original. É pouco para um dos mais divertidos longas de 2014. – por Rodrigo de Oliveira
Cake: Uma Razão Para Viver (Cake, 2014)
Que o ano passado foi fraco para personagens femininas fortes, não há dúvida. Pouquíssimas atrizes conseguiram se destacar em suas atuações, ainda mais se compararmos com seus colegas da ala masculina, que praticamente disputaram a tapas as vagas para as premiações. Tanto que as previsões eram quase incertas até o fim de 2014 sobre quem poderia figurar na categoria de Melhor Atriz. Eis que, aos pouquinhos, a ex-Rachel do seriado Friends surgiu como nome fortíssimo graças à sua atuação visceral em Cake: Uma Razão Para Viver, longa que pode não ser a oitava maravilha do mundo, mas fica maior graças à presença de Jennifer Aniston. Sua Claire Simmons sofre de uma doença crônica que a deixa com mal-estar a todo momento, o que é sentido pelas feições físicas a atriz, que engordou muito para dar mais realismo à interpretação. É angustiante acompanhar a trajetória de sua personagem, ainda mais se levarmos em conta que ela se mete em situações cada vez mais complicadas que exigem demais de seu físico e emocional. Esforço reconhecido pelas indicações, entre outros prêmios, ao SAG e o Globo de Ouro. Uma grande pena Aniston ter sido esnobada, já que Hollywood adora quando comediantes revelam talentos dramáticos que, até então, eram questionáveis. Caso mais do que aplicável para esta atriz que, apesar de sempre competente, costuma ficar no mais do mesmo com comédias românticas ou destrambelhadas. Bola fora da Academia. – por Matheus Bonez
Expresso do Amanhã (Snowpiercer, 2013)
Expresso do Amanhã não é o tipo de filme que a Academia costuma reconhecer. Muitos nomes “estrangeiros” no comando e um elenco protagonizado por nenhum de seus queridinhos. Além da trama sombria e pouco carismática que nunca chama a atenção da maioria dos votantes. Porém, está ali de vez em quando uma Tilda Swinton sempre maravilhosamente versátil, que embora já tenha levado a sua merecida estatueta por Conduta de Risco (2007), também tem nessa a sua única indicação. Ou seja, não é a primeira vez que o Oscar esnoba a atriz – lembram de Precisamos Falar Sobre Kevin (2011)? E nem é preciso ir muito longe, agora mesmo em 2014 ela esteve incrível em Amantes Eternos, que infelizmente estreou muito cedo para ser lembrado agora. Tilda poderia estar facilmente no lugar de Meryl Streep, por exemplo, que está lá apenas porque, bem, é a Meryl Streep. Os quesitos técnicos não deixam também de ser uma decepção por não constarem entre os finalistas, principalmente o Design de Produção e a Fotografia estão excelentes, além de já terem sido reconhecidos em premiações de diversas associações de críticos ao redor dos EUA. – por Yuri Correa
Garota Exemplar (Gone Girl, 2014)
Um dos maiores sucessos de 2014 tanto em termos de crítica quanto de público, Garota Exemplar parecia que tinha forças para figurar nas principais categorias do Oscar. Com grandes atuação de Ben Affleck e, principalmente, Rosamund Pike, o filme de David Fincher é brilhante não só no modo como constrói sua história cheia de reviravoltas, mas também no desenvolvimento de seus inteligentes personagens, resultando num thriller fascinante, de tirar o fôlego. Mas eis que a Academia anuncia seus indicados e a única presença confirmada do filme (merecidamente, é claro) é a de Pike entre as cinco finalistas a Melhor Atriz. Tudo bem que as indicações em categorias como Melhor Filme e Melhor Direção eram um pouco duvidosas, mas ele não foi lembrado nem mesmo em Melhor Roteiro Adaptado, no qual Gillian Flynn (que o escreveu a partir de seu próprio livro) era dada como nome certo entre os concorrentes, o que acabou coroando uma das grandes injustiças desse Oscar. Garota Exemplar certamente merecia estar ao lado de outras excepcionais produções desta edição. – por Thomás Boeira
Grandes Olhos (Big Eyes, 2014)
É impressionante como a Academia de Hollywood simplesmente não consegue se empolgar com o trabalho de Tim Burton. Um dos cineastas mais autorais atualmente em atividade no cinema norte-americano, em mais de trinta anos de carreira ele recebeu apenas duas indicações ao prêmio máximo do cinema mundial – e ambas por suas animações. Títulos como Batman (1989) e Os Fantasmas se Divertem (1988) até foram premiados, porém em categorias técnicas. Seu primeiro esforço em obter um reconhecimento maior foi com Ed Wood (1994), que ganhou duas estatuetas, mas falhou em ficar entre os melhores filmes do ano. O mesmo acontece agora, vinte anos depois, com a segunda cinebiografia de sua carreira: Grandes Olhos, que narra a trajetória da pintora Margaret Keane, cujo talento singular foi por mais de uma década explorado pelo marido, Walter Keane, que assumia a autoria das peças perante ao público ao mesmo tempo em que a oprimia em casa. Amy Adams (premiada com o Globo de Ouro), o roteiro da dupla Scott Alexander e Larry Karaszewsky (indicados ao Spirit), a belíssima e triste canção de Lana Del Rey (indicada ao Globo e ao Critics Choice) ou a Direção de Arte minuciosa de Rick Heinrichs e Shane Vieau (indicada ao Bafta) poderiam – e mereciam – ser finalistas no Oscar 2015. No entanto, o longa ficou de mãos abanando, sem ter recebido uma única indicação. É muita injustiça! – por Robledo Milani
Interestelar (Interstellar, 2014)
Muitas vezes as listas de indicados aos mais cobiçados prêmios do cinema cometem injustiças. É o caso do excelente Interestelar, o melhor filme de sci-fi dos últimos anos e o trabalho mais ambicioso de Christopher Nolan. A película foi indicada aos prêmios mais técnicos do Oscar 2015, mas ficou de fora em outras categorias, algumas, aliás, em que estava muito bem cotada. Como todos os trabalhos de Nolan, Interestelar possui um esmero técnico impressionante, mas também um debate teórico profundo e sensacional. Entre estrelas, luas, galáxias, buracos negros e a tentativa de salvar a raça humana, o grande assunto discutido pelo diretor é o que sentimos uns pelos outros, o que carregamos dentro de nós, o passado, o presente, o futuro e o tempo. Mesmo com tudo isso e os vários núcleos e camadas, o longa de três horas não é cansativo. É envolvente e consegue seduzir e prender o espectador como poucos com a mesma duração. Além da qualidade exuberante do filme e da direção de Nolan, o Oscar 2015 também esnobou a fotografia espetacular de Hoyte Van Hoytema, que fez, sem sombra de dúvidas, um dos melhores trabalhos do ano. – por Gabriel Pazini
Life Itself (2014)
Até o último trimestre de 2014, a temporada de prêmios na categoria de documentário parecia estar lacrada para Life Itself, dirigido pelo veterano Steve James. James foi responsável por um dos mais elogiados documentários do cinema americano, Basquete Blues (1994), que, na época, foi esnobado na categoria de documentário. Vinte anos depois, James lança uma obra emocional e encantadora sobre a vida de Roger Ebert, talvez o crítico de cinema mais popular da história de Hollywood, que lutou contra um tipo raro de câncer até falecer, em 2013, sem nunca ter deixado de assistir e comentar filmes. Tudo indicava que a produção, querida por toda a indústria, contando com depoimentos de gente como Martin Scorsese e Werner Herzog, era a favorita a levar o ouro. Eis que Citizenfour (2014), sobre o caso Edward Snowden, não só tira a dianteira do filme sobre Ebert, como o exclui da corrida. Não é novidade que os documentaristas que votam na categoria costumam indicar temas mais “sérios” (política, guerra) do que filmes sobre figuras do entretenimento. No entanto, no lugar de Life Itself, surpreendentemente estão os documentários sobre fotografia Finding Vivian Maier e a co-produção brasileira O Sal da Terra. – por Giordano Gio
Selma (2014)
Uma cinebiografia de Martin Luther King Jr. era esperada há muito tempos nos cinemas. Focando a produção em um dos períodos mais tensos de sua trajetória, a luta pelo direito de negros ao voto nos EUA, Selma se mostrou um grande exemplar do gênero com uma importância história tremenda. Então, como ficar com reles duas indicações ao Oscar, sendo que o filme, até agora, já foi vencedor de 20 prêmios e indicado outras 75 vezes? Muitos podem associar ao fato dele ter demorado para ser apresentado aos membros dos estúdios e afins, afinal, não chegou a tempo de ser lembrado nas premiações dos sindicatos, por exemplo, mas nada justifica tamanho descaso. A Academia perdeu a chance de indicar a primeira mulher negra na categoria de Melhor Direção pelo excelente trabalho de Ava DuVernay, preferindo lembrar de Bennett Miller por Foxcatcher: Uma História que Chocou o Mundo (2014). Algo mais estranho ainda, já que este longa nem foi indicado a Melhor Filme. Além disso, David Oyelowo sequer foi mencionado por sua surpreendente incorporação do líder pacifista como Melhor Ator, por mais acirrada que esta disputa esteja neste ano. O roteiro original de Paul Webb, então, que menciona os aspectos mais importantes do episódio retratado sabendo dosar tudo de forma igualitária, merecia estar entre os finalistas. No fim das contas, ficou apenas com duas indicações, a de Melhor Filme e Melhor Canção. Merecidas, mas precisava de mais. Muito mais. – por Matheus Bonez